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BrBRCVHe0034-71672014000300415

BrBRCVHe0034-71672014000300415

variedadeBr
Country of publicationBR
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0034-7167
ano2014
Issue0003
Article number00415

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Determinantes biopsicossociais do processo de inclusão laboral da pessoa estomizada INTRODUÇÃO O interesse em pesquisar a inclusão laboral das pessoas com estoma iniciou-se durante prática profissinal em uma unidade cirúrgica, onde se observou o quanto os estomizados indagavam a respeito de seu processo de reabilitação, destacando-se o retorno ao trabalho.

A presença de um estoma determina inúmeras mudanças na vida dos indivíduos, pois, além da alteração da imagem corporal, da perda do controle das eliminações e da necessidade do uso de equipamentos coletores de fezes e/ou urina, existe o medo constante de não poder retomar as atividades de vida diária anteriores ao estoma. Esta problemática de saúde pode levar tais pessoas ao isolamento social, comprometimento financeiro negativo e ao sofrimento psicológico(1-5).

A inclusão no mundo do trabalho é um dos aspectos importantes na reabilitação do estomizado, principalmente naquelas pessoas com estomias definitivas e que se encontram na chamada "idade produtiva". Poder engajar-se em atividades que lhes possibilitem voltar às atividades laborais é essencial para recuperação da autoestima e superação de preconceitos, pois o trabalho faz o ser humano sentir-se útil e inserido no grupo, além de trazer o sustento financeiro, indispensável para sua sobrevivência e de sua família(1,6-7).

No capitalismo, a inclusão social se processa através do trabalho, o qual estabelece um elo entre o crescimento econômico e o bem-estar material das famílias. O cenário mundial e nacional representam atualmente um universo laboral marcado por um processo de precarização do trabalho, representado pelo desemprego, informalidade e estagnação da renda(8). Para a pessoa com deficiência, representada neste estudo como a estomizada, incluir-se neste cenário torna-se mais difícil, pois além de conviverem com os medos referentes a esta precarização, possuem mudanças físicas, sociais e psicológicas importantes, que podem resultar em empecilhos para seu retorno ao labor.

Diante desta problemática apresentam-se como objeto do estudo os determinantes biopsicossociais do cliente estomizado que facilitam e/ou dificultam sua inclusão laboral. Os objetivos traçados foram: identificar e analisar as dificuldades e facilidades dos estomizados para inclusão no mundo de trabalho.

A Saúde do Trabalhador é um campo do conhecimento que tem como objetivo entender as relações entre o trabalho e os processos de saúde/doença. No Brasil, apenas em dezembro de 2004, ocorreu a criação da Política Nacional de Segurança e Saúde do Trabalhador (PNSST) que definiu as diretrizes, responsabilidade institucionais, mecanismos de financiamento, gestão e controle social que passaram a orientar todos os planos de trabalho e ações intersetoriais(9-10).

Dentre os aspectos mais complexos relacionados à Saúde do Trabalhador, encontram-se a reabilitação profissional. A pessoa com deficiência, representada neste estudo pelos clientes estomizados, buscará em muitos momentos, retornar às atividades laborais, readaptando-se e buscando novas ocupações, que não prejudiquem sua saúde.

Para a pessoa com deficiência retornar às atividades laborais, é imprescindível que ela passe por um processo de avaliação que definirá se possui condições de retornar a mesma atividade exercida anteriormente. Caso não haja esta possibilidade, o indivíduo deve ser encaminhado a um Programa de Reabilitação Profissional que determinará, juntamente com o empregador, postos de trabalhos adequados às suas limitações. Reforça-se que as empresas devem possuir condições físicas adequadas para as pessoas com deficiência, assim como uma política de acolhimento, ao passo que sua condição de saúde não possa ser prejudicada pelo novo emprego ou ocupação(11).

Torna-se evidente que a pessoa com estoma, de acordo com a Política de Saúde do Trabalhador, incluindo-se nesta perspectiva, a questão da reabilitação profissional, tem direito ao retorno às suas atividades laborais, em condições adequadas à sua nova condição física e limitações. Essa pessoa também está respaldada legalmente pela Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência(12), que determina criação de cotas empregatícias nas empresas privadas e destina percentuais de vagas em concursos públicos para estes indivíduos.

