Rotura isolada do ligamento cruzado posterior: História Natural, Tratamento e
Reabilitação
INTRODUÇÃO
A história natural da rotura isolada do ligamento cruzado posterior (LCP) não
está bem definida, sendo pouco frequentes estudos prospetivos sobre o assunto.
A maioria engloba a generalidade das lesões - isoladas e associadas ou agudas
e crónicas -, com tempos de seguimento curtos (geralmente inferiores a 10
anos), dificultando a interpretação e compreensão dos resultados.
Para tal contribui também a menor incidência e sintomatologia, quando
comparadas com o ligamento cruzado anterior (LCA), cujos pressupostos
cirúrgicos são frequentemente transpostos para o LCP.
Há vários enxertos, opções técnicas e de reabilitação disponíveis para a
reconstrução do LCP, todas pensadas para permitir a retoma funcional, incluindo
a atividade desportiva, e prevenir o desenvolvimento de degeneração articular.
No contexto de uma revisão alargada da semiologia da rotura isolada do LCP, o
objetivo do presente trabalho é rever a história natural, tratamento e
reabilitação da rotura isolada do LCP. Como metodologia, pesquisou-se na
Pubmed/Medline (em setembro de 2011) o conceito "posterior cruciate
ligament" que resultou em 3149 artigos; juntamente com bibliografia já
disponível e considerada adequada. No artigo final constam 88 citações no
artigo final, que incluem 2 livros de texto, 1 estudo controlado, 30
publicações dos últimos 10 anos (cerca de 77%); 3 estudos com níveis de
evidência entre 1b e 3.
HISTÓRIA NATURAL
A história natural de um joelho com rotura do LCP sem outras lesões associadas
- e, portanto, sem qualquer forma de tratamento implementada - não está bem
compreendida, dificultando por isso a abordagem terapêutica[1-3].
Estudos de longo-tempo revelaram uma incidência elevada de osteoartrose
progressiva e função diminuída do joelho deficiente em LCP[1,4].
Em 1988 Dejour et al distinguiram três fases evolutivas da rotura isolada do
LCP: 1. fase de adaptação funcional (3 a 18 meses); 2. fase de tolerância
funcional (até aos 15 anos); 3. fase de artrose, essencialmente femorotibial em
28% dos casos, em média após cerca de 15 anos de evolução[5].
A lesão isolada aguda do LCP - pelo seu potencial regenerativo - frequentemente
cicatriza (69%), com desenvolvimento de tecido contínuo tipo ligamento que,
embora laxo, pode funcionar como um limitador à força da gaveta tibial
posterior e, dessa forma, explicar parcialmente o prognóstico favorável destas
lesões[6]. Este potencial de cicatrização - superior ao LCA - relaciona-se com
a vascularização mais rica[7].
Fontboté et al (2005) demonstraram que, apesar da laxidão clínica, as
diferenças biomecânicas e neuromusculares são mínimas, indicando que estes
doentes podem desempenhar atividades de marcha e salto semelhantes aos
indivíduos com LCP normal, sem serem sujeitos a reconstrução cirúrgica e sem
experimentar sintomas de instabilidade[8]. Está descrito que metade dos doentes
podem retomar o mesmo nível de atividade desportiva - com boa tolerância
para a lesão, se não houver lesão da cartilagem articular -, um terço pode
retomar o mesmo desporto mas a um nível mais baixo e um sexto são incapazes de
retomar o mesmo desporto[9].
Lemoine et Chassaing (2004), para além de reforçarem a ideia de se tratar de um
tipo de lesão bem tolerado, acrescentam que é raro o aparecimento efetivo de
instabilidade franca, decorrente da laxidão crónica por má cicatrização ou sua
ausência[5]. É considerado variável o período de latência até ao
desenvolvimento progressivo de lesões cartilagíneas, sobretudo femorotibiais
mediais e patelares - por aumento significativo das pressões (21% e 40%,
respetivamente), com diminuição da carga meniscal (meniscectomia funcional)[5].
Apesar de não se verificar relação entre o grau de laxidão, as funções
objetivas e subjtivas do joelho e a tendência à artrose, parece que quanto
maior o intervalo decorrido entre a lesão e o seguimento/ tratamento, maiores
as alterações degenerativas evidentes radiologicamente, particularmente de já
existirem alterações condrais aquando da lesão[1,10].
Clark et al (1996) demonstraram, num estudo com nível de evidência 3
(Classificação segundo Sackett et al Evidence-Based Medicine - How to Practice
and Teach EBM, 2000) que ocorre uma diminuição significativa da proprioceção em
joelhos com rotura do LCP, o que pode contribuir para o desenvolvimento dessas
alterações degenerativas[11].
Pelo estudo da história natural destas lesões conclui-se então que não se trata
de uma patologia benigna, ainda que possam ser toleradas por muito tempo[5].
TRATAMENTO
As abordagens terapêuticas conservadora ou cirúrgica visam reduzir a translação
posterior da tíbia[12].
