Intervenção no XI congresso internacional de psicotécnica
TEXTOS HISTÓRICOS
Intervenção no XI congresso internacional de psicotécnica.
Intervención en el XI congreso internacional de psicotécnica”.
Intervention au xième congrès international de psychotechnique.
Speech at the eleventh international congress of psychotechnics.
Georges Friedmann
Texto original: Friedmann, G. (1954). Intervention au XIème Congrès
International de Psychotechnique (Psychologie appliquée), Section de
psychologie du travail, Paris, 1953. Le Travail Humain, 17, 1-2, 39-40.
O Dr. Frisby sublinhou justamente, na conferência do Prof. Hearnshaw, que a
obrigação, a imposição e a disciplina constituem a essência do trabalho,
podendo este último ser definido, em última análise, como uma atividade em que
intervém um elemento de imposição. Existe, evidentemente, uma grande variedade
de imposições e não resulta automaticamente que uma atividade exercida nessas
condições não possa comportar diversas formas de satisfação. Espero que a
discussão permita retomar este assunto e, pela parte que me toca, salientarei
na exposição do Sr. Hearnshaw, juntamente com alguns comentários, os seguintes
pontos:
1.º É consensual que a conceção de uma psicologia industrial, que seria uma
simples utilização de técnicas «aplicadas» à vida económica e, em especial, à
vida industrial, é exígua e limitadora. Há que salientar que as ciências do
homem, que constituem as mais recentes, suscitaram analogias erradas com as
ciências psicomatemáticas. Existiria uma psicologia aplicada à vida industrial,
derivada da psicologia teórica, como existe, em relação à teoria física, uma
termodinâmica e uma mecânica aplicadas, ou uma eletricidade industrial:
conceção que, de resto, implica uma dicotomia arbitrária entre a teoria e a
prática. Saliente-se, a este respeito, as confusões geradas pelo próprio termo
«psicotécnica», que foi objeto de discussão no Congresso de Göteborg.
Para o Sr. Hearnshaw, que rejeita esta conceção, a psicologia industrial é uma
ciência onde distingue 3 aspetos:
(a) Um conjunto de fins e de princípios;
(b) Um conjunto de conceitos teóricos;
(c) Um corpo de técnicas.
Mas esta própria divisão, e talvez Sr. Hearnshaw pudesse salientá-lo, é
didática e um pouco artificial no sentido de que a aplicação das técnicas, o
respetivo desenvolvimento, a sua comprovação através da experiência repercutem-
se constantemente nos conceitos teóricos, modelam-nos e modificam-nos numa
incessante ação recíproca. Facto que J. M. LAHY muito bem expressou num artigo
notável sobre higiene mental (Hygiène mentale) (dezembro de 1932), quando
escreveu: «A psicologia aplicada ou psicotécnica não é senão a psicologia
científica geral. Não só esta não difere da psicologia teórica, mas, fruto
desta, ultrapassa-a, transforma-a e vai substituí-la como o produto da sua
evolução necessária, como uma síntese da teoria com uma nova prática.»
2.º A psicologia industrial não pode ser uma coleção de aplicações e tal, no
nosso entender, sobretudo porque o trabalho é uma realidade original, global,
una, que não pode ser avaliada, absorvida, compreendida por pretensas
«aplicações», dispersas de uma ciência «pura». Há que insistir aqui no caráter
uno e complexo dos conteúdos do trabalho.
Independentemente da tarefa, observada concretamente nas oficinas, escritórios,
estaleiros, na agricultura moderna, esta apresenta-se sob 5 aspetos ou
características principais: técnica, fisiológica, psicológica, social e
económica. Cada um destes aspetos expressa a mesma realidade vista sob
diferentes ângulos e em toda a sua riqueza de conteúdo. As reações mentais de
um operário, Paul, numa determinada oficina, no conjunto das suas tarefas
quotidianas e, inversamente, o seu esforço para modelá-las de acordo com as
suas características pessoais revelam, a propósito do que se convencionou
denominar «aptidões», «dedicação laboral», «satisfação» ou «insatisfação» que
não existe, indubitavelmente, um único problema relativo ao trabalho humano que
seja meramente psicológico.
Explicam-se, desta forma, a relatividade e também determinadas deceções e erros
do método dos testes que foi frequentemente aplicado na indústria ao longo dos
últimos vinte anos. Explicam-se também, assim, a relatividade e as desilusões
de vários estudos que visavam compreender os fenómenos do «tédio», da
«monotonia», e mesmo a «fadiga», fenómenos que suscitam também, evidentemente,
condições técnicas, económicas e sociais. As investigações em matéria de
sociologia industrial confrontam-nos permanentemente com a inter-relação dos
diversos aspetos do trabalho e revelam a necessidade de uma colaboração
estreita de equipas de investigadores pertencentes às várias ciências dedicadas
ao trabalho humano.
Por conseguinte, garantem-nos que qualquer «política da produtividade» que
ignorava ou negligenciava esta inter-relação seja, mais tarde ou mais cedo,
condenada ao fracasso. Permitam-me acrescentar, concordando com a Sra. PACAUD,
que ela não merecia a colaboração de psicólogos industriais preocupados em não
comprometer a respetiva atividade ao serviço de interesses particulares e de
mantê-la num campo científico.
COMO REFERENCIAR ESTE ARTIGO?
Friedmann, G. (1954). Intervention au XIème Congrès International de
Psychotechnique. Laboreal, 11 (2), 84–85.