Acredita-se que estudos como este contribuirão para o processo de reabilitação das pessoas com estoma, incentivando-os a retornarem às atividades laborais, adaptadas à sua nova condição de saúde. Auxiliarão na compreensão dos amigos, cuidadores e familiares dos estomizados de que eles estão aptos a retornarem para suas atividades de vida diária, destacando-se o trabalho; assim como servirão de fonte de consulta para os profissionais de saúde, principalmente na área da Saúde do Trabalhador e Estomaterapia, reforçando a importância do processo de inclusão laboral desta clientela.

METODOLOGIA O estudo foi do tipo descritivo-exploratório, de natureza qualitativa. A pesquisa descritiva procura alinhavar as características de uma população ou fenômeno, levantando opiniões, atitudes e crenças de um determinado grupo, possuidor de características comuns. A respeito das pesquisas exploratórias, elas são desenvolvidas com temas ainda pouco explorados, objetivando uma visão mais geral sobre o tema, com a finalidade desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e ideias(13).

A opção pela pesquisa qualitativa permeia a busca pelo subjetivo, pelo relato das experiências e das relações humanas, pelo mundo dos significados, pois enfatiza a compreensão da experiência humana vivenciada, concentrando-se nos aspectos dinâmicos, holísticos e individuais dos fenômenos, tentando capturá- los em sua totalidade, dentro do contexto dos que o experimentam(13).

O cenário da pesquisa foi um Instituto Municipal de Medicina Física e Reabilitação, localizado no Rio de Janeiro-RJ, que conta com serviço de referência a clientes estomizados, possuindo um Programa de Atenção à Pessoa Portadora de Ostomia.

Participaram do estudo vinte clientes, portadores de estomia definitiva, entre 35 e 62 anos, que foram trabalhadores em algum momento de suas vidas, que não possuíam complicações de saúde as quais os impedissem de exercer atividades laborais, e que tiveram interesse em participar do estudo, devido ao seu caráter voluntário, adequado aos procedimentos éticos.

A coleta de dados ocorreu no período de janeiro a março de 2010, no período da manhã, por meio de uma entrevista semiestruturada, gravada em um aparelho de MP4. Antes de se iniciar as entrevistas, o projeto foi encaminhado para apreciação e aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Secretaria Municipal de Saúde da Prefeitura do Município do Rio de Janeiro, através do qual se obteve parecer favorável sob 274ª/2009. Aos sujeitos do estudo foi fornecido um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), o qual explicava os objetivos e a relevância do estudo, além de outras informações importantes para atender as Resoluções 196/1996 e 466/2012 do Ministério da Saúde, que trata dos procedimentos de pesquisas com seres humanos. Posteriormente, esse termo foi assinado em duas vias, pelos sujeitos e pela pesquisadora, antes do início da coleta dos dados.

Cabe informar que, para assegurar o anonimato dos sujeitos da pesquisa, foi criada uma codificação, na qual se inseriu a letra "E" fazendo alusão à palavra "entrevista", seguida por números cardinais, de um a vinte, indicando a ordenação em que os sujeitos foram entrevistados.

Para análise dos dados utilizou-se a técnica de Análise de Conteúdo, baseada em Bardin, a qual preconiza o desenvolvimento de três etapas a fim de tratar os dados coletados: a pré-análise, a exploração do material e o tratamento dos resultados por meio de inferência e interpretação(14). As 482 unidades de registro identificadas na entrevista foram agrupadas em seis pré-categorias, que originaram a Categoria Empírica: O estomizado e sua problemática biopsicossocial.

Ressalta-se que a metodologia empregada mostrou-se apropriada para atingir os objetivos e apreender o objeto apontado, pois a inclusão laboral das pessoas com estoma é ainda um tema pouco explorado, que necessita ser estudado e aprofundado, para abrir caminhos a novas pesquisas na área.

RESULTADOS Caracterização dos sujeitos A caracterização dos sujeitos do estudo foi: 11 (55%) eram do sexo feminino; 14 (70%) possuíam menos de 60 anos; 10 (50%) tinham ensino fundamental incompleto, o que indica uma baixa escolaridade na maioria dos clientes; 14 (70%) eram casados; 11 (55%) tinham renda familiar de 1 a 2 salários mínimos.

