Reuniões Científicas: LBSE: 20 anos depois' ou 20 anos depois da LBSE'?
Reuniões Científicas
LBSE: 20 anos depois' ou 20 anos depois da LBSE'?
A Lei de Bases do Sistema Educativode 1986 [LBSE] foi objecto de um debate
alargado, cuja organização esteve a cargo do Instituto de Educação e Psicologia
[IEP] e do Centro de Investigação em Educação da Universidade do Minho. A
iniciativa teve lugar no dia 13 de Outubro de 2006, exactamente a véspera da
comemoração dos 20 anos da sua publicação em Diário da República.
Este encontro científico, coordenado por Laurinda Leite, contou com a
participação de quatro oradores convidados, que desenvolveram aspectos
específicos desta Lei: Sérgio Machado dos Santos (da Universidade do Minho)
reflectiu sobre "LBSE e Ensino Superior"; Manuel Viegas Abreu (da
Universidade de Coimbra) discutiu a "LBSE e os Apoios Educativos/Serviços
de Psicologia e Orientação"; João Barroso (da Universidade de Lisboa)
referiu-se criticamente à "LBSE e à Organização e Gestão das
Escolas"; por fim, Rui Vieira de Castro (também da Universidade do Minho)
abordou a LBSE na perspectiva da "Formação de Professores e
Educadores".
Num segundo momento do debate, três comentadores Maria Luísa Alonso (do
Instituto de Estudos da Criança), Carlos Estêvão e Maria do Céu Taveira (do
IEP) procederam a sínteses das comunicações proferidas, avançando com
perspectivas pessoais e lançando questões para discussão. Após os comentários
dos oradores convidados, o debate foi alargado aos presentes na sessão.
As principais conclusões retiradas da discussão apontam no sentido das
múltiplas inovações e das grandes potencialidades que a LBSE encerra(va), desde
logo indiciadas por Sérgio Machado do Santos ao referir "o potencial
criativo e inovador da Lei", quando citou o conceituado trabalho de Eurico
Lemos Pires (antigo investigador do IEP) sobre a LBSE, onde se considerava que:
É entendimento do autor que esta Lei, sendo boa, embora não sendo óptima, é um
manancial de revelações e descobertas. Sem risco de exagero, poderemos
considerá-la como uma espécie de carta magna da educação para os próximos
lustros. Se ela resultará boa ou óptima ou mesmo vier a constituir um
desapontamento, terá muito mais a ver com os governantes, administradores e
educadores que bem usarem ou mal usarem a Lei e não à sua bondade interna
(Pires, 1987: 108).
Na sua intervenção, Sérgio Machado dos Santos recordou, entretanto, as
consequências e/ou expectativas da implementação da LBSE no EnsinoSuperior:
mudança do modelo de gestão do Ensino Superior; crescimento do número de
estudantes neste nível de ensino (sobretudo entre 1988 e 1992); reforço do
Ensino Politécnico; expectativas em relação à formação de recursos humanos e de
especialistas.
Manuel Viegas Abreu frisou que a LBSE, pese embora os seus 20 anos, é ainda uma
lei actual, por ter conseguido manter-se como orientação geradora de projectos
inovadores e de sucesso, em particular naquilo que diz respeito aos Serviços de
Psicologia e Orientação Escolar. Historiando a implementação desses serviços e
dando conta do seu estado actual, relembrou um dos seus objectivos fundamentais
"Promover o sucesso escolar" e procurou, na sequência, rebater a
crítica corrente de que "Os psicólogos não orientam os alunos para os
cursos de formação profissional".
Por seu lado, João Barroso, retomando o título do evento ("Lei de Bases do
Sistema Educativo: 20 anos depois"), sustentou que, para além do olhar
histórico que tal proposição encerra, seria necessário avançar com uma visão
crítica sobre o estado actual da Educação em Portugal, isto é, saber "por
onde vamos, 20 anos depois da LBSE". Lembrou alguns paradoxos subjacentes
ao período político de implementação da Lei, como a tentativa de criação de um
Estado-providência, numa fase de crise global do Estado, ou a necessidade de
introdução de mudanças fortes num período em que tínhamos um poder político
fragilizado e era necessário proceder à "refundação democrática do sistema
educativo". Recordou, ainda, citando Rui Grácio, as fases por que passou o
país aquando da discussão e da implementação da LBSE: 1974-1976, período da
normalização; 1987-1991, fase da reforma em (dis)curso ou do "mito da
reforma"; 1996-2000, tempo da "reforma do mito". Encerrando a
sua comunicação de forma crítica e falando da gestão e da autonomia das
escolas, João Barroso, reportando-se ao tópico central da sua intervenção,
terminou com a afirmação de que "A autonomia das escolas é como o Pai
Natal: todos sabemos que não existe, mas fingimos acreditar nele".
Finalmente, Rui Vieira de Castro, reportando-se à experiência concreta do
Instituto de Educação e Psicologia na Formação de Professores, abordou três
tópicos: 1) Políticas de formação de professores em Portugal; 2) Práticas de
formação de professores da Universidade do Minho; 3) Futuro da formação de
professores em Portugal. Neste último ponto, sublinhou as recentes mudanças nos
cursos de formação de professores e o "silenciamento", por parte do
Estado, em relação aos modelos a seguir, ao nível dos segundos ciclos de
formação académica. A concluir a sua intervenção, avançou com a necessidade de,
na Universidade do Minho, se pensar integradamente toda a formação de
educadores e professores dos diferentes níveis de ensino, potenciando e
rentabilizando os recursos humanos altamente qualificados de que a Universidade
dispõe, ideia que seria secundada por Luísa Alonso.
Já na fase da discussão, retomou-se a questão da semântica na interpretação/
implementação da LBSE e acrescentou-se a existência de um "problema de
sintaxe" ou de articulação dos diferentes momentos reformistas.
Entretanto, João Barroso respondeu que existirá até a necessidade de solucionar
um "problema de tradução" dos discursos para as práticas, das
políticas para as acções e do nível da administração central para os níveis das
administrações escolares.
Em suma, apesar da existência de dificuldades pontuais na implementação da
LBSE, pode concordar-se com o facto de esta Lei, no espírito e na letra, marcar
indubitavelmente uma fase da democratização da Educação em Portugal. É
plausível até pensar-se que uma ("nova") Lei de Bases da Educação(que
esteve em discussão pública em 2004, mas acabou por ser colocada de parte) não
teve poder para "vencer" a ("actual") Lei de Bases do
Sistema Educativo, que foi já objecto de duas alterações pontuais: a da Lei N.º
115/1997 de 19 de Setembro e a da Lei N.º 49/2005 de 30 de Agosto.