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EuPTCVHe0871-97212013000200005

EuPTCVHe0871-97212013000200005

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioLife Sciences
Great areaHealth Sciences
ISSN0871-9721
ano2013
Issue0002
Article number00005

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Avaliação da evolução e controlo da asma em grávidas num serviço de Imunoalergologia

INTRODUÇÃO A asma, doença respiratória crónica, é reconhecida como uma patologia potencialmente grave e a que mais frequentemente complica a gravidez1-5.

A evolução individual é imprevisível, no entanto a generalização de que cerca de um terço das asmáticas melhoram durante a gravidez, outro terço agrava e o último terço se mantém estável, é comum1-4.

Estudos referem que as exacerbações da asma ocorrem em cerca de 20% de todas as grávidas asmáticas, sendo o valor superior nas doentes com asma grave6.

As asmáticas grávidas que conseguem um controlo adequado da sua patologia neste período têm menor risco de complicações perinatais, nomeadamente atraso de crescimento intra-uterino, parto pré -termo ou malformações fetais1.

O objectivo deste estudo foi avaliar a evolução e controlo da asma em grávidas seguidas em consulta de Imunoalergologia.

MATERIAL E MÉTODOS Foi efectuada uma análise retrospectiva dos processos clínicos de doentes asmáticas seguidas durante o período de gravidez numa consulta especializada de Imunoalergologia.

?ões do Global Initiative for Asthma(GINA) de 20077 a asma foi classificada em intermitente, persistente ligeira, moderada ou grave, tendo em conta a sintomatologia, exacerbações, limitação da actividade, necessidade de medicação de alívio e nível de função pulmonar (Quadro_1).

As doentes asmáticas grávidas incluídas no estudo foram acompanhadas sempre pela mesma médica e observadas mensalmente em consulta. Em cada visita foi colhida história clínica, realizado exame objectivo, avaliação da função pulmonar com espirometria simples e medida a fracção de óxido nítrico no ar exalado (FeNO). Foi igualmente pedido a cada doente para responder ao questionário ACT® para auto -avaliação do controlo da asma. A análise foi feita em cada trimestre da gravidez e no período pós-parto.

Tendo em conta os parâmetros anteriores, a sintomatologia apresentada em cada consulta, os recursos ao serviço de urgência, a necessidade de medicação de alívio, de corticoterapia sistémica e alteração da terapêutica habitual, foi efectuada igualmente uma análise subjectiva da evolução da asma em cada trimestre e ao longo da gravidez (análise global), tendo sido classificada como havendo melhoria, manutenção ou agravamento da doença.

Para a análise estatística foi utilizado o programa SPSS 16.0, tendo recorrido, para as variáveis categóricas, ao teste qui-quadrado e para as quantitativas, ao teste de Mann-Whitney. Quando comparadas variáveis categóricas em várias classes recorreu -se ao teste de Kruskall-Wallis.

Foram considerados estatisticamente significativos valores de p < 0,05.

RESULTADOS Foram analisados 29 processos clínicos, tendo sido excluídas três doentes (uma por interrupção médica da gravidez e duas por não se ter confirmado a suspeita de asma, no período pós-parto). As restantes 26 grávidas, com diagnóstico prévio de asma, foram incluídas no estudo.

As grávidas tinham entre 18 e 36 anos, com uma média de 27,6 anos (± 4,9 anos) (Quadro_2).

A asma foi classificada como intermitente em 11,5% das doentes, persistente ligeira em 30,8% e persistente moderada em 57,7%. Vinte doentes (76,9%) tinham também rinite associada. Dezanove doentes eram atópicas (73,1%), 4 não atópicas (15,4%) e 3 não tinham realizado ainda testes cutâneos, o que iria ser feito após o período de gravidez.

Seis doentes tinham apenas prescrita medicação de alívio e 20 grávidas faziam diariamente corticóide inalado (associado ou não a outros fármacos). Três grávidas estavam sob tratamento com imunoterapia específica, que mantiveram durante este período.

