Efeito do substrato na emergência, crescimento e comportamento estomático em
plântulas de mangabeira
Efeito do substrato na emergência, crescimento e comportamento estomático em
plântulas de mangabeira1
Effect of the substrate on the emergence, growth and stomatal behavior in
mangaba seedlings
Rejane Jurema Mansur Custódio NogueiraI; Manoel Bandeira de AlbuquerqueII;
Josué Francisco Silva JuniorIII
IBióloga, D.Sc., Professora Adjunto, Universidade Federal Rural de Pernambuco '
UFRPE, Departamento de Biologia, Área de Botânica, bolsista CNPq, Rua Dom
Manoel de Medeiros, s/n, Dois Irmãos, CEP 52171-900, Recife-PE. E-mail:
rmansur@hotlink.com.br
IIEng. Agrônomo, Mestrando em Botânica, UFRPE, bolsista CNPq. E-mail:
mbalbuquerque@yahoo.com.br
IIIEng. Agrônomo, M.Sc., Embrapa Tabuleiros Costeiros, Cx. P. 44, CEP 49001-
970, Aracaju-SE. E-mail: josué@cpatc.embrapa.br
INTRODUÇÃO
O Nordeste brasileiro vem destacando-se pelo elevado número de empresas de
processamento de polpa de frutas, as quais têm mostrado extrema dificuldade na
obtenção de matérias-primas que garantam o seu pleno funcionamento. Dentre as
inúmeras espécies vegetais utilizadas para extração de polpa na região,
destaca-se a mangabeira (Hancornia speciosaGomes), planta de porte arbustivo
que se encontra dispersa nas áreas de cerrado do Centro-Oeste e nas áreas de
tabuleiros costeiros do Nordeste (Giacometti, 1993). Sua polpa presta-se para a
fabricação de sorvetes, sucos, compotas e doces, além do látex que produz
borracha e da madeira utilizada na carpintaria (Braga, 1960).
Por outro lado, a exploração de uma espécie nativa depende dos conhecimentos
técnicos a respeito da propagação e do comportamento da mesma com relação às
variações ambientais, os quais são escassos, principalmente aqueles ligados aos
parâmetros fisiológicos frente às situações adversas. Dados referentes ao tipo
de substrato são fundamentais no processo germinativo e estabelecimento da
muda. Popinigis (1977) relata que o substrato apresenta grande influência na
germinação, uma vez que fatores como estrutura, aeração, capacidade de retenção
de água e grau de contaminação por patógenos podem variar segundo o material
utilizado. Todas essas características são também decisivas no desenvolvimento
e sobrevivência dessa espécie.
Alguns trabalhos foram realizados visando à definição do melhor substrato para
cultivo de mangabeira. Vieira Neto (1998) indica o substrato areia e terra
vegetal na proporção 1:1, 2:1 e 3:1, ou simplesmente terra vegetal como os mais
adequados. No entanto, ainda são necessários estudos acerca da sua influência
no comportamento fisiológico das plantas.
O presente estudo teve como objetivo avaliar o efeito do substrato sobre o
processo germinativo, crescimento inicial e comportamento estomático em
mangabeira cultivada em casa de vegetação.
MATERIAL E MÉTODOS
O experimento foi conduzido na casa de vegetação do Laboratório de Fisiologia
Vegetal do Departamento de Biologia da Universidade Federal Rural de Pernambuco
- UFRPE. As sementes foram provenientes de frutos coletados em estádio "de
vez" no Sítio Santo Amaro, no município de Sirinhaém-PE (8º35'30"S e
35º07'00"W). Os frutos foram despolpados manualmente sob água corrente e
as sementes imersas em hipoclorito de sódio a 2%, por 5 minutos, e postas para
secar à sombra, por um período de 20 horas. Logo em seguida, as mesmas foram
semeadas a 1 cm de profundidade, em recipientes com capacidade de 150 mL,
contendo três tipos de substratos: areia autoclavada; uma mistura de húmus,
areia de lavada e terriço vegetal na proporção de 2:4:4 (v/v/v), e solo natural
coletado no mesmo local de origem das sementes. O referido solo é do tipo
neossolo quartzarênico distrófico, bem drenado e de textura arenosa. As
análises físicas e químicas do solo da região de origem das sementes e do
terriço que compunha a mistura estão apresentadas nas Tabelas_1 e 2.
Os recipientes foram mantidos sob irrigação diária até a capacidade de pote,
segundo metodologia de Nogueira (1997), sendo adotado o delineamento
experimental inteiramente casualizado, com 50 repetições para cada tratamento.
O período de avaliação da germinação foi de 30 dias após a semeadura, onde foi
considerada germinada a plântula que emergisse o epicótilo. Também foi
determinado o Índice de Velocidade de Emergência (IVG) nos diferentes
substratos, segundo metodologia proposta por Popinigis (Santos & Carlesso,
1998). Aos dois meses após a semeadura, foram selecionadas cinco repetições
(plantas) de cada tratamento e avaliados os parâmetros de crescimento: altura
da plântula, utilizando-se de uma régua graduada, a partir do colo até a gema
apical e o número de folhas. Foram medidas no período entre 12 e 13 horas
(quando foi verificada maior abertura estomática), a transpiração (E), a
resistência difusiva (Rs) e a temperatura foliar (Tf), na epiderme abaxial do
terceiro par de folhas completamente expandidas, utilizando-se de um porômetro
de equilíbrio dinâmico LICOR, modelo LI-1600. Paralelamente, a radiação
fotossinteticamente ativa (PAR), a umidade relativa do ar (UR) e a temperatura
do ar (Tar) foram monitoradas através de sensores quânticos e de umidade, e
termopares acoplados ao referido porômetro.
Foi realizada análise de variância e comparação de médias pelo teste de Tukey.
Além disso, foram obtidas correlações simples entre as variáveis.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os maiores percentuais de germinação e valores de IVG foram obtidos no
substrato areia (68% e 5,28, respectivamente), provavelmente por reunir
características necessárias de um bom substrato para germinação, tais como
porosidade e esterilidade. Uma boa porosidade permite o movimento de água e ar
no substrato, favorecendo a germinação. Para que isso ocorra, as sementes não
necessitam de nutrientes, mas apenas de sua hidratação e aeração para que se
procedam as reações que induzam à formação do caulículo e radícula. A
esterilidade do substrato seria outro fator importante para o aumento na taxa
de germinação das sementes, não servindo como fonte de patógenos de solo que
poderiam afetar a germinação e o estabelecimento das plântulas (Simão, 1971).
Os valores de porcentagem de germinação para os substratos solo natural e areia
foram similares aos encontrados por Parente & Machado (1986), mas
diferentes para o substrato mistura (Tabela_3). Semelhantemente ao ocorrido na
germinação, o IVG dos demais tratamentos variou de 2,82 no solo natural e 1,30
na mistura. Segundo Vieira Neto & Carvalho (1994), o tamanho da semente é
um fator complicador nesse tipo de teste, pois as sementes menores, por
necessitarem de menor volume de água, apresentam uma rápida germinação. Em
contrapartida, as de maior tamanho, por possuírem maiores conteúdos de reserva,
originam plântulas de maior tamanho. Por outro lado, Araújo & Nogueira
(2000) reportaram que o tamanho das sementes em mangabeira não deve ser
utilizado como uma característica indicativa de viabilidade de embriões, não
sendo, portanto, recomendável como critério para implantação de um programa de
seleção de sementes, visando à produção de mudas.
As plântulas do solo natural apresentaram uma altura média ligeiramente
superior (6,35cm) àquelas dos demais tratamentos, embora não tenha ocorrido
diferença significativa entre os mesmos. Em relação ao número de folhas, também
não foram constatadas diferenças estatísticas, havendo uma variação de 6,0
(solo natural), 6,7 (mistura) a 7,5 (areia lavada), conforme observado na
Figura_1.
Os valores das variáveis climáticas (PAR, UR, Tar e DPV), no interior da casa
de vegetação, entre 12 e 13h variaram de 785,0 a 869,0 mmol.m-2.s-1; 47,0 a
48,0%; 36,4 a 36,7oC e 3,16 a 3,27 kPa, respectivamente.
A análise de variância para a transpiração (E) e resistência difusiva (Rs)
apresentou diferenças altamente significativas entre os tratamentos, exceto
para a temperatura foliar. A Rs variou de 0,9 a 4,0 s.cm-1, sendo que o menor
valor foi verificado em solo natural, enquanto o maior ocorreu em folhas de
plantas cultivadas na mistura com valor intermediário para areia autoclavada
(Figura_2). Em estudo realizado por Nogueira et al. (1999), folhas de
mangabeira expostas ao sol apresentaram variação de 1,1 a 4,5 s.cm-1 de Rs. Com
relação a esse parâmetro, observaram-se comportamentos distintos entre os
tratamentos, destacando-se o solo natural, o qual proporcionou maior grau de
abertura estomática, mantendo no horário de maior demanda evaporativa os
menores valores de Rs (Figura_2), possibilitando com isso uma maior absorção de
CO2 para a fotossíntese. Oliveira et al. (1995) estudaram o comportamento de
plantas jovens de algumas espécies frutíferas tropicais e subtropicais e
constataram respostas fisiológicas diferenciadas quando submetidas a diferentes
níveis de radiação solar. Segundo esses autores, plantas de carambola (Averrhoa
carambola L.), cupuaçu (Theobroma grandiflorum Schum.) e biribá (Rollinia sp.),
cultivadas à sombra, apresentaram maior condutância estomática do que quando
cultivadas em pleno sol. Por outro lado, para araticum (Annonasp.), jenipapo
(Genipa americana L.) e murici (Byrsonima sp.) cultivados nas mesmas condições,
a resposta foi inversa, ou seja, a condutância manteve-se maior em plantas
expostas à radiação solar direta.
Os maiores valores da transpiração em folhas de mangabeira foram verificados em
solo natural (9,6 mmol.m-2.s-1), enquanto os menores ocorreram em plantas
cultivadas na mistura (2,6 mmol.m-2.s-1). Para folhas de plantas cultivadas em
areia, os valores foram de 4,6 mmol.m-2.s-1 (Figura_2).
Trabalhando com quatro matrizes de mangabeira na Zona da Mata Sul de
Pernambuco, Nogueira et al. (1999) verificaram padrões de comportamento
estomático diferentes para as referidas matrizes. No horário de maior demanda
evaporativa, os genótipos M-UFRPE-1 e M-UFRPE-8 conseguiram manter as trocas
gasosas com mais eficiência, apresentando valores da transpiração iguais a 6,6
e 8,5 mmol.m-2.s-1, respectivamente, quando comparadas à matriz M-UFRPE-2, a
qual transpirou nesse mesmo horário 2,2 mmol.m-2.s-1. Comparando-se esses
valores com os obtidos no presente trabalho, verifica-se que a taxa
transpiratória das folhas de mangabeira, cultivada em solo natural, nas horas
mais quentes do dia, é relativamente alta, podendo dessa forma facilitar a
entrada do CO2 para a realização da fotossíntese e proporcionar maior
crescimento das plantas.
Os valores da temperatura das folhas mantiveram-se superiores à temperatura do
ar em todos os tratamentos, com uma diferença máxima de 0,37oC (Figura_2). Em
plantas adultas cultivadas no campo, Nogueira et al. (1999) observaram que a
temperatura das folhas esteve acima da temperatura do ar, com uma diferença
máxima de 2,5oC, verificada no genótipo M-UFRPE 2 e mínima de 1oC para M-UFRPE
3. Segundo os mesmos autores, as folhas sombreadas apresentaram suas
temperaturas inferiores às registradas para o ambiente próximo a elas, com uma
variação de 0,2 a 0,7oC. Resultados semelhantes foram verificados em folhas de
laranjeira (Citrus sinensis) (Machado et al., 1994) e de acerola (Malpighia
emarginata D.C.), durante a estação seca (Nogueira & Moraes, 1997). Os
primeiros autores relatam que as temperaturas das folhas expostas à radiação
solar estiveram entre 1oC (9h) e 5oC (13h) acima da temperatura do ar, enquanto
os segundos verificaram diferenças de até 4oC. Essa variação é comum em algumas
espécies cultivadas e fundamenta-se no estado hídrico das mesmas, no
comportamento estomático e na perda de calor latente através da transpiração.
Tais diferenças normalmente diminuem no início da manhã e final da tarde
(Salinas et al., 1996).
Observando-se o sistema radicular de algumas plântulas após as análises
porométricas, no presente trabalho, foi detectada a presença de fungos
micorrízicos arbusculares (FMA's) principalmente nas raízes de plântulas
cultivadas em solo natural. Várias pesquisas têm sido conduzidas sobre a
influência de FMAs nas plantas, principalmente no que diz respeito ao aumento
de resistência a organismos fitopatogênicos (Chu et al., 1997; Oliveira et al.,
1999). Os FMAs promovem alterações na morfologia, fisiologia ou bioquímica da
planta hospedeira (Oliveira et al., 1999). As morfológicas são a lignificação
da parede celular, produção de diversos polissacarídeos e o aumento do sistema
radicular, sendo este último fator responsável pelo aumento do fluxo de água e
nutrientes pela planta. Andrade et al. (1999) sugerem que a micorriza seja um
fator importante na sobrevivência de mudas de mangaba em solos de baixa
fertilidade. O estudo feito por esses autores revela que o incremento excessivo
de matéria orgânica às mudas de mangabeira pode favorecer o desenvolvimento de
patógenos nas raízes, o que explicaria a baixa transpiração das plântulas do
substrato com mistura de areia, terriço vegetal e húmus, apesar de estar sob
capacidade de pote.
Verificou-se efeito inverso e significativo para as correlações entre a Tf e E
(-0,6306*), e positivo e significativo entre Tf e Rs (0,6712*). Os efeitos de E
x Rs foram inversos e altamente significativos (-0,9371**) para todos os
tratamentos estudados. A Tf, E e Rs, bem como a altura das plântulas e número
de folhas, não foram influenciadas pela Tar, UR e PAR.
CONCLUSÕES
1) O substrato areia autoclavada é o que proporciona maior porcentagem de
germinação e IVG dentre os substratos utilizados.
2) As plântulas cultivadas no substrato solo natural apresentam maior
transpiração que as cultivadas nos demais substratos.
3) Plantas cultivadas em solo natural apresentam maior adaptação ao ambiente
devido à diminuição da resistência difusiva, favorecendo as trocas gasosas nas
horas de maior demanda evaporativa.