A decisão quanto à terapêutica a instituir é no entanto difícil, pois para além
de frequentemente inconclusivos, os estudos publicados são muitas vezes de
qualidade duvidosa. Watsend et al (2009), recorrendo à escala de Coleman
(pontuação 0 a 100), avaliaram a qualidade dos estudos sobre o tratamento das
lesões isoladas e combinadas do LCP e concluíram que: a) os estudos com alta
taxa de sucesso têm um baixo nível na metodologia de conceção (média de 52) sem
diferenças signifi cativas entre os tratamentos conservador e cirúrgico; b) a
baixa qualidade geral da metodologia demonstra que é necessária cautela a
interpretar os resultados do tratamento das lesões do LCP[13].
TRATAMENTO NÃO-CIRÚRGICO
O tratamento conservador pode ser a primeira escolha de tratamento para doentes
com lesão isolada do LCP uma vez que o nível de incapacidade funcional, mais do
que a instabilidade objetiva, deve ser o principal fator de avaliação[10].
Os doentes que apresentam na RMN uma lesão do LCP consistindo consiste num foco
de intensidade de sinal aumentada em T2, mantendo a banda ligamentar contínua,
apresentam estabilidade articular preservada ou melhorada ao longo do tempo,
pelo que está indicado o tratamento conservador[14].
Por outro lado, ao ter em conta o potencial regenerativo do LCP, a translação
tibial posterior, ainda que inicialmente severa, pode diminuir aos 6 meses após
a lesão, altura em que Mariani et al (2005) advogam um segundo controlo
clínico, incluindo RMN para avaliar o processo cicatricial[15,16]. O tratamento
conservador - com imobilização seguida de fortalecimento muscular -
pode produzir bons resultados, particularmente nas lesões isoladas agudas com
instabilidade ligeira ou moderada (grau 1 ou 2) [4,9,16-22]. Recentemente, Ahn
e colaboradores (2011) concluíram que o tratamento conservador das lesões
agudas, com imobilização a prevenir a translação posterior da tíbia, origina
bons resultados funcionais e imagiológicos na RMN; em acréscimo, o baixo sinal
neste exame no seguimento no por tempo intermédio (superior a 24 meses) parece
ser um fator preditivo de bom prognóstico[23].
No entanto, embora esta abordagem possa originar resultados funcionais
razoáveis, tende a deteriorar-se com o tempo, devido ao desenvolvimento de dor,
alterações degenerativas e instabilidade progressiva, influenciando as
atividades de vida diária (AVD)[9,17-19,24].
Toritsuka et al (2004) verificaram que, no espaço de um a sete meses (média de
três) após a lesão e tratamento conservador, 88% de jogadores de
rugbyregressavam ao nível de desempenho anterior à lesão; contudo, no
respeitante à recuperação das capacidades, a resposta dos atletas foi
"não normal" para as atividades que requeriam a extensão do joelho
a partir de uma posição em flexão, tal como a corrida em velocidade, rodar e
saltar[25]. Outros estudos confirmam que cerca de que 80% destes doentes ficam
satisfeitos com o tratamento conservador, muitos retomando as atividades
prévias[20,26]. O resultado funcional parece ser tanto melhor quanto maior a
força quadricipital[7]. Permanece por esclarecer o tempo requerido para retomar
a atividade desportiva em termos competitivos e o nível de qualidade do
desempenho[25].
TRATAMENTO CIRÚRGICO
O objetivo primário da reconstrução do LCP é o restauro da anatomia normal
[27,28]. Pretende-se com isto alcançar a cinemática normal do joelho em todos
os graus de liberdade e prevenir a osteoartrose progressiva[3,29-31].
Permanece incerta a seleção dos doentes que devem ser sujeitos a reconstrução
da lesão isolada do LCP no período recente após a lesão[10]. Ainda assim,
parece haver consenso quanto à reserva da reconstrução cirúrgica do LCP nas
lesões ligamentares múltiplas ou isoladas associadas a instabilidade grave
(grau III) depois de reabilitação adequada[4,16,32]. Em 1999, Shino et al
propuseram também a estabilização precoce em jovens atletas com grau II de
lesão da superfície articular do côndilo femoral medial ou com rotura meniscal
longitudinal reparável[10].
Considerando a instabilidade crónica, Christel (2003) procurou num artigo de
revisão clarificar as questões da estratégia cirúrgica, partindo dos
pressupostos:
1) não se deve operar quando há uma gaveta posterior fixa (que não pode ser
reduzida manualmente);
2) o LCP com rotura deve ser reconstruído e não reparado;
3) todos os componentes da instabilidade devem ser corrigidos;
4) a reconstrução deve ser seguida de protocolos de reabilitação específicos
[33]. Num estudo retrospetivo, com nível de evidência IV, Wajsfisz et al (2010)
verifi aram que a reconstrução da lesão isolada crónica do LCP origina uma
correção parcial da laxidão posterior, proporcionando função aceitável nas AVD,
mas não nas atividades desportivas, mantendo-se incertos os resultados
subjetivos[34].
Após o seguimento durante 48 meses, de 43 doentes com níveis de atividade
elevados, Lien et al (2010) concluíram que a reconstrução das lesões isoladas
do LCP origina bons resultados funcionais, mantendo-se no entanto a
instabilidade e dor como principais queixas[35]. Ainda assim, as reconstruções
agudas/subagudas tiveram melhores resultados que as reconstruções crónicas[36].