Em relação aos empregos anteriores à existência do estoma, verificou-se que os sujeitos atuavam em diversas áreas, tendo como maior representatividade o trabalho doméstico (10%), ou seja, o Setor Serviço. Constatou-se também que as referidas ocupações requeriam pouca qualificação, o que está em consonância com o nível de escolaridade apresentado anteriormente. Identificou-se uma grande representatividade de sujeitos que ainda trabalham informalmente (15 (75%)), sejam eles aposentados por invalidez ou recebedores de auxílio-doença.

Em relação ao tempo de estomizado, verificou-se que variou de 1 a 24 anos, sendo que o principal motivo que levou ao estoma foi o Câncer Colorretal (11 (55%)). A presença de complicações no estoma acometeu 7 (35%) dos clientes em algum momento, destacando-se irritação na pele periestoma (2 (30%)). Destaca-se que no momento das entrevistas, estes estomizados não possuíam complicação alguma que os limitassem em relação à inclusão laboral.

Após a apresentação acerca da caracterização dos sujeitos, optou-se por expor os resultados referentes à categoria emergida a partir da aplicação da técnica de análise temática de conteúdo.

O estomizado e sua problemática biopsicossocial Considerou-se importante apresentar os sentimentos dos sujeitos com relação à existência do estoma em seu corpo, pois este foi um discurso muito recorrente e impactante em suas falas.

A presença do estoma desperta sentimentos positivos, negativos e de aceitação nos clientes estomizados, representados pela possibilidade de continuação da vida, pelas dificuldades inerentes à perda do controle esfincteriano, e pela adaptação, frente à sua condição de saúde, como identificado nos depoimentos: O que interessa é estar vivo. (E 3) É melhor ter a colostomia do que morrer. (E 7) Porque uma colostomia é um meio de você ter uma vida nova, de reconstruir a vida, de estar com a família, de continuar com meus planos. (E 16) A gente vai sobrevivendo porque colostomizado é horrível, é a pior coisa que tem pra mim. (E 7) O estoma é uma coisa muito constrangedora, a gente se sente inferiorizada, a gente se sente diferente. (E 12) Vou seguindo a vida normal, eu me acostumei, me adaptei para falar a verdade. (E 3) Eu estou acostumado, eu não ligo mais. Estou bem. (E 6) A seguir expõem-se os fatores facilitadores e dificultadores para o retorno e / ou manutenção dos estomizados no mundo do trabalho, relacionados aos âmbitos físicos e psicossociais, exemplificados com alguns depoimentos desta clientela.

As principais dificuldades encontradas pelos estomizados para retornarem ao trabalho, relacionadas ao âmbito físico/ biológico incluíram: a) esforço físico no trabalho: Agora em relação às dificuldades para o trabalho, tem o esforço físico. Eu como não tenho uma profissão, não tenho estudo, tenho que trabalhar braçal mesmo, não tem como fazer, tenho que pegar peso.

(E 2) b) as alterações na pele periestoma; c) dificuldades inerentes à perda do controle esfincteriano: Porque nós que estamos estomizados, nós não temos mais o controle não, toda hora você está evacuando, a bolsinha está enchendo, e você tem que ficar esvaziando. (E 5) d) presença de odor, gases, volume e diarreia: Assim, você estar no meio do povo e o odor que sai e você no meio do público. (E 2) Porque quando você solta gases, deixa o odor. Como você vai se comportar? (E 5) e) exposição a altas temperaturas.

Ainda em relação às dificuldades físicas e biológicas para inclusão laboral dos estomizados destacam-se: f) dificuldades de higienização do estoma e banheiros inapropriados: A maior dificuldade, eu acho que é a higiene que você sempre tem que estar fazendo, entendeu? Porque você em casa, você tem uma higiene mais tranquila, agora você trabalhando, você não vai ter aquela higiene que você tem em casa. (E 5) Dificuldade é na hora de ir ao banheiro, na hora da troca do material, estando num lugar público, é muito difícil, porque a gente não encontra um banheiro adequado. (E 8) g) alterações físicas não relacionadas ao estoma; h) problemas de adaptação em relação ao material oferecido (equipamentos coletores); e i) a falta de disponibilização governamental de equipamentos coletores e adjuvantes em quantidade e qualidade adequados: E aqui, pelo governo, não vem o carvãozinho, você tem que comprar, um carvão desse são 3 reais, uma cartela com 10 30 reais. Não . (E 5) Às vezes acontece de não ter bolsa como ocorreu, a gente ter que comprar.(E 11) Sobre as dificuldades psicossociais, verificou-se que elas centraram-se: a) no isolamento social e na discriminação sofrida nos ambientes laborais: Assim, em relação à dificuldade, eu acho que seria o isolamento social, assim você estar no meio do povo, e sente que está fendendo.

