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EuPTCVHe0871-97212012000200006

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National varietyEu
Year2012
SourceScielo

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Anafilaxia à semente de girassol

INTRODUÇÃO A alergia alimentar devida a sementes e frutos secos assume, também na nossa população, uma relevância crescente em termos de prevalência e gravidade. A semente de girassol (Helianthus annuus), apesar do consumo frequente em forma de óleo, margarina, produtos de panificação e sementes, como aperitivo ou em saladas, raramente é reportada como causa de reacções anafi lácticas1-5. A sensibilização pode ocorrer a proteínas de reserva (albuminas 2S) e a proteínas de transferência de lípidos (Lipid Transfer Proteins' LTPs). Foi identificada na semente de girassol uma LTP (Hel a 3) com um peso molecular de ∼9 kDa5.

Existem 8 albuminas diferentes na fracção 2S da semente de girassol que foram também identifi cadas com potencial alergénico em semente de sésamo, noz, amendoim e mostarda6.

CASO CLÍNICO Doente de 32 anos do sexo feminino, com rinoconjuntivite alérgica persistente moderada-grave desde os 20 anos, sensibilizada a pólenes de artemísia, gramíneas, oliveira, parietária, plantago, quenopódio, salsola e a epitélio de gato. Recorre à consulta de Imunoalergologia em 2010 devido à ocorrência, desde 2007, de três reacções anafilácticas imediatamente (5 a 10 minutos) após ingestão de semente de girassol. Estes episódios caracterizaram-se por angioedema peri-orbitário, prurido orofaríngeo, rinite, tosse, estridor e pieira, que regrediram após administração de anti-histamínico e corticosteróide por via oral. Os primeiros episódios ocorreram após ingestão de sementes secas, vulgarmente designadas de pipas, e o último após ingestão de batatas fritas confeccionadas em óleo de girassol. A doente referia ainda prurido orofaríngeo após ingestão de pistácio. Ingeria batata sem reacção adversa e negava queixas com outros frutos secos, semente de sésamo e amendoim; recusava a ingestão de mostarda por não lhe ser aprazível o paladar.

Na consulta de Imunoalergologia foram efectuados testes cutâneos por picada (extractos Bial-Aristegui®, Bilbau, Espanha) que se revelaram positivos para semente de girassol (9x7 mm), mostarda (5x4 mm), pistácio (4x3 mm) e pinhão (5x3 mm), sendo negativos para outros frutos secos, semente de sésamo e amendoim. O doseamento sérico de imunoglobulina E (IgE) total foi de 158 UI/mL e de IgE específica para semente de girassol foi de 79 kU/L (Phadia ' Thermo Fisher Scientific®, Uppsala, Suécia). Foi efectuado ImmunoCAP ISAC® (Immuno Soli -phase Allergen Chip) que revelou um perfil de sensibilização preponderante a LTPs (nPru p 3, nArt v 3 e rPar j 2) conforme ilustrado no Quadro 1.

Quadro 1.Resultados positivos nos testes cutâneos por picada, no doseamento sérico de IgE específicas e no ImmunoCAP ISAC®

Face aos resultados obtidos, realizou -se estudo de inibição ISAC® com extracto de semente de girassol. Foi preparado um extracto hidrossolúvel a partir de semente de girassol, que se misturou na proporção de 1:1 com o soro da doente.

Após centrifugação, o sobrenadante obtido foi incubado com o microarrayde alergénios ISAC®.

Como controlo utilizou-se soro de um doente alérgico a Der p 1, tratado da mesma forma. Observou-se que o extracto de semente de girassol produziu uma inibição de 60% (Figura 1) da ligação de IgE a LTPs (nPru p 3 e nArt v 3); não se verificou inibição para os restantes alergénios identificados no ImmunoCAP ISAC® (nCyn d 1, rPhl p 1, nPhl p 4, nOle 1, nArt v 1, nSal k 1, rPar j 2 e rFel d 1). De igual forma, não se verificou inibição no soro controlo.