Infelizmente, ainda não há evidências clínicas a determinar se as técnicas de
reconstrução mais recentes alteram significativamente a estabilidade e função
da articulação do joelho[3,17,37,38]. Trata-se por isso de um procedimento
desafiante, também pela dificuldade da técnica, variabilidade de resultados e
diferentes opiniões relativas à melhor opção cirúrgica, não existindo uma
técnica gold standard[20,32,39-42].
Entre as várias decisões que um cirurgião enfrenta na reconstrução do LCP
constam a escolha do enxerto (cerca de 10 possibilidades entre auto e
aloenxertos), a fixação tibial (encastoamento vs túnel transtibial), área de
inserção do túnel femoral (isométrica, central ou excêntrica) e o número de
feixes que deve constar na reconstrução (simples vs duplo)[4,33,43]. Com
múltiplas variáveis a literatura disponível sobre o tema é assim difícil de
interpretar[28]. A título de curiosidade, considerando de forma simplista todas
as possibilidades cirúrgicas supracitadas, teríamos de forma simplista cerca de
120 hipóteses reconstrutivas, o que exigiria igual número estudos prospetivos
para averiguar qual a técnica mais adequada.
As variáveis que podem afetar os resultados funcionais pós-operatórios incluem:
1) a reconstrução de outras lesões muitas vezes associadas às do LCP;
2) a complexidade do padrão de fibras do LCP, que é impossível de duplicar com
precisão;
3) a larga inserção femoral, responsável pela grande variedade de tensão nas
fibras durante o movimento do joelho;
4) a dificuldade na colocação precisa do túnel transtibial e a sua erosão ou
migração, que podem ocorrer ao longo do tempo;
5) o stress elevado a que pode ser sujeito o enxerto e seu alongamento pelo
ângulo agudo à entrada do túnel transtibial[4,44,45].
Nos últimos anos, duas novas técnicas reconstrutivas têm sido alvo de discussão
- a fixação por encastoamento tibial e a aplicação de enxerto em duplo-feixe
[37].
Via Aberta vs Artroscopia
A reconstrução cirúrgica do LCP pode ser categorizada como aberta, artroscópica
ou assistida artroscopicamente[2]. As duas primeiras vias oferecem fixação
inicial semelhante, proporcionando os mesmos benefícios biomecânicos; contudo a
via artroscópica parece apresentar mais vantagens, por reduzir
consideravelmente a morbilidade e permitir identificar facilmente a inserção
femoral, melhorando o nível de atividade e aliviando os sintomas[7,46,47].
Apesar de desafiante pelas dificuldades técnicas, a artroscopia contribui para
a não-incisão posterior (com invasão da cápsula) - fonte potencial de laxidão -
e para uma melhor visualização da implantação do LCP, possivelmente com
aplicação mais anatómica do enxerto, quando comparada com a via aberta[46]. Nas
desvantagens podem constar: a necessidade de abordar o compartimento posterior
do joelho, capacidade limitada para aumentar a fixação uma vez implantado o
enxerto (encastoamento tibial) e algum risco para as estruturas
neurovasculares, embora talvez menos que para o método transtibial tradicional
[46]. No sentido de contornar o risco de lesão dos vasos poplíteos -
complicação rara mas séria - Ahn et al (2007) propõem a libertação limitada da
cápsula posterior durante o procedimento artroscópico (na técnicatranstibial),
pois proporciona aumento significativo da distância entre o LCP e o feixe
neurovascular, diminuindo o risco iatrogénico[48].
Enxertos
Um item crucial no planeamento pré-cirúrgico é a escolha do enxerto - auto ou
aloenxertos e ligamentos sintéticos - e a sua fixação. O enxerto ideal - ainda
não alcançado - tem rápida incorporação, boa força e dureza e baixa morbilidade
[2,20].
O comprimento efetivo e propriedades do enxerto são importantes variáveis na
reconstrução do LCP, e devem ser determinados de acordo com o local onde será
fixado[49].
Os autoenxertos incluem o tendão-osso patelar, quadricipital e tendões isquio-
tibiais[20,50]. Os aloenxertos incluem, para além desses, o tendão de Aquiles e
os enxertos de tecidos moles como os tendões tibiais anterior e posterior
[20,50].
Não há opinião consensual nas indicações para aplicação de auto ou aloenxertos
na reconstrução do LCP. São ambos recomendados, uma vez que apresentam
resultados funcionais e clínicos comparáveis, sem diferenças estatisticamente
significativas na laxidão ligamentar e alterações radiográficas; as
complicações foram ainda assim mais prevalentes com os autoenxertos - dor
anterior do joelho (particularmente com o tendão-osso patelar) e
incompatibilidade com o túnel[20,50].
Os aloenxertos têm na reconstrução do LCP um maior campo de aplicação que no
LCA, pelas suas maiores dimensões[7]. Em acréscimo, o uso de aloenxerto mostrou
ser um procedimento bem sucedido e reprodutível, com tempo cirúrgico e
morbilidade diminuídos, com maior versatilidade nos casos primários ou de
revisão e melhor resultado estético[20]. No entanto, há ainda preocupação
quanto à segurança do tecido, ao custo mais elevado, lentidão da incorporação,
rejeição e alteração das propriedades estruturais pelos procedimentos de
esterilização e armazenamento[20].