(E 2) Eu acho que a maior dificuldade é o preconceito, principalmente o preconceito leva as pessoas a se afastarem das outras. (E 16) b) nas dificuldades com transportes para chegarem ao trabalho; c) na impossibilidade de retornarem à atividade exercida antes do estoma: Não posso trabalhar de diarista como eu trabalhava, não posso fazer aquela faxina que eu fazia. (E 1) Não posso mais trabalhar como pedreiro. (E 4) d) no desconhecimento da sociedade em relação ao que é ser uma pessoa estomizada: Voltar ao trabalho é difícil porque atrapalha um pouco as pessoas que não estão acostumadas com isso, acham que somos problemáticos. (E 6) As pessoas não têm consciência, pois não sabem o que a gente tem, fazem uma porção de ideias erradas. (E 10) e) na inflexibilidade e na falta de condições dignas no trabalho: E a gente assim, trabalhando fora, dependendo do serviço fica muito tempo em , ou muito sentada, eu acho que não fica legal. Na minha casa eu trabalho com artesanato, eu fico sentada, meia hora levanto, vou ao banheiro, eu faço o que eu quero, eu fico livre! E trabalhando fora eu não vou ter esse privilegio. (E 10) f) na deficiência de qualificação profissional apresentada pelos sujeitos.

Nessa categoria, ao se discutir também as principais condições favoráveis ao retorno do estomizado ao trabalho, foram lembradas as seguintes: a) aquisição de um trabalho leve e sem exposição ao calor, citados em 8 entrevistas, representando 27 Unidades de Registro; b) trabalho flexível, que lhes garanta a possibilidade de irem constantemente ao banheiro, e às consultas com a equipe multidisciplinar; c) presença de banheiros e de condições de higiene apropriadas: Deveria ter um banheiro para nós, para evitar problemas. (E 6) Desde o momento que você sai para trabalhar fora, tem que ser um local onde você possa usar o banheiro com tranquilidade. (E 8) Outros fatores importantes que emergiram foram: a) a aceitação e adaptação à condição de estomizado; e b) o conhecimento a respeito do funcionamento mais controlado e regrado do estoma, mesmo com a realidade da incontinência.

DISCUSSÃO A caracterização dos sujeitos da pesquisa evidenciou alguns fatores que predispunham ao retorno destas pessoas ao mundo do trabalho: idade inferior aos 60 anos em 70% (14) dos casos; arranjo familiar com mais de um indivíduo residindo com o estomizado; pouco número de trabalhadores que proviam o lar financeiramente e baixa renda familiar. Assim, esses fatores quase que os impeliram financeiramente a complementar a renda familiar, exercendo atividades laborais, além do recebimento de benefícios governamentais.

Os sentimentos positivos em relação à confecção do estoma centram-se na questão da sobrevivência, da manutenção da vida, de poder continuar projetos e, nessa perspectiva, pode-se aludir à questão do trabalho, ou não, mas é possível que essas pessoas, por estarem inseridas em uma sociedade capitalista, produtiva, valorizem e queiram retomar suas atividades laborais, sem contar que o estoma é identificado como uma possibilidade de cura da sua patologia de base(15).

Os sentimentos negativos em relação ao estoma abrangem todas as dificuldades ocasionadas na vida dos sujeitos, destacando-se a perda do controle esfincteriano e a dependência do equipamento coletor, que trazem desconforto e incômodo, podendo levar ao sofrimento e à sensação de mutilação(16).

O sentimento de aceitação do estoma, presente nas falas de seis estomizados, demonstra que alguns sujeitos convivem relativamente bem com o mesmo e tentam vencer os obstáculos que aparecem em seu cotidiano, revelando adaptação frente à sua nova condição de vida e apontando para um processo de reabilitação consolidado ou em vias de consolidação, o que favorece a inclusão social, e no trabalho.