Nos três trimestres da gravidez e no período pós-parto, a maioria (entre 66,7 e 83,3%) das grávidas apresentou uma função pulmonar normal, com valores do volume expiratório forçado no primeiro segundo (FEV1) acima de 80%. Nenhuma grávida teve valores de FEV1 inferiores a 60% e ao longo da gravidez mais grávidas atingiram melhores valores de função pulmonar, evolução que não atingiu, no entanto, valor estatisticamente significativo (p = 0,248) (Quadro 3).

No primeiro trimestre de gestação metade das grávidas apresentou valores elevados de FeNO, significando maior probabilidade de inflamação brônquica. Ao longo da gravidez, a probabilidade de inflamação foi diminuindo, com mais grávidas a terem valores de FeNO inferiores a 35 ppb (75% no segundo trimestre e 80% no terceiro trimestre), tendência que se manteve após o parto (80% das grávidas) (Quadro_3).

A auto-avaliação do controlo da asma efectuada pelas doentes, através do preenchimento do questionário ACT®, mostrou haver total controlo da doença (ACT=25) em apenas 28,6% no primeiro trimestre, 22,2% no segundo trimestre e 30% no terceiro trimestre. Nos primeiros dois terços da gravidez, as doentes asmáticas mostraram mau controlo da sua doença (ACT≤19) na maioria dos casos (57,1 e 55,6%, no primeiro e segundo trimestre, respectivamente).

No período pós -parto metade das grávidas obteve valores de ACT® entre 20 e 24 e a outra metade valor de 19 ou inferior (Quadro_3).

Para cada avaliação, correlacionou -se FEV1, FeNO e ACT, obtendo-se apenas correlação significativa entre FeNO e ACT, no segundo trimestre (p=0,028).

Apesar de não haver alterações, ao longo do tempo, com significado estatístico dos três parâmetros avaliados, verificou -se subjectivamente que, no primeiro trimestre, 55,6% das grávidas agravaram e 44,4% mantiveram; no segundo trimestre 33,3% pioraram, 52,4% permaneceram estáveis e 14,3% melhoraram; no último trimestre a maioria (62,5%) não se alterou e 37,5% melhoraram. No período pós -parto 7,2% das doentes agravaram, enquanto 57,1% mantiveram e 35,7% apresentaram melhoria da asma.

Na avaliação global, uma grávida melhorou ao longo de toda a gravidez, enquanto onze (42,3%) pioraram neste período e catorze (53,9%) mantiveram-se estáveis. A evolução global da asma, tendo em conta a classificação prévia da gravidade da doença é apresentada no Quadro_4.

Tiveram necessidade de avaliação urgente, por exacerbação de asma, duas grávidas entre a 13.ª e a 24.ª semanas de gestação e quatro entre a 25.ª e a 36.ª semanas. A quatro destas doentes foi prescrita corticoterapia sistémica para tratamento do quadro, não tendo nenhuma necessitado de internamento. No primeiro trimestre da gravidez e após a 37.ª semana, nenhuma grávida recorreu a atendimento urgente. Não se registaram outras complicações maternas nem agravamento da asma, durante o parto, em nenhuma das doentes observadas.

Ocorreu apenas um parto pré-termo (às 36 semanas de gestação – em grávida que tinha tido agravamento da asma). Dezanove partos foram eutócicos e 8 distócicos (4 por cesariana e 4 com auxílio de ventosa).

O peso dos recém -nascidos variou entre 2225 e 3960 g (média: 3224,5 ± 510,6 g), registando -se dois com baixo peso ao nascimento (peso < 2500 g), um filho de uma grávida sem alteração do curso da doença e outro de uma mãe com agravamento da asma. Nenhum dos 26 recém-nascidos apresentou malformações ao nascimento.

DISCUSSÃO A asma é a patologia crónica que afecta com maior frequência a gravidez1-5.

Embora a maioria dos estudos refiram que o agravamento, melhoria ou manutenção da asma ocorrem em proporções semelhantes, esta evolução não é previsível e as exacerbações acontecem com alguma frequência1-4,6. Isto pode dever-se não a alterações na gravidade da própria asma ao longo deste período, mas também a mudanças no controlo da doença, ou ambos.

Este mau controlo pode, por sua vez, ser resultado do referido aumento da gravidade da asma, de um seguimento inadequado, de uma resposta à terapêutica ou adesão a esta8.