Seguem descriminados os enxertos atualmente disponíveis:
1. Tendões isquio-tibiais: com quatro feixes (semitendinoso e gracilis), são
mais frequentemente usados como autoenxertos; originam resultados satisfatórios
por serem longos, com boas propriedades mecânicas (força e rigidez máximas),
associandose a maior facilidade de inserção artroscópica pelo túnel femoral
(ausência de bloco ósseo) e boa reprodutibilidade, sem prejudicar o aparelho
extensor do joelho[2,41,44,51-54]; comparativamente ao tendão de Aquiles, estes
autoenxertos em dupla-volta originam resultados clínicos comparáveis, apesar do
comprimento mais curto e menor diâmetro;[50] a ausência de bloco ósseo tem sido
associada a esclerose e alargamento dos túneis ósseos, embora seja desconhecido
o seu significado clínico;[2,14] por ser necessário no aumento de outras
estruturas lesadas associadas (nomeadamente posterolaterais), é com frequência
uma segunda escolha[2].
2. Osso-Tendão-Osso Patelar (OTO): é comumente usado graças à sua capacidade de
regeneração, com força suficiente; no entanto - para além de área seccional
reduzida (10 x 4mm), relativamente à fixação femoral, e para eventual
reconstrução em duplo-feixe - gera difi culdades na técnica transtibial(pela
necessidade de passagem de um dos blocos ósseos), podendo originar dor anterior
pós-cirúrgica no joelho dador[2,44,51].
3. Tendão de Aquiles: apresenta as desvantagens dos aloenxertos, mas associado
a bom tempo cirúrgico, morbilidade diminuída, comprimento e espessura
abundantes para as reconstruções de feixe simples ou duplo e fixação osso-osso
com interferência de parafuso num dos lados do túnel[20,44,50,51].
4. Tendão quadricipital com osso patelar - tendão quadricipital (OTQ):
autodisponível, apresenta grande área seccional (12 x 8 mm), comprimento
(superior a 130 mm) e tensão adequados - com um bloco ósseo numa das
extremidades - sendo facilmente associado à técnica artroscópica,
tornando-o uma escolha de enxerto aceitável para a reconstrução do LCP,
nomeadamente em duplo feixe[2,44,52] a limitação pósoperatória na amplitude de
movimentos, com atrofia dos músculos da coxa e recuperação incompleta da sua
força, pode ser um problema nestas reconstruções,o que exige uma maior ênfase
na reabilitação e recuperação da força extensora[51].
5. Outros enxertos: incluem a porção medial do gastrocnémio e tendão poplíteo
ou meniscal, contudo sem registo de sucesso[2].
Outras alternativas
Com o uso de autoenxertos de tendões isquiotibiais e OTO aumentaram os relatos
da morbilidade do local dador, pelo que o uso de ligamentos sintéticos poderiam
constituir uma alternativa de tratamento, ao evitar essas complicações[55]. Até
ao momento nenhum enxerto sintético foi indicado na reconstrução do LCP, pelos
problemas relacionados com o local de fixação, carga cíclica e fracasso por
fadiga, que têm sido difíceis de ultrapassar[2]. Ainda assim, o Sistema de
Reforço Ligamentar Avançado (SRLA) foi recentemente descrito como um material
apropriado para o efeito, embora com poucos estudos a focar especificamente a
comparação entre estes e os autoenxertos na reconstrução do LCP[55].
Constituindo um meio de crescimento fibroblástico e de células
tipoosteoblastos, a resistência à fadiga é a sua propriedade mais proeminente
[56]. Shen et al (2010), pela avaliação clínica e dos índices Lysholm e IKDC em
41 doentes sujeitos à técnica, por um período de 3 anos de seguimento,
concluíram que o SRLA parece tratar-se de um sistema efetivo, originando boa
estabilidade e função do joelho, sem complicações de local dador e sem registo
de rotura espontânea ou laxidão[57].
Já no que respeita o transplante do LCP, Davis et al (2006) mostraram que é
tecnicamente possível e que apresenta eficácia biomecânica; não obstante, são
necessários mais estudos para comparar esta técnica com aquelas já
estabelecidas[37].
Feixe simples vs duplo feixe
Contrariamente à reconstrução do LCA, a aplicação de um ou dois feixes é uma
questão em aberto[28,32,58].
Ambas as técnicas são desenvolvidas artroscopicamente[20]. A de feixe simples
pretende reconstruir o feixe anterolateral (AL), mais rígido e resistente à
força tênsil máxima de fracasso, com cerca do dobro da espessura do feixe
posteromedial (PM) [20,28]. Há estudos que indicam que a reconstrução do LCP
com duplo-feixe - reconstruindo os feixes AL e PM -, ainda que tecnicamente bem
mais exigente, restaura de forma mais precisa a anatomia e cinemática do joelho
que a de feixe simples[20,59,60]. Harner et al (2000), ao compararem as duas
técnicas a quatro ângulos de fl exão do joelho (30º, 60º, 90º e 120º),
verificaram que na reconstrução de duplo-feixe - contrastando com a de feixe
simples - a translação tibial posterior não diferiu significativamente em
relação ao joelho intacto e que esta reconstrução também restaurou mais
fielmente as forças in situ[28]. Já Markolf et al (2006) concluíram que a maior
força do enxerto e a redução da laxidão (1 a 2 mm entre 0 e 30º de flexão)
proporcionada pelo feixe PM, presente na técnica de duplo-feixe, não compensa o
tempo cirúrgico e material extra[26].
