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EuPTCVHe1646-69182014000200005

EuPTCVHe1646-69182014000200005

variedadeEu
ano2014
fonteScielo

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A PTHi pode prever as variações do Cálcio após Tiroidectomia Total?

INTRODUÇÃO A hipocalcemia pós-operatória é a complicação mais frequente nos pacientes submetidos a tiroidectomia total. A sua incidência na literatura é altamente variável, com valores descritos entre os 10 e os 60%.[1,2,3,4,6,7,8,10, 11,12,13] Habitualmente resulta da lesão intra-operatória das glândulas paratiróides, seja por desvascularização, manipulação excessiva ou remoção inadvertida.[2,3,7, 12,13] A grande maioria das hipocalcemias são transitórias e ligeiras, mas num pequeno número de casos podem ser permanentes ou graves.

[1,3,4,7,11,12] Actualmente, a preocupação crescente com a gestão de custos hospitalares favorece a realização de intervenções cirúrgicas em regime de ambulatório e a tiroidectomia total não é excepção. No entanto, a hipocalcemia pós-operatória é um dos principais obstáculos à alta do doente até às 24h após a cirurgia.

[1,2,5,9,10,12] A hipocalcemia e os sintomas associados a hipocalcemia geralmente manifestam-se nas primeiras 24 a 48h após cirurgia, mas podem ser mais tardios e surgirem até ao dia pós-operatório.[1,2,3,5,6,7,12] Não é fácil identificar os doentes mais susceptíveis de desenvolverem esta complicação. É essencial encontrar factores preditivos, com elevada acuidade, que identifiquem os doentes com maior risco de desenvolverem uma hipocalcemia clinicamente relevante. Na ausência destes factores preditivos, os doentes devem ser submetidos a uma monitorização rigorosa, com múltiplas determinações do cálcio sérico, o que pode prolongar o seu internamento hospitalar.

[1,2,3,5,7,9,10,12] Nos últimos anos, vários parâmetros bioquímicos foram avaliados como preditores do desenvolvimento de hipocalcemia pós-operatória.

Nomeadamente, o cálcio total, o cálcio ionizado, a vitamina D activada, a PTHi, as variações temporais destes parâmetros ou a combinação de alguns deles. A PTHi por ser o principal mediador da homeostasia do cálcio e por apresentar uma semi-vida curta com possibilidade de uma previsão precoce, tem sido extensamente avaliada na literatura com resultados muito promissores.

[1,2,3,4,5,6,7,8,10,11,12] A Unidade Funcional de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital de Braga utilizava um protocolo de reposição de cálcio e calcitriol após tiroidectomia total, baseado em determinações seriadas do cálcio total. Este protocolo permitia que todos os doentes submetidos a tiroidectomia total tivessem alta no primeiro dia pós-operatório. Apenas exceptionalmente alguns doentes foram reinternados para reposição com gluconato de cálcio por via endovenosa. No entanto, todas as tiroidectomias totais eram realizadas em regime de internamento. Com o objectivo de tentar melhorar os resultados obtidos anteriormente e de permitir a identificação dos doentes que podiam ser submetidos a tiroidectomia total em regime de ambulatório, de forma segura, o protocolo utilizado foi adaptado para incluir determinações da PTHi e do cálcio ionizado.

MATERIAIS E MÉTODOS Foi realizado um estudo prospectivo através da análise de 100 tiroidectomias totais sucessivas realizadas no período entre Novembro de 2008 e Novembro de 2009.

Técnica cirúrgica Todas as cirurgias foram realizadas pelos dois elementos da Unidade Funcional de Cirurgia de Cabeça e Pescoço ou por internos de formação específica sob supervisão. Foi utilizada uma técnica cirúrgica padronizada que incluía a dissecção extracapsular da glândula tiróide bilateralmente e a identificação de pelo menos uma das glândulas paratiróides em cada um dos lados. Em caso de remoção inadvertida de uma das glândulas paratiróides era realizada a sua reimplantação no músculo esternocleidomastoideu. Para além das tiroidectomias totais simples, foram incluídas as tiroidectomias totais associadas a esvaziamentos ganglionares.