Depreende-se, através dos relatos, que a adaptação pode ocorrer com o tempo, sendo normal que os clientes estomizados desenvolvam estratégias de enfrentamento em relação a estar estomizado e passem a lidar mais tranquilamente com os problemas e modificações cotidianas, reforçando, porém, que esse período de aceitação varia de indivíduo para indivíduo(17).

A restrição em relação ao excesso de esforço físico é apontada como importante agente dificultador da inclusão laboral pelos sujeitos do estudo, pois devido aos baixos índices de escolaridade, alguns exerciam anteriormente atividades associadas à elevação de grande quantidade de peso. O retorno do estomizado a este tipo de atividade laboral pode ocasionar alterações negativas em sua saúde, causando complicações no estoma, como a hérnia e prolapso, quando associadas à ausência de demarcação do local do estoma no período pré- operatório(3).

Reforça-se que os sujeitos sabem de suas limitações em relação aos esforços físicos e tentam evitá-los. Porém, essa limitação acarreta dificuldade de encontrar empregos, e até mesmo faz com que a pessoa estomizada perca emprego/ trabalho. Logo, enfatiza-se que é necessária a criação de novas oportunidades aos estomizados, as quais estejam adequadas às suas condições de saúde, pois uma das metas principais do processo de reabilitação da pessoa com deficiência é o não agravamento de sua limitação(18).

As dificuldades para retornar ao trabalho também foram relacionadas à existência de complicações no estoma, especialmente na pele periestoma. É importante destacar que essas alterações cutâneas relacionam-se, inúmeras vezes, a cuidados inadequados de higiene; às características da pele de cada cliente; à confecção do próprio estoma (a técnica cirúrgica empreendida); e à não adaptação correta do dispositivo coletor que fica solto, ocasionando contato da pele íntegra diretamente com as fezes; ou a própria cola da placa, que pode causar irritação na pele(1,15).

A perda do controle esfincteriano, associada à presença de odor, gases, volume elevado de efluente e diarreia são considerados por alguns estomizados do estudo como grandes dificultadores de retorno ao trabalho, pois, a qualquer momento, as fezes podem encher a bolsa coletora, ocasionando vazamento e constrangimentos diversos. Ou, se não, ele terá de ir ao banheiro sistematicamente para esvaziar o equipamento coletor, o que pode gerar aborrecimento do empregador. Logo, muitos preferem isolar-se, para evitarem o preconceito social.

Alguns dos sujeitos citaram como dificuldade o fato de retornarem para empregos que os expunha a altas temperaturas, e os ambientes de trabalho não possuíam climatização adequada. O ideal para o cliente estomizado é trabalhar em um local ventilado, e em profissões que evitem a exposição do estoma à temperatura elevadas, pelo alto risco de prejuízo à sua integridade física, levando a queimaduras locais, e até mesmo, como citado anteriormente, à dermatite local, além do risco de desidratação.

Destaca-se nos relatos a grande dificuldade que o estomizado encontra estando fora de seu ambiente doméstico para higienizar-se. Para que os clientes com necessidade especiais retornem ao trabalho, é necessário que o ambiente laboral esteja adaptado às suas limitações, logo banheiros apropriados deveriam existir nas empresas, e também nos locais públicos, o que evitaria grandes constrangimentos para esses trabalhadores.

Os problemas referentes a adequação e uso dos equipamentos coletores e adjuvantes também podem dificultar o retorno do estomizado ao trabalho, pois o governo não disponibiliza alguns materiais considerados essenciais para o processo de reabilitação da pessoa com estoma, como o filtro de carvão, o sistema de irrigação e tampão oclusor; sem contar a baixa qualidade e quantidade, que às vezes não suprem as necessidades dos clientes(3).

Cabe tecer uma reflexão sobre a forma como tem sido feito o fornecimento desses materiais, pois a distribuição dos referidos insumos é realizada através de cotas, e, muitas vezes, os clientes não são avaliados individualmente ou de acordo com suas necessidades. A aprovação do Programa de Atenção aos Clientes Ostomizados, que ocorreu sob a Portaria 400/09 é uma tentativa de organizar os Serviços de Atendimentos aos Estomizados no país, e de determinar os equipamentos a serem fornecidos gratuitamente no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS)(19).