Vários autores defendem que não há diferenças significativas nos resultados da
aplicação destas técnicas, no que respeita a avaliação funcional, laxidão
ligamentar, grau funcional e alterações radiográficas do joelho, sendo
comparável a taxa de satisfação global com a cirurgia nas perspetivas do doente
e do cirurgião, como demonstrado por Bergfeld num estudo de nível de evidência
2b[58,61]. Por outro lado, este conceito da reconstrução em duplo-feixe parece
ter valor mais teórico que prático, tendo em conta: 1) os estudos anatómicos
que evidenciam que o LCP não pode ser dividido em dois feixes por constituir
num continuum de fibras[28] e 2) os estudos biomecânicos que sugerem o
alongamento simultâneo dos feixes AL e PM entre 0º e 120º e o seu encurtamento
a maior flexão, contrariando a hipótese de funções distintas e recíprocas
desses feixes[62].
Passo Femoral
A colocação do túnel femoral tem uma grande influência nos resultados clínicos
após a reconstrução do LCP[63]. A posição ótima deste túnel representa um
compromisso entre a laxidão do joelho e a força dos enxertos; a colocação do
túnel femoral pode ser guiada pela inserção original do LCP,[63] em posição
central ou excêntrica, na reconstrução de feixe simples, existindo contudo
controvérsia quanto à posição precisa[64].
Markolf et al (2006) estudaram a melhor localização para a sua implantação e
concluíram que um túnel colocado na posição AL ou central produz resultados
aceitáveis, devendo ser evitada a implantação posteromedial, na reconstrução de
feixe simples[63]. Conclusões semelhantes foram alcançadas por Petersen et al
(2006), postulando que a colocação do enxerto através de um túnel anterior pode
restaurar melhor a cinemática normal do joelho e as forças in situ do que um
túnel posterior, a maiores ângulos de flexão[59].
O uso da técnica dentro-fora pode resultar num ângulo enxerto/túnel femoral -
"canto crítico" - que excede o ângulo do túnel tibial, resultando em corte
transversal por stress, pressão interna no enxerto, laxidão e fracasso
prematuro com a carga[44,65]. Até estarem disponíveis mais estudos clínicos,
Handy et al (2005) sugerem a minimização do ângulo do enxerto e recomendam a
técnica fora-dentro para a colocação do túnel, para minimizar esse ângulo[65].
Neste último método, a colocação do túnel femoral na posição anatómica
superficial - localizada a 1-2 mm do bordo da cartilagem articular, será
teoricamente mais eficaz do que no ponto isométrico, localizado mais
profundamente[29].
Os riscos da aplicação de dois túneis femorais no côndilo medial prendem-se com
a remoção de osso adicional - o que pode interferir com o suprimento sanguíneo
do côndilo - podendo, em último caso, facilitar a fratura ou colapso subcondral
[28].
Passo tibial Técnica Transtibial
A técnica transtibial foi desenvolvida artroscopicamente através de vias
standard com a associação de uma via posterior para visualização e
instrumentação da implantação tibial[20].
Trata-se de uma técnica exigente e difícil, associada a risco de lesão
iatrogénica da artéria poplítea (aquando da aplicação do túnel), podendo
resultar no desenvolvimento de tecido cicatricial adjacente às estruturas
neurovasculares (dificultando futuras intervenções) e envolver o risco de
extravasamento de fluído no compartimento posterior da perna, colocando o
doente em risco de síndrome compartimental[20,27]. A angulação de 90º que
resulta da aplicação do túnel tibial - angulação fatal - mostrou criar pressões
internas aumentadas e conduzir possivelmente a alongamento do enxerto e
fracasso[28]. Ela poderá ser reduzida o túnel for aplicado anterolateralmente
em vez de anteromedialmente, o que parece originar um bom "corredor de
deslizamento" para o ligamento reconstruído[66-68].
Os resultados da reconstrução do LCP pela técnica transtibial têm sido
inconsistentes e poucos autores têm relatado resultados satisfatórios em
estudos de seguimento de longo tempo[44]. Num estudo de nível de 1b, comparando
ambas as abordagens, Wong et al (2008) concluíram que produzem resultados
clínicos comparáveis[69]. Kim et al (2009), num estudo de seguimento de longo
tempo (2 a 8 anos), não verifi caram diferenças clinicamente significativas, a
julgar pelos índices de Lysholm e IKDC[66].
No que respeita à implementação de dois túneis, considera-se que a inserção
tibial anatómica do LCP é suficientemente larga para permitir a colocação de
ambos, com ponte óssea entre eles[70].
Encastoamento Tibial
A reconstrução do LCP com a técnica de encastoamento tibial foi desenvolvida
como uma alternativa para evitar a angulação fatal, com relatos precoces do seu
potencial biomecânico e vantagens clínicas, embora ainda sem demonstração
consistente da sua supremacia no restauro da estabilidade anteroposterior
original[4,20,45,71,72].