Protocolo Foi adaptado o protocolo da Unidade Funcional de Cirurgia de Cabeça e Pescoço para a reposição de cálcio e calcitriol após tiroidectomia total. Para além das determinações do cálcio total realizadas, foram acrescentadas as determinações da PTHi e do cálcio ionizado no pré-operatório, às 12 e 24h após a cirurgia.

Em todos os casos foi realizada a reposição profilática com gluconato de cálcio endovenoso às 6, 12, 18 e 24h após cirurgia, como realizado anteriormente.

Depois das primeiras 24h todos os doentes sem necessidade de terapêutica com gluconato de cálcio endovenoso tiveram alta. A necessidade de reposição, a posologia da terapêutica com cálcio e calcitriol per os para o ambulatório e a periodicidade das determinações subsequentes do cálcio total, foram definidas com base nas variações dos valores de cálcio total.

Métodos analíticos O cálcio total plasmático foi determinado por espectrofotometria e os seus valores de referência no nosso hospital variam de acordo com a idade do doente.

O valor plasmático do cálcio ionizado foi determinado por eléctrodo selectivo de iões e os seus valores de referência variam entre 1,11-1,30mmol/L.

O valor plasmático da PTHi foi determinado por electroquimioluminescência e os valores de referência variam entre 15-65pg/ml. A taxa de declínio da PTHi foi calculada de acordo com a seguinte fórmula: [(PTHi pré-operatória - PTHi pós-operatória) / PTHi pré-operatória] x 100.

As hipocalcemias foram classificadas quanto ao seu aparecimento, duração e gravidade. As hipocalcemias precoces foram aquelas que surgiram nas primeiras 24h após a cirurgia e as tardias, as que surgiram após este período. Foram definidas como hipocalcemias transitórias aquelas que resolveram sem necessidade adicional de reposição com cálcio per os no máximo até aos 6 meses após cirurgia e como permanentes, as que persistiram ou mantiveram a necessidade de reposição após os 6 meses. Em relação à gravidade, as hipocalcemias severas foram aquelas que atingiram em alguma altura um valor inferior a 7 mg/dl ou a 0,96mmol/L conforme se considere o cálcio total ou o cálcio ionizado, respectivamente.

Métodos estatíticos Os dados recolhidos de forma prospectiva foram analisados através do SPSS® versão 17.0. Um valor de p < 0,05 foi considerado como estatisticamente significativo. Foi realizada uma comparação entre o cálcio total e o cálcio ionizado como parâmetros para o diagnóstico de hipocalcemia através do teste t de Student. Foram determinados factores de risco de hipocalcemia através de uma regressão logística binominal. Por último, foi determinada a acuidade de uma PTHi < 15pg/ml e da sua taxa de declínio para preverem uma hipocalcemia no pós- operatório, com recurso a curvas ROC.

RESULTADOS Dos 100 doentes incluídos no estudo, a maioria eram do sexo feminino (sexo feminino - 87, sexo masculino - 13) e a idade variou entre os 22 e os 88 anos, com um predomínio de doentes na sexta década de vida. A causa mais frequente para a realização de tiroidectomia total foi o Bócio Multinodular (BMN), sendo responsável por 50 cirurgias. Um total de 25 cirurgias foram realizadas devido a patologia maligna (Carcinoma Papilar - 21, Carcinoma Medular - 4) e as restantes devido a tumor folicular em BMN (n = 22) e Doença de Graves (n = 3). Na maioria dos casos foi realizada uma tiroidectomia total simples (n = 78) e nos restantes casos, devido ao diagnóstico pré- operatório de malignidade, esta foi associada a esvaziamentos ganglionares (esvaziamento central - 20, esvaziamento central e lateral - 2).

A hipocalcemia pós-operatória foi definida como um valor de cálcio abaixo dos valores de referência do cálcio total ou do cálcio ionizado, em qualquer altura do pós-operatório. Se considerarmos os valores do cálcio total, a hipocalcemia pós-operatória ocorreu em 50% dos casos. Se considerarmos os valores do cálcio ionizado, foi diagnosticada uma hipocalcemia em 60% dos casos.