Vários estudos demonstraram que uma grávida com asma e mau controlo da doença tem um risco aumentado de eventos perinatais adversos4. Blais e Forget mostraram um aumento de 50% no risco de malformações congénitas nas mulheres que tiveram uma exacerbação de asma durante o primeiro trimestre da gravidez9.

Num estudo de Bakhireva et al.os sintomas mal controlados na fase inicial da gravidez e a história de internamento por asma em qualquer período da gestação foram, cada um deles, associados ao dobro de risco de parto pré-termo, independentemente de outros factores de risco8. Alguns estudos concluíram que a asma grave tem maior tendência a agravar durante a gravidez e maior risco de complicações perinatais, sugerindo que é necessário estar muito atento para reconhecer e tratar precocemente qualquer exacerbação que ocorra4,10,11. As complicações maternas e fetais da asma não controlada reportadas são inúmeras, o que requer um controlo rigoroso da doença1.

No presente estudo, embora a maioria das grávidas tenha apresentado, ao longo de todo este período, uma função pulmonar normal, observa-se, através dos resultados da espirometria, que o número de grávidas com FEV1 normal foi aumentando ao longo do tempo. Uma pior função pulmonar inicial, com posterior evolução favorável ao longo da gravidez, podem ser explicadas, em primeiro lugar, por uma interrupção da terapêutica habitual da asma, atitude que ocorre frequentemente na altura do diagnóstico de gravidez devido ao receio de efeitos adversos para o feto12; segundo, a melhoria ao longo da gravidez pode dever -se ao seguimento regular da doente, com consulta mensal, ajuste da medicação e reforço da necessidade de cumprir o tratamento, que em conjunto contribuem para uma evolução favorável, com maior controlo da doença.

Em relação à adesão terapêutica, estudos referem que apenas metade das mulheres que têm sintomas durante a gravidez toma alguma medicação de controlo e apenas metade das mulheres que tomavam medicação de controlo antes da gestação, a mantém enquanto grávidas13.

As medidas de função pulmonar, para além de serem úteis na avaliação da obstrução brônquica, servem como medida indirecta para assegurar uma oxigenação materna e fetal normais. Podem fornecer alertas precoces de perda de controlo, de maneira a prevenir um episódio agudo, diminuindo assim o risco de hipóxia1,2. Schatz concluiu que o controlo da asma, avaliado através da função pulmonar, parece afectar o crescimento intra-uterino: um FEV1 materno baixo predispõe a um atraso do crescimento intra-uterino14.

Assim os objectivos do tratamento da asma durante a gravidez incluem a optimização da função pulmonar juntamente com o controlo adequado dos sintomas1,14.

A variação dos valores da função pulmonar ao longo do tempo confirma a necessidade de reavaliação frequente durante a gravidez. A utilização de outros instrumentos pode completar esta avaliação.

A medição da fracção exalada de óxido nítrico é um método fácil e não invasivo, que constitui um marcador da inflamação brônquica eosinofílica, sendo útil na monitorização do controlo da asma. Este parâmetro pode ainda ajudar na avaliação da adesão ou não da terapêutica anti-inflamatória15,16.

Neste estudo, a diminuição dos valores de FeNO ao longo da gestação é também a favor de uma maior adesão ao tratamento e melhoria do controlo. A avaliação da adesão à terapêutica tem particular relevância durante este período.

O questionário ACT® é um instrumento simples e de fácil preenchimento, que avalia o controlo da asma nas últimas 4 semanas, tendo em conta a frequência de sintomas diurnos e interferência no sono, uso de medicação de alívio e limitação da actividade. Quanto maior o valor do ACT, melhor o controlo da asma17,18.

Menos grávidas com valores de 25 no segundo trimestre e a melhoria na fase final da gravidez, poderão dever-se à redução ou suspensão da medicação habitual, à maior probabilidade de exacerbações no segundo trimestre e a uma melhoria posterior (com poucas ou nenhumas crises no final da gravidez e no momento do parto).

Na primeira metade da gravidez que ter em conta um factor confundidor, a dispneia sentida pela grávida, devida ao progressivo aumento do volume uterino com consequente compressão diafragmática, que tende a diminuir ao longo da gravidez, por adaptação da mulher a esta situação.

Através da avaliação subjectiva, no primeiro trimestre a maioria das grávidas apresentou um agravamento da asma.

No segundo trimestre, a maioria permaneceu estável (55,6%) e mais de 14% tiveram até melhoria da asma, podendo para isto contribuir o seguimento regular em consulta e o maior cumprimento da terapêutica prescrita.

No último trimestre, como esperado, a maioria (52,4%) não se alterou e um número elevado (37,5%) apresentou melhoria. Esta fase da gravidez parece ser a mais estável em termos de exacerbações e evolução da asma.

No período pós-parto, justificado porventura pela maior preocupação dirigida ao recém -nascido e descuido da própria doente, volta a haver uma diminuição aparente no controlo da doença, confirmado por valores inferiores de ACT e agravamento na avaliação subjectiva efectuada pelo médico.

Na avaliação global de todo o período da gravidez, amaioria das doentes permaneceu estável (53,8%), onze (42,3%) pioraram, havendo apenas uma grávida a melhorar, em relação ao seu estado basal. Diferentes evoluções são esperadas ao longo da gestação, independentemente da gravidade prévia da asma, como observado neste grupo de asmáticas.

Estudos anteriores mostraram que aproximadamente 10% das grávidas procura atendimento urgente a qualquer momento da gravidez, principalmente as que não estão a tomar corticosteróides3. Essas exacerbações parecem ser mais frequentes entre a 24.ª e a 36.ª semanas de gestação, com um pico por volta do sexto mês de gravidez3,4.

Durante o primeiro mês e após a 37.ª semana ocorre pouca sintomatologia, com exacerbações raras e habitualmente ligeiras e com crises consideradas excepcionais durante o parto4.

Neste estudo, seis doentes tiveram necessidade de atendimento urgente (4 entre a 25.ª e a 36.ª semanas de gestação), por exacerbação da asma, quatro delas com necessidade de corticoterapia sistémica. Como esperado, nem no primeiro trimestre de gravidez, nem após a 37.ª semana, se registaram exacerbações de asma que motivassem recurso a atendimento urgente. Não se registaram complicações durante o parto relacionadas com a asma.

Apesar de várias grávidas apresentarem um agravamento da asma durante este período, apenas um destes recém-nascidos teve baixo peso.

O presente estudo vem confirmar que a asma pode complicar, de forma imprevisível, a gravidez. Mesmo grávidas que foram seguidas regularmente em consulta, com avaliação mensal da função pulmonar, inflamação brônquica e auto- avaliação do controlo, apresentaram evoluções diversas durante este período, algumas com melhoria, mas outras com agravamento, exacerbações, necessidade de aumento da medicação e uma com parto pré-termo.

Estes resultados reforçam a necessidade de uma consulta especializada e regular na grávida asmática, de forma a manter um maior controlo dos sintomas, uma melhor função pulmonar e um nível normal de actividade, prevenindo exacerbações e outras complicações materno-fetais.

Como limitações a este estudo, podem apontar-se o reduzido número de doentes avaliadas e a consequente falta de significado estatístico, assim como a subjectividade de parte da análise.

Apesar de não haver uma evolução global como a habitualmente descrita na gravidez (1/3 melhora, 1/3 agrava e 1/3 mantém-se), a evolução ao longo dos trimestres e os períodos de ocorrência das exacerbações estão de acordo com o descrito na literatura.

A inclusão dos três parâmetros avaliados (FEV1, FeNO e ACT) constitui uma “mais valia” do estudo e permitiu avaliar, de forma complementar, o controlo da asma ao longo da gravidez, o que foi reforçado pela associação encontrada entre dois destes parâmetros (FeNO e ACT).

CONCLUSÕES Este trabalho, em que conjuntamente se utilizaram três ferramentas (FEV1, ACT e FeNO) na avaliação das grávidas asmáticas, reforça a importância de um seguimento regular e especializado durante a gravidez, com monitorização do controlo, ajuste adequado e atempado do tratamento, prevenção e tratamento das exacerbações da doença, numa fase em que a evolução é variável e imprevisível e as consequências afectam o feto em desenvolvimento.

Desmistificar os receios da medicação neste período, encorajar a manutenção da terapêutica e tratar correctamente a doença, são pontos fundamentais para manter uma boa saúde materna e fetal.


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