A técnica de encastoamento tibial parece assim apresentar algumas vantagens: 1)
necessidade de menor comprimento do enxerto; 2) fixação anatómica no local de
inserção do LCP nativo sob visualização direta e 3) evitação da angulação fatal
[20,37]. As desvantagens incluem a dificuldade no posicionamento do doente
durante a cirurgia (de supina para lateral), necessidade de dissecção cirúrgica
da fossa poplítea, não-união do bloco ósseo tibial, abordagem menos familiar e
formação de cicatriz, podendo tornar difícil e perigosa a cirurgia de revisão
[20,71,73]. Kim et al (2004) propõem a via artroscópica para evitar a
morbilidade da via aberta, diminuir o tempo cirúrgico e o risco de infeção[71].
Bergfeld et al (2001) encontraram uma laxidão anteroposterior signifi
cativamente menor entre 30 e 90º de flexão e após carga repetitiva a 90º de
flexão, bem como menor potencial de degradação mecânica do enxerto pelo método
de encastoamento tibial, em relação ao método transtibial[26]. Markolf et al
(2002) verificaram que os enxertos resultantes da reconstrução por
encastoamento apresentam maior resistência a ciclos de carga repetidos que
aqueles da técnica transtibial[28]. Num estudo mais recente de seguimento por
um mínimo de dois anos, MacGillivray et al (2006) não identificaram diferenças
entre estas técnicas, nenhuma restaurando consistentemente a estabilidade
anteroposterior original, com enxerto de feixe simples[72].
Papalia et al (2010) concluíram que os ensaios randomizados são escassos, os
tempos de seguimento são curtos e os dados sobre a estabilização tibial
insuficientes, para determinar se esta técnica proporciona uma alternativa
consistente enquanto estratégia cirúrgica e sua eficácia[74]. Panchal et al
(2011) tiraram ilações semelhantes, no entanto acrescentam que o encastoamento
artroscópico apresenta vantagens em relação à via aberta, quer para o
encastoamento quer para técnica transtibial[75].
Fixação dos Enxertos
A fixação segura do enxerto é crucial na reconstrução do LCP, sendo considerada
o ponto mais fraco no período pós-operatório recente, enquanto o enxerto se
incorpora nos túneis ósseos[39].
Tendo em conta a revisão de estudos, Mariani et al (2005) citam que: 1) existe
correlação direta entre as cargas de fracasso e a densidade óssea; 2) há uma
grande variabilidade nas densidades ósseas (DO) (0,4 a 0,8 g/cm2) na porção
proximal da tíbia em indivíduos saudáveis; 3) o LCP exige uma fixação inicial
mais forte que o LCA, podendo ser insuficiente uma DO 0,6 g/cm2; 4) os
parafusos metálicos com 7 ou 9 mm de diâmetro são a opção preferida, podendo
ser inadequados se na presença de baixa DO; 5) o tipo de parafuso e as suas
características são importantes na estabilidade e cicatrização dos enxertos num
túnel ósseo[76].
Höher et al (2003) classificaram as técnicas de fixação em: 1) anatómica,
próximo da inserção original do ligamento (ex.: parafusos de interferência
metálicos e bioabsorvíveis); 2) extra-anatómica, longe da inserção nativa (ex.:
Endobutton, agrafos, parafusos e anilhas) e 3) dispositivos de fixação híbridos
[32].
Os parafusos metálicos podem causar laceração do enxerto e danificar algumas
fibras - podendo influenciar a força média de arrancamento requerida; por outro
lado, podem levantar problemas em cirurgias futuras (por exemplo osteotomias,
artroplastia do joelho)[76,77]. Já os implantes bioabsorvíveis possuem algumas
vantagens por não necessitarem de extração secundária, serem compatíveis com
avaliação complementar por RMN e poderem ser perfurados em cirurgia de revisão;
além disso, numa perspetiva biomecânica, vários estudos mostraram que a força
máxima suportada pelos implantes bioabsorvíveis é similar à dos metálicos,
parecendo ocorrer contudo deterioração dessa força e dureza quatro semanas após
a sua aplicação[76,77].
Ao compararem a fixação de interferência e a pós-fixação, Wang et al (2002) não
identificaram diferenças significativas nas cargas de fracasso, apesar de
diferentes mecanismos - deslocamento do bloco ósseo ou deiscência da sutura e
fratura do bloco ósseo, respetivamente[78].
Chen (2007) considera que a fixação adicional próxima do túnel ósseo, com um
parafuso de interferência combinado com fixação externa suspensa, originará
fixação mais rígida e adequada na fase pósoperatória, evitando o alongamento
progressivo do enxerto[4].
Fixação femoral
Na generalidade, na reconstrução de feixe simples, a fixação primária femoral é
efetuada com um parafuso de fixação bioabsorvível, com sutura e fixação, ou
anilha com ligamento e gancho; pela técnica de duplofeixe, os enxertos são
fixados por fitas de poliéster em conjunto sobre a ponte óssea; se for desejada
fixação adicional no ponto de entrada articular, pode ser usado um bioparafuso
suplementar nessa localização[2].
Muitos dispositivos de fixação, usados na reconstrução do LCA, têm sido
descritos para o procedimento no LCP[32]. Um destes, recentemente proposto, é a
técnica de fixação femoral com rigidfix para a reconstrução com tendões isquio-
tibiais[32]. Da aplicação desta técnica, o risco de lesão condral é alto,
variando entre 75 e 100%, de acordo com o declive dado ao orientador durante a
inserção da cavilha[32]. Rossi et al (2007) não recomendam por isso o uso
rotineiro desta nova técnica; não obstante, a ser o método preferido, sugerem o
declive do orientador a 0º[32].