Em relação às dificuldades psicossociais, é interessante verificar que o isolamento social está condicionado e enraizado na maioria dos sujeitos e que, por sua vez, articula-se com os problemas de ordem física / biológica decorrentes do estoma como a presença de gases, odor, incontinência, diarreia; levando-os, assim, ao afastamento do convívio social. O medo de voltar ao trabalho e de ser discriminado pelos colegas e patrões torna-se peça chave a ser trabalhada no processo de reabilitação desses indivíduos.

As dificuldades com transportes e locomoções para chegar ao trabalho também fazem parte da acessibilidade. É importante lembrar que, respaldada nos fundamentos teóricos da Saúde do Trabalhador, não basta apenas reinserir os estomizados no trabalho, sem mudar alguns componentes de sua organização, do processo laboral e mesmo do ambiente de trabalho, pois se poderia agravar o seu estado de saúde(1,14).

Outro fator psicossocial que acaba afetando a volta dos sujeitos ao mundo do trabalho é o fato de não poderem retornar às mesmas atividades laborais realizadas antes da construção da estomia, o que acaba abalando a dimensão psicológica dessas pessoas, que aprenderam o ofício de uma determinada profissão e, de repente, se veem impossibilitados de realizarem o que foram preparados cognitiva e fisicamente para tal e mais: o que provavelmente tinham prazer em fazer.

Além disso, as inúmeras dificuldades geradas pela falta de aprendizado e oportunidades educacionais e de orientação acabam fazendo com que esses clientes passem a preferir viver com benefícios governamentais a enfrentar as dificuldades de retorno ao trabalho, acomodando-se num mundo de frustração e de isolamento.

O desconhecimento da sociedade do que é um estoma e do que é ser um estomizado favorece ao isolamento e afastamento social destes indivíduos, pois o desconhecimento leva ao preconceito e ao pré-julgamento do estomizado como incapaz, limitado, e sem condições de retorno ao trabalho(3).

Uma das consequências do capitalismo e do neoliberalismo é o grande índice de desemprego que assola a população. Quando o indivíduo consegue inserir-se neste mundo do trabalho tão seleto e restrito, acaba por aceitar as condições muitas vezes inflexíveis e precárias de trabalho.

É evidente que o estomizado necessita de alguma flexibilidade no local de trabalho, principalmente relacionada a sua necessidade contínua de ir ao banheiro; além da necessidade de ser liberado para ir às consultas com a equipe multiprofissional de saúde. Infelizmente, muitas empresas não fornecem este "tempo" para o estomizado, ou para qualquer pessoa com deficiência, o que os incentiva a optarem pela informalidade laboral, permanecendo sem direitos empregatícios.

Em relação aos fatores facilitadores para inclusão laboral dos estomizados, torna-se essencial o conhecimento a respeito do funcionamento mais controlado e regrado do estoma, mesmo com a realidade da incontinência. Sendo assim, alguns desses sujeitos referem que, com o passar do tempo, conseguem perceber a movimentação do bolo fecal, sabendo, inclusive, quando irão evacuar. Esta percepção não deixa de ser um mecanismo de controle, com o qual eles podem ir ao banheiro e verificar se será necessário fazer o esvaziamento e higienização do dispositivo coletor, evitando, assim, o extravasamento de fezes e o constrangimento perante o meio social(4).

A aceitação e a adaptação à condição de estomizado tornam-se importantes para que o indivíduo aceite a sua nova condição de saúde e aprenda também a lidar com ela. Cabe lembrar que, na presente pesquisa, os sujeitos são estomizados definitivos, e que, compreendem melhor a necessidade de adaptar-se à sua nova condição, que o estoma os acompanhará pelo resto de suas vidas(20).

Existem profissões e ocupações em que os estomizados podem atuar com habilidade e competência, sem prejudicarem sua saúde, tais como: atividades mais burocráticas e acadêmicas, que não demandem uso de força e de muito gasto físico; profissões que permitam que essas pessoas não permaneçam nem em e nem sentados por longos períodos; e atividades que não exponham o estoma ao calor e ao frio excessivo.