Independentemente do parâmetro utilizado, a grande maioria das hipocalcemias foram precoces, não severas e todas elas transitórias. Todos os doentes tiveram alta no primeiro dia pós-operatório e apenas 5 foram reinternados para terapêutica com gluconato de cálcio endovenoso.

Para avaliarmos se existia alguma diferença entre a utilização do cálcio total ou do cálcio ionizado para a definição de hipocalcemia pós-operatória, comparamos os resultados destes dois parâmetros através do teste t de Student.

Verificamos que na nossa série não existia diferença estatisticamente significativa entre eles (p > 0,05).

Para identificarmos factores de risco para hipocalcemia pós-operatória na nossa série, realizamos uma regressão logística binominal incluindo factores de risco amplamente descritos na literatura como predisponentes para hipocalcemia. Foram considerados um valor de PTHi > ou < a 15pg/ml às 12 e 24h após cirurgia, o número de paratiróides identificadas intra-operatoriamente, o diagnóstico que motivou a cirurgia ter um carácter benigno ou maligno e a realização de uma tiroidectomia total simples ou associada a qualquer tipo de esvaziamento ganglionar. Da análise realizada, verificou-se que de todos os factores considerados, apenas um valor de PTHi < 15pg/ml às 12h após cirurgia acarretou uma aumento do risco de desenvolvimento de hipocalcemia estatisticamente significativo.

Para além de avaliar se um valor de PTHi inferior aos seus valores de referência aumenta o risco de desenvolvimento de hipocalcemia pós-operatória, é essencial avaliar com que acuidade é que a PTHi prevê essa alteração. Quanto maior for a acuidade menor será a taxa de falsos negativos.

No nosso estudo, a acuidade da PTHi para prever o desenvolvimento de hipocalcemia pós-operatória foi determinada com recurso a curvas ROC. Foram analisados os seus valores às 12 e 24 h após cirurgia e também a sua taxa de declínio, através da fórmula [(PTHi pré-operatória - PTHi pós-operatória) / PTHi pré-operatória]

Foi constatado que uma PTHi < 15pg/ml às 12h e 24h após cirurgia apresentava uma acuidade baixa a intermédia para prever a ocorrência de hipocalcemia. No entanto, nas determinações às 24h esta acuidade aumenta na previsão de hipocalcemias severas. Estas hipocalcemias são precisamente aquelas que implicam um prolongamento do internamento do doente.

A taxa de declínio da PTHi no pós-operatório apresentava uma acuidade baixa na previsão do aparecimento de hipocalcemia.

DISCUSSÃO Nos últimos anos, os avanços na técnica cirúrgica de tiroidectomia total levaram a uma diminuição acentuada das complicações pós-operatórias graves. No entanto, a hipocalcemia pós-operatória continua a ser um factor limitante do encurtamento do tempo de internamento e da realização de tiroidectomias totais em regime de ambulatório.[1,2,4,5,9,10,12] Na literatura, foram descritos vários factores associados a um maior risco de desenvolvimento de hipocalcemia. Nomeadamente, a idade do doente, o sexo do doente, o número de glândulas paratiróides identificadas, a presença de hipertiroidismo, o diagnóstico de malignidade e a realização de uma tiroidectomia total associada a esvaziamento ganglionar.[4,8,9,10,11,12,13] No nosso estudo avaliamos como factores de risco para hipocalcemia o número de paratiróides identificadas intra-operatoriamente, o diagnóstico que motivou a cirurgia ter um carácter benigno ou maligno e a realização de uma tiroidectomia total simples ou associada a qualquer tipo de esvaziamento ganglionar. Nenhum deles demonstrou um aumento de risco para hipocalcemia. Estes resultados podem ser explicados pelo facto de todas as cirurgias terem sido realizadas pelos dois elementos da Unidade Funcional de Cirurgia de Cabeça e Pescoço ou por internos de formação específica sob supervisão, utilizando uma técnica cirúrgica padronizada. Diversos estudos têm demonstrado existir uma relação entre a menor morbilidade após cirurgia da glândula tiróide e a maior experiência e formação especializada dos cirurgiões.[14] O doseamento pós-operatório do cálcio e as suas variações têm sido amplamente utilizados em muitas instituições para determinar a presença de hipocalcemia e prever a sua gravidade. Isto exige uma monitorização rigorosa, com múltiplas determinações do cálcio sérico, o que pode prolongar o tempo de internamento hospitalar. [1,2,3,6,7,9,10,12] Alguns estudos defendem que deve ser utilizado o cálcio ionizado e não o cálcio total para a definição de hipocalcemia, visto que este último pode ser influenciado em algum grau pela hemodiluição pós- operatória.[12] Segundo outros estudos, na maioria dos casos o cálcio total reflecte de maneira aceitável a quantidade de cálcio livre sérico e é usado habitualmente pelas instituições.[13] No nosso hospital, o nosso protocolo de reposição de cálcio após tiroidectomia total utilizava os valores de cálcio total. Verificamos que na nossa série não existia uma diferença estatisticamente significativa entre a utilização do cálcio total ou cálcio ionizado para a definição de hipocalcemia pós-operatória.