Niedzwietzki et al (2007) compararam em modelos porcinos os métodos
extracortical e híbrido com interferência de parafuso de fixação, concluindo
que o segundo é superior ao primeiro[54].
Fixação tibial
A fixação tibial permanece o ponto fraco para o enxerto de LCP e poucos estudos
foram desenvolvidos neste sentido[76].
Na técnica transtibial, Margheretini et al (2005) sugerem que a reconstrução
com fixação combinada do enxerto - fixação distal e na margem proximal do túnel
- restaura mais proximamente a biomecânica do joelho intacto e as forças in
situ do LCP numa fase inicial, do que a reconstrução com a fixação distal
isolada, o que pode ser atribuído à diminuição do comprimento funcional do
enxerto e aumento da sua dureza[79]. O uso da fixação com rigidfix com
dispositivo Bio-TransFix proporciona uma fixação estável que é comparável com
aquela alcançada com a fixação com parafuso de bio-interferência[80].
Apesar da técnica de encastoamento tibial ser vantajosa, a fixação do bloco
ósseo com parafuso é necessária, o que pode levantar os problemas já referidos
[77].
Recorrendo ao uso de duplo-feixe em modelos porcinos, Zantop et al (2004)
verificaram que a fixação anatómica do enxerto, com parafusos de interferência
próximo da linha articular, pode restaurar de forma mais similar a cinemática
do joelho e as forças in situ do LCP normal, em comparação com a fixação
extracortical com agrafos[81]. Uma das explicações para os resultados da baixa
estabilidade desta última é a baixa dureza da construção enxerto/fixação[81].
Complicações
Para além das já citadas complicações inerentes às técnicas, elas podem estar
relacionadas com oenxerto: a) colheita, originando problemas no local dador; b)
colocação, podendo originar fratura da tíbia ou fémur por inadequada
inclinação; c) características do próprio enxerto, que pode romper-se ou
alongarse[14,26].
OUTRAS ABORDAGENS
Cada vez mais se afigura como possível a futura aplicação da terapia genética e
da engenharia tecidual nas mais diversas patologias, com novos estudos a serem
desenvolvidos no sentido de otimizar a abordagem da lesão isolada do LCP;
seguem-se algumas das propostas mais recentes.
Preservação das fibras remanescentes do LCP lesionado
Para alem da função mecânica, o LCP desempenha uma função propriocetiva, sendo
atualmente aceite que é extensamente inervado por mecanorrecetores com
importantes funções aferentes[15]. A rotura do LCP pode deste modo conduzir a
um défice de condução da sensibilidade propriocetiva[29].
Por outro lado, durante a reconstrução cirúrgica, são geralmente removidas
todas as fibras remanescentes deste ligamento lesado, para maior facilidade
técnica[29]. Tal conduz a deterioração da proprioceção logo após a
reconstrução, que parece ser recuperada a partir dos 18 meses após a cirurgia,
não alcançando contudo o mesmo grau do joelho contralateral normal, mesmo 24
meses depois[15]. Por isso, na reconstrução do feixe AL por via artroscópica
posterior trans-septal, alguns autores propõem o destacamento das fibras
restantes do côndilo femoral medial - para mais fácil visualização e
tensionamento - com colocação do túnel femoral pela técnica fora-dentro, para
manter a proprioceção e a estabilidade posterior do joelho[17,29]. Poderão ser
alcançados bons resultados clínicos, com a maioria dos doentes a referir
ausência de sintomas - tais como dor, tumefação ou falseio -, considerando o
joelho operado como normal ou quase normal[82,83].
Osteotomia tibial
Estudos anteriores mostraram que o aumento do declive tibial pode mudar a
posição de relaxamento da tíbia anteriormente, pelo que foram propostas
osteotomias que alteram este declive no tratamento das lesões do LCP[84]. No
seu artigo, vencedor do "Excellence in Research Award", Giffin et
al (2007) postulam as osteotomias biplanares para doentes com grau II ou III de
instabilidade posterior que evidenciaram um estreitamento precoce do
compartimento medial e/ou desalinhamento varo concomitante[84]. Os resultados
iniciais sugerem que esta técnica proporciona melhoria na estabilidade do
joelho, tal como redução álgica[84]. É necessário contudo o seguimento de
longo-tempo[84].
O papel do Óxido Nítrico (ON) na regeneração do LCP
Cao et al (2000) reuniram dados que indicam que, independentemente de
limitações impostas pelo ambiente biológico no qual os ligamentos se incluem,
as diferenças biológicas intrínsecas entre as células residentes do LCP, LCA e
ligamento colateral tibial (LCT) ajudam a determinar o seu potencial
regenerativo[85]. Estes autores observaram em coelhos que o óxido nítrico (ON)
endogenamente sintetizado é capaz de inibir a síntese de colagénio e de
proteoglicanos em ambos os ligamentos cruzados, mas com pouco efeito na síntese
de matriz pelo LCT, o que pode explicar a limitada capacidade de regeneração
dos primeiros[85]. Sugerem assim a possibilidade de suprimir farmacologicamente
a produção de ON pela administração de inibidores seletivos - livre de efeitos
colaterais, por não serem normalmente expressos em tecidos saudáveis[85].
