A influência da dinâmica eleitoral sobre o comportamento dos partidos na Câmara
dos Deputados e no Senado Federal
INTRODUÇÃO
Diversos estudos têm salientado os efeitos perversos do presidencialismo sobre
o comportamento dos partidos e as relações entre os poderes. Indisciplina,
instabilidade, paralisia decisória e diferença de propósitos entre Executivo e
Legislativo são alguns desses efeitos. Os problemas teriam origem especialmente
no fato de as eleições serem separadas e os mandatos, rígidos. No
parlamentarismo, mecanismos como o voto de confiança e o controle da agenda
pelo chefe do Executivo configurariam uma "fusão" dos poderes, o que
estimularia a cooperação e facilitaria a governabilidade.
As análises sobre o comportamento dos parlamentares brasileiros, realizadas a
partir das premissas acima, apontam para um quadro desolador. Os políticos, de
acordo com Sartori (1994), relacionam-se com os partidos como se eles fossem
"de aluguel". A busca de apoio pelo presidente, por meio da distribuição de
pastas ministeriais, não garante, segundo o autor, nenhuma promessa do ponto de
vista estrutural ou sistêmico. Para Jones (1995), as instituições brasileiras
estimulam a resistência do presidente em ceder poder à oposição e o interesse
desta no fracasso do governo. Linz (1991), como Jones, afirma que os partidos
derrotados na eleição não apoiam o presidente e trabalham para seu fracasso.
Os problemas seriam especialmente sérios pelo fato de o presidencialismo
brasileiro estar combinado com o federalismo, sistema eleitoral proporcional
com lista aberta e distritos de grande magnitude (Ames, 2003; Mainwaring, 1999;
Samuels, 2003; Lijphart, 1991; Shugart e Carey, 1992). Para Lijphart, essa
combinação resulta em governos minoritários e abre a possibilidade de que os
partidos que controlam o Executivo e o Legislativo ocupem posições contrárias
no espectro ideológico. Segundo Mainwaring, essa combinação estimula a
fragmentação do sistema partidário, o paroquialismo na formulação de políticas,
mandatos personalizados, partidos marcados por faccionalismo e indisciplina,
migração partidária e formação de coalizões de governo ad hocpela ampla
utilização de patronagem.
Figueiredo e Limongi, a partir de meados da década de 1990, propõem uma
perspectiva de análise do sistema brasileiro que se distancia desses estudos.
Pesquisando a dinâmica legislativa do período pós-constitucional, os autores
constatam um padrão ideologicamente consistente de coalizões governativas,
disciplina parlamentar e altas taxas de sucesso e dominância do Executivo no
processo legislativo. O quadro é atribuído às prerrogativas constitucionais do
Executivo e, a exemplo dos estudos de Kiewiet e McCubbins (1991) e de Cox e
McCubbins (1993), às prerrogativas regimentais das lideranças partidárias. A
influência da centralização do processo decisório nas mãos desses dois atores,
sobre o comportamento parlamentar, ocorre, de acordo com Figueiredo e Limongi,
da seguinte maneira:
O controle de agenda exercido pelos líderes partidários e pelo
Executivo reduz as chances de sucesso das iniciativas individuais dos
deputados. Reduz também a possibilidade de que deputados adotem
estratégias do tipo free-rider. Não porque inexistam os incentivos
para sua adoção ou porque os deputados tenham assimilado normas
contrárias a esse tipo de estratégia. Os líderes são capazes de
reduzir as oportunidades para o comportamento individualista e
oportunista (1999:10).
A literatura posterior ao trabalho de Figueiredo e Limongi tem reforçado a
influência da centralização do processo decisório sobre o comportamento
parlamentar e a dinâmica entre os poderes, e acrescentado outras variáveis.
Amorim Neto, Cox e McCubbins (2003) salientam a influência da proporcionalidade
entre as pastas ministeriais distribuídas e o tamanho dos partidos sobre a
disciplina. Santos (2002) argumenta que o alinhamento dos partidos ao governo
propicia economia de informações ao eleitor e, por isso, incentiva a disciplina
nas votações dos projetos do presidente. O autor ressalta também que a
distribuição de cargos e de recursos orçamentários pelo Executivo influencia a
disciplina (Santos, 1997; 1999). Fatores suprapartidários, como magnitude,
abrangência e contiguidade ideológica das coalizões, são indicados por Inácio
(2006) e Marcus Melo (2007) como capazes de também influenciar a produção
legislativa e o comportamento partidário.
Em comum, esses estudos apontam para a importância dos partidos na dinâmica
legislativa. A referência analítica permanece sendo o modelo partidário
(Kiewiet e McCubbins, 1991; Cox e McCubbins, 1993), adaptado para o sistema
brasileiro com a incorporação das prerrogativas constitucionais do Executivo. A
conclusão, em termos gerais, é que a centralização do poder nas lideranças e no
Executivo reduz ou coíbe os estímulos distributivistas ou paroquialistas,
gerados pelo formato do sistema eleitoral.
Outros estudos indicam, na dinâmica decisória brasileira, a coexistência de
estímulos comportamentais diversos (Ames, 2003; Amorim Neto e Santos, 2003;
Carvalho, 2003; Pereira e Mueller, 2003; Pereira e Rennó, 2001). Apesar de
ressaltarem a influência da centralização do processo decisório, esses estudos
argumentam que fatores relacionados à arena eleitoral influenciam a dinâmica
parlamentar; por exemplo, o tipo de base eleitoral dos deputados. Os achados
indicam que a produção e o comportamento legislativos combinam aspectos
partidários e distributivistas ou paroquialistas. Contrapondo-se às análises
que salientam o partidarismo, o argumento é que a centralização do processo
decisório não logra anular significativamente os incentivos gerados na arena
eleitoral.
Neste artigo, analiso o comportamento dos partidos na Câmara dos Deputados e no
Senado Federal. O objetivo é explicar a variação em seu comportamento nas
votações nominais. Como nos estudos apresentados, também parto do pressuposto
de que esse comportamento, em relação ao que vigorou no período de 1946 a 1964,
é influenciado pela centralização do processo decisório. Questiono, no entanto,
o argumento, muitas vezes não explicitado, de que o partidarismo do
comportamento parlamentar, especialmente a disciplina, ocorre à revelia ou
independentemente dos incentivos que emergem da arena eleitoral, resultando tão
somente da organização do processo decisório. A análise se sustenta, em termos
teóricos, nos estudos de Cox (1987), Kiewiet e McCubbins (1991), Shugart e
Carey (1992), Cox e McCubbins (1993) e Powell Jr. (2000), que buscam
explicações para o comportamento parlamentar em fatores exógenos à arena
decisória, mais especificamente na eficiência das eleições e em seus efeitos
sobre a accountabilityeleitoral.
Na primeira parte, discuto as condições institucionais que possibilitam a
emergência da eficiência e sua relação com a accountability. Verifico, na
sequência, que as eleições presidenciais brasileiras adquiriram, a partir de
1994, um grau significativo de eficiência, influenciando o desempenho eleitoral
dos principais partidos competidores pelo cargo presidencial e suas estratégias
coligacionistas nas eleições congressuais e para as governadorias. A partir
disso, argumento que a eficiência das disputas presidenciais, ao influenciar o
desempenho congressual dos partidos que dela participam reiteradamente,
estimula-os a coordenarem mais seu comportamento parlamentar, o que não é
esperado dos outros partidos. Isso significa que, em um sistema
multipartidário, o tipo de posicionamento dos partidos nas eleições
presidenciais pode traduzir-se em estratégias diferentes das lideranças, na
arena parlamentar, e em diferentes disposições das bancadas partidárias diante
do Executivo e dos líderes, conformando, assim, partidos centralizados ou
descentralizados.
As hipóteses são testadas na segunda parte. No que se refere aos líderes, são
analisadas a coordenação que eles exercem sobre o comportamento das bancadas e
a coerência que mantêm entre posicionamento eleitoral e posicionamento diante
do governo. No que se refere às bancadas, é analisada sua disciplina