A utilização da PTHi para prever a hipocalcemia após tiroidectomia total tem sido um tema extensamente abordado na literatura recente. Com muitos autores a demonstrarem uma relação entre o níveis da PTHi após tiroidectomia e o desenvolvimento de hipocalcemia.[1,2,3,4,5,6,7,8,9,10,12] No entanto, a definição de um protocolo pós-operatório que inclua a PTHi, eficaz e seguro e que permita uma alta precoce até às 24h pós-operatórias, não é fácil. Não existem guidelines que definam a melhor altura para determinar a PTHi no pós- operatório. Para além disso, nos estudos publicados existe uma grande heterogeneidade de valores de cut off utilizados.[2,3,6,7,9,10,11] Analisando os nossos resultados, verificamos que um valor de PTHi < 15pg/ml às 12h após cirurgia nos permite identificar os doentes com um maior risco de desenvolver uma hipocalcemia. No entanto, a PTHi < 15pg/ml às 12h e 24h após cirurgia apresenta uma acuidade baixa a intermédia para prever a ocorrência de hipocalcemia. Nas determinações às 24h esta acuidade aumenta na previsão de hipocalcemias severas. Estas hipocalcemias são precisamente aquelas que implicam um prolongamento do internamento do doente. Estes resultados sugerem que a determinação isolada de uma PTHi < 15pg/ml não tem acuidade suficiente para determinar os doentes em risco de desenvolverem hipocalcemia pós- operatória, embora apresente uma melhor acuidade na previsão de hipocalcemias severas, quando presente às 24h após cirurgia.

Uma das limitações deste estudo é o facto de todos os pacientes terem sido submetidos a reposição profilática com gluconato de cácio endovenoso às 6, 12, 18 e 24h após cirurgia. Para além disso, a suplementação com cálcio e calcitriol per os para o domicílio foi decidida tendo em conta apenas os valores do cálcio total, independentemente do valor da PTHi.

CONCLUSÃO É lícito utilizar os valores do cálcio total sérico nos protocolos de reposição de cálcio após tiroidectomia total.

A realização da tiroidectomia total por uma equipa dedicada e com formação especializada diminui a influência de alguns factores intra-operatórios no desenvolvimento de hipocalcemia pós-operatória.

A PTHi tem um papel promissor na previsão precoce do desenvolvimento de hipocalcemias após tiroidectomia total. No nosso estudo a PTHi não nos permitiu identificar de uma forma inequívoca os doentes que poderiam ter beneficiado, sem riscos acrescidos, da realização de uma tiroidectomia total em regime de ambulatório. Para além disso, a sua utilização isolada não iria melhorar os resultados obtidos com as determinações do cálcio total e a sua determinação implica custos que não são negligenciáveis.

São necessários outros estudos em que a PTHi seja utilizada para definir diferentes grupos de risco para hipocalcemia, isoladamente ou em conjunto com o cálcio total e em que o tratamento com o cálcio e o calcitriol seja realizado de acordo com esse risco. Para além disso, podem ser considerados outros timings após a cirurgia para a sua determinação e podem ser utilizados outros valores de cut off. Uma utilização eficaz da PTHi, com uma única determinação pós-operatória de elevada acuidade, pode evitar múltiplas determinações seriadas do cálcio e permitir a tiroidectomia total em regime de ambulatório, acabando por ser economicamente vantajosa.


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