REABILITAÇÃO
No tratamento conservador, para além da imobilização, treino da marcha e
monitorização/ reavaliação frequente, é importante ter em consideração os
pressupostos de Wilk (1994): a) os programas de reabilitação não devem ser
regimes rígidos; b) devem basear-se em critérios na progressão; c) devem estar
atualizados de acordo com os estudos mais recentes e d) o tecido em
cicatrização não deve ser sujeito a stress elevado[2].
Já no que respeita a abordagem pós-operatória, os objetivos iniciais são a
diminuição da dor, inflamação e tumefação, restabelecimento quadricipital e
restauro da função normal[4]. Os protocolos gerais, são desenvolvidos para: a)
minimizar a imobilização; b) permitir a cicatrização e remodelação num ambiente
de não-stress; c) identificar complicações potenciais desde o início; d) fazer
a progressão funcional; e) individualizar a reabilitação; f) utilizar uma
abordagem multidisciplinar (médico, fisioterapeuta, treinador e equipa de
trabalho)[2]. Os doentes geralmente retomam a atividade diária normal 3 meses
após a cirurgia e a atividade desportiva ligeira em 6 meses; a recuperação
completa da capacidade para a atividade desportiva pode ocorrer em 9 a 12 meses
[2,4]. O regresso à atividade desportiva competitiva é permitido quando o
doente apresenta completa amplitude de movimento, sem laxidão residual, dor ou
tumefação, e demonstra confiança à mobilização do joelho[2].
No passado, foi dada ênfase ao diligente fortalecimento quadricipital
(concêntrico e excêntrico) pelo sinergismo que partilha com o LCP na manutenção
da estabilidade anteroposterior, contudo a função do joelho resulta do balanço
sinergético de variáveis ósseas, musculotendinosas e de tecidos moles, exigindo
uma abordagem holística[86]. Assim, a questão que permanece é qual o modo de
exercício que melhor reabilita esta população de doentes[86].
A cocontração dos músculos quadricípital e isquio-tibiais são meios seguros
pelos quais se pode reabilitar o joelho reconstruído[42,86]. Escamilla et al
(2010) propõem cautela na reabilitação precoce, nos exercícios consistindo nas
investidas anteriores (em flexão elevada) e laterais (entre 40 e 80º) por
exporem o enxerto a forças de tensão elevadas, maiores na fase ascendente,
comparadas com a descendente[87].
Um dado de interesse é que, se os exercícios de mobilização do joelho forem
efetuados com o pé em flexão dorsal, o neo-LCP fica mais protegido, porque a
colocação em tensão dos gastrocnémios evita a translação posterior da tíbia[7].
Os protocolos de reabilitação não-agressivos são seguros após reconstrução
artroscópica, originando resultados clínicos e funcionais satisfatórios[88].
CONCLUSÕES
A história natural da rotura isolada do LCP ainda não está bem esclarecida.
O prognóstico do joelho com rotura isolada do LCP varia, embora apresente
tendência à deterioração articular e funcional do joelho, com aumento moderado
dos sintomas.
Esta lesão apresenta potencial regenerativo pelo que deve fazer-se um segundo
controlo aos seis meses após a lesão. Pode considerar-se o tratamento
conservador quando, na RMN, a lesão do LCP consiste numa banda ligamentar
contínua em T2. Geralmente preconiza-se esta abordagem nas lesões isoladas
agudas com instabilidade ligeira ou moderada (grau I ou II). Permanecem
controversos os resultados do tratamento conservador, particularmente em
atletas.
O objetivo primário da reconstrução do LCP é o restauro da anatomia normal do
LCP, contudo é incerta a seleção dos doentes a se sujeitos a esta abordagem.
Parece consensual a sua aplicação nas lesões ligamentares múltiplas ou isoladas
associadas a instabilidade grave (grau III) depois de reabilitação adequada.
Os enxertos com tendões isquiotibiais ou OTO têm sido usado com bons
resultados, tal como a aplicação da técnica de encastoamento; permanece por
esclarecer se existe vantagem na aplicação de duplofeixe (em relação ao feixe
simples). Ainda em estudo estão os ligamentos sintéticos e o LCP transplantado,
bem como a hipótese da preservação das fibras remanescentes, osteotomia tibial
ou administração de inibidores seletivos do ON.
Atualmente não podem ainda ser feitas recomendações firmes sobre qual a
terapêutica ou técnicas cirúrgicas a instituir, devendo prestar-se mais atenção
à qualidade da metodologia dos ensaios no que respeita ao seu desenvolvimento,
condução e resultados.
No que respeita a reabilitação esta deve ser individualizada de acordo com o
doente e seus objetivos funcionais, obedecendo, ainda assim, a protocolos
relativos à transição de fases.
Espera-se que no futuro a aplicação de fatores de crescimento, a engenharia de
tecidos e a terapia genética venham a desempenhar um papel importante no
tratamento das lesões ligamentares do joelho.
Como constatado, apenas três dos estudos citados são classificáveis em níveis
entre 1b e 3 - um de 1b, um de 2b e um de 3 - sendo assim necessários mais
estudos de nível de evidência 1 e 2 para melhor orientar estas lesões e
conhecer o estado da arte.