Figura 1.Resultado do estudo de inibição ISAC6.5pt; font-family: "Verdana","sans-serif";mso-fareast-font-family:"Times New Roman"; mso-bidi- font-family:GillSansMT;color:windowtext;mso-ansi-language:PT; mso-fareast- language:PT;mso-bidi-language:AR-SA'>®com extracto de semente de girassol com o soro da doente: inibição do nPru p 3 de 3,2 para 1,28 ISU (60% de inibição) e inibição do nArt v 3 de 0,8 para 0,3 ISU (62,5% de inibição)

A doente encontra-se actualmente em evicção rigorosa de semente de girassol, incluindo de alimentos confeccionados em óleo de girassol, e de frutos secos, sendo portadora de dispositivo para auto-administração de adrenalina 0,3mg por via intramuscular.

DISCUSSÃO A ocorrência de alergia a semente de girassol tem sido reportada em indivíduos que possuem aves alimentadas com sementes de girassol3,7, mas casos clínicos como o que descrevemos, de alergia alimentar grave mediada por IgE, são raros. Este caso destaca-se também pela particularidade da doente apresentar anafilaxia ao óleo de girassol.

A alergia ao óleo de girassol foi descrita8,9, mas é considerada um evento muito incomum pois a maioria dos doentes com alergia a esta semente tolera a pequena quantidade de proteína alergénica contida no óleo de girassol2,4.

Tal facto poderá ser explicado pela sensibilização a LTPs.

As LTPs representam uma classe de alergénios ubiquitários específicos para alimentos de origem vegetal, como frutos frescos e cereais10. A sensibilização a LTPs é clinicamente relevante, dado que são panalergénios estáveis, resistentes ao calor e à digestão péptica, e apresentam domínios bem conservados que condicionam um elevado grau de reactividade cruzada entre alimentos botanicamente não relacionados10. Tais características justificam que a sensibilização a estas proteínas possa estar na origem da ocorrência de anafilaxia após ingestão de óleo de girassol cozinhado a altas temperaturas, como sucedeu no caso clínico que reportamos. Os sintomas de rinite alérgica com a exposição a pólenes iniciaram-se previamente à alergia alimentar, o que está de acordo com a hipótese levantada de se tratar de um caso de polinose com reactividade cruzada a LTPs, que se confirmou posteriormente através dos estudos de inibição ISAC®realizados. Apesar de o rPar j 2 ser também uma LTP, não se verificou inibição com este alergénio, o que se deve ao facto de esta proteína pertencer a outra subfamília de LTPs não relacionadas com as LTPs que estão associadas a rosáceas.

Por outro lado, a família das albuminas 2S constitui uma importante classe de proteínas alergénicas comuns em sementes. A sua presença em quase todas as sementes comestíveis deve ser tida em consideração não devido à alta incidência de reacções clínicas em pessoas sensibilizadas mas também devido à possibilidade real de reactividade cruzada entre diferentes proteínas da mesma classe10.

Nomeadamente, também foram identificadas com potencial alergénico em semente de sésamo, noz, amendoim e mostarda6. No caso clínico que descrevemos é notória esta reactividade cruzada, pela sensibilização observada a pistácio, pinhão e mostarda, com repercussão clínica no caso do pistácio. Por este motivo, justifica -se a opção de recomendar a evicção de frutos secos.

A ocorrência de reacção anafiláctica devido a LTP da semente de girassol foi recentemente descrita na literatura5.

O crescente consumo de sementes de girassol secas como aperitivos e a sua elevada utilização em snacks, saladas e produtos de panificação, bem como o facto de a alergia à semente de girassol poder estar associada a sensibilização a aeroalergénios comuns na Europa, como o pólen de artemísia5, explicam o recente aumento na prevalência de casos reportados.

Por outro lado, a gravidade da reacção clínica que reportamos, assim como a elevada probabilidade de ingestão da semente de girassol como alergénio oculto em snacks ou alimentos confeccionados em óleo de girassol, justificam a publicação deste caso clínico, para que esta possibilidade seja tida em consideração na investigação de situações de alergia de causa alimentar não esclarecida. O diagnóstico assertivo e célere permite recomendar atempadamente a evicção rigorosa não da semente de girassol e dos alimentos confeccionados em óleo de girassol, como dos alimentos com reactividade cruzada, minimizando desta forma a possibilidade de recorrência de reacção anafiláctica grave.


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