Reforça-se que a indicação de profissões e/ou ocupações mais adequadas à clientela estomizada, dependerá de criteriosa avaliação do cliente e determinação de suas limitações e capacidade funcional, destacando que todos os indivíduos são únicos e devem ser avaliados holisticamente pelos peritos da previdência social e profissionais dos Serviços de Saúde do Trabalhador. O Serviço de Saúde do Trabalhador deverá acompanhar sistematicamente as pessoas estomizadas que se inserem ou reinserem no mundo do trabalho, verificando se a atividade laboral não agrava sua condição de saúde(18).

CONCLUSÕES Os resultados do estudo contemplaram o objetivo da pesquisa e auxiliaram a conhecer mais profundamente as facilidades e dificuldades dos estomizados em relação à inclusão laboral.

Os fatores dificultadores para o retorno e manutenção dos estomizados no mundo do trabalho, perpassam desde questões de âmbito físico/biológico, até situações pertinentes a esfera psicossocial dos indivíduos, demonstrando que o processo cuidar/cuidado das pessoas estomizadas devem pautar-se numa assistência holística e integral.

As dificuldades de inclusão laboral estão inicialmente centradas na própria condição física relacionadas à perda do controle esfincteriano e aos constrangimentos que possam ocorrer devido extravasamento do efluente, entre outras situações que intimidam as pessoas estomizadas. Destaca-se que, aliadas a estas dificuldades, encontram-se as barreiras arquitetônicas dos locais de trabalho, com a falta de condições adequadas para higienização da bolsa coletora; e as dificuldades de acesso e adaptação aos equipamentos coletores, em quantidade e qualidade, adequados aos indivíduos.

As barreiras psicossociais advêm do medo do estomizado em sofrer rejeição e preconceito, pois devido ao desconhecimento, a sociedade julga estes indivíduos como incapazes de realizarem normalmente suas atividades de vida diária. A configuração atual do mundo do trabalho e a falta de apoio governamental afastam estas pessoas da vida laborativa, principalmente pela falta de programas de apoio e capacitação profissional às pessoas com deficiência.

Os órgãos governamentais têm o dever de fazer campanhas de esclarecimento à população, para que se diminua o preconceito em relação ao estomizado, para que ele possa adentrar ao mundo do trabalho com mais tranquilidade e confiança.

As condições facilitadoras de inclusão laboral podem se elencadas como: a) o fornecimento de ambientes laborais adequados às deficiências dos indivíduos; b) flexibilidade de horário de trabalho, para comparecimento às consultas da equipe de saúde; e c) a presença de banheiros higiênicos limpos e adaptados.

Estas medidas são garantidas pela Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, mas que não são cumpridas e nem fiscalizadas eficientemente na prática.

Considera-se que o retorno das pessoas com estoma ao ambiente laboral não depende exclusivamente destes indivíduos, mas sim de uma rede de apoio social formada pelos governantes, profissionais da saúde, educadores, empregadores, colegas de trabalho, familiares; e toda sociedade. Esta rede de apoio deve fornecer aos estomizados condições e orientações adequadas de reassumirem as atividades sociais, garantindo-lhes o fornecimento de equipamentos coletores e adjuvantes de qualidade e em quantitativo suficientes, que facilitem seu processo de reabilitação. Além dessas medidas, salientam-se a necessidade de elaboração de programas de capacitação profissional e criação de uma política pública que englobe as dimensões psicossociais da clientela estomizada, aprovando e fazendo cumprir leis que garantam sua inclusão na sociedade.

Os enfermeiros atuantes na reabilitação das pessoas com estoma devem fornecer orientações sobre inclusão social, destacando-se o trabalho, buscando juntamente com os estomizados e familiares, alternativas para superação das dificuldades biopsicossociais que serão encontradas no retorno às atividades de vida diária e trabalho. Logo, o apoio social é uma estratégia importante no incentivo à inclusão laboral dos estomizados.

Acredita-se que o conhecimento científico produzido a partir de estudos sobre a inclusão laboral da pessoa com estoma torna-se uma importante ferramenta de pesquisa para os profissionais de enfermagem, que auxiliará no entendimento de questões ligadas ao Cuidado de Enfermagem em Estomaterapia e à Saúde do Trabalhador.


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