COLONOSCOPIA VIRTUAL:
A PROPÓSITO DE UM CASO DE TUMORES SÍNCRONOS DO CÓLON
INTRODUÇÃO
A Colonoscopia Virtual é uma técnica imagiológica com
potencialidades para a detecção de diversa patologia do
cólon. Esta técnica foi descrita inicialmente por Vining
et al. (1) em 1994, em que mediante uma Tomografia
Computorizada se obtêm cortes finos do cólon, distendido
por ar. Posteriormente realizam-se reconstruções bi e tridimensionais, que permitem estudar a superfície da mucosa
cólica em toda a sua extensão (2). Devido aos constantes
progressos tecnológicos conseguidos na Tomografia Computorizada e no processamento/reconstrução de imagens, a
Colonoscopia Virtual tornou-se uma promissora técnica
para o estudo de patologia colorectal.
Os autores apresentam o caso de uma doente de 73 anos,
com duas neoplasias síncronas do cólon. Uma neoplasia ao
nível da sigmóide era estenosante, não permitiu o diagnóstico endoscópico da segunda neoplasia, ao nível do ângulo hepático, que foi detectada por Colonoscopia Virtual.
CASO CLÍNICO
Doente do sexo feminino, 73 anos, recorreu ao Serviço
de Urgência por quadro clínico caracterizado por astenia,
anorexia e emagrecimento de 9 Kg, nos últimos 3 meses.
No exame objectivo salientava-se palidez mucocutânea e
no estudo analítico, realizado à entrada no Serviço de Urgência, tinha hemoglobina de 8,3gr/dl com volume globular médio de 68,3 fL. No internamento foi submetida a
Endoscopia Digestiva Alta que foi normal e colonoscopia onde se observou aos 28 cm da margem anal, lesão estenosante, de consistência sólida e friável (Figura 1). A refe-
rida lesão não era franqueável pelo colonoscópio, tendo-se
tentado franquear com colonoscópio pediátrico, o que também não foi possível. Para estudo da restante mucosa
cólica realizou-se Colonoscopia Virtual, observando-se
marcado espessamento parietal na sigmóide com acentuada irregularidade da mucosa e com diminuição do lúmen do cólon em aparente relação com neoplasia extensa
(Figuras 2 e 3). No ângulo hepático observa-se, em ambas
as aquisições (decúbito ventral e decúbito dorsal) formação
com densidade de tecidos moles, irregular e heterogenea
em provável relação com lesão neoplásica a este nível.
A histologia das biopsias da lesão da sigmóide estabeleceram o diagnóstico de adenocarcinoma mucinoso com
células em anel de sinete.
A doente foi submetida a uma colectomia total. A análise
anatomo-patológica da peça de colectomia total permitiu
o diagnóstico final de dois adenocarcinomas síncronos do
cólon, um com 4 cm de extensão, localizado a 15 cm da
válvula ileo-cecal, pouco diferenciado, infiltrando em
profundidade a túnica muscular própria; o segundo localizado a 21 cm da linha de resecção distal, com 6 cm de
extansão, apresentando características mucinosas (adenocarcinoma mucinosa com células em anel de sinete) infiltrando todas as túnicas parietais. Ausência de metastização
ganglionar nos gânglios isolados. TNM: pT2N0 + pT3N0.
A doente foi orientada para Oncologia, onde realizou
quimioterapia com boa tolerância, mantendo-se assintomática 3 meses após a cirurgia.
DISCUSSÃO
A incidência relatada de tumores colerectais síncronos
varia entre 1,5% e 2,3% (3). A identificação de uma 2ª neoplasia colorectal síncrona é importante porque a sua localização poderá influenciar a extensão da ressecção primária. A colonoscopia óptica representa hoje o método
de escolha na identificação pré-operatória de lesões síncronas. Contudo, se a neoplasia mais distal for estenosante, que impeça a progressão do colonoscópio, como
sucedeu no nosso caso, a colonoscopia virtual pode ter um
papel importante no diagnóstico de lesões síncronas (4).
A falta de identificação de lesões síncronas pode determinar um tratamento cirúrgico inadequado, resultando na
necessidade de uma segunda intervenção em que ocasionalmente o tumor já esteja mais disseminado.
Relativamente à colonoscopia virtual, particularmente
interessante é o trabalho de Fenlon (5), que relatou o uso
desta técnica na avaliação do cólon proximal em 29
doentes com neoplasias oclusivas, no período pré-operatório. A colonoscopia virtual identificou todos os 29 tumores, demonstrando duas outras massas tumorais não
observadas endoscopicamente e confirmadas intra-operatoriamente.
A indicação mais discutida na actualidade, relativamente
à colonoscopia virtual, é o rastreio do cancro colorectal.
A sua potencial utilidade baseia-se no bom rendimento
desta técnica na detecção de pólipos do cólon, os quais
podem ser percursores de cancro. O cancro colorectal é
uma das maiores causas de morte nos países ocidentais;
o amplo conhecimento da sua história natural (progressão
adenoma-carcinoma) (6), converte esta neoplasia, numa
das mais susceptíveis de rastreio. A implementação das
técnicas endoscópicas é inferior ao desejável, em grande
parte devido à baixa aceitação por parte da população.
Perante este facto é compreensível o interesse que gerou
a colonoscopia virtual nos últimos anos, contudo, na
actualidade não existem estudos que demonstrem a eficácia desta técnica no rastreio do cancro colorectal.
Apesar da utilidade da colonoscopia virtual, como foi evidente no caso clínico apresentado, não podemos esquecer
que esta técnica é um procedimento única e exclusivamente diagnóstico, ao contrário da colonoscopia óptica,
que além de detectar as lesões possibilita a sua remoção.
CONCLUSÃO
Apesar de não possuir papel terapêutico, a colonoscopia
virtual, poderá no futuro ter um papel no rastreio do can-
cro colorectal e na actualidade pode ser utilizada no rastreio de patologia tumoral do cólon direito, quando existir
estenose infranqueável endoscopicamente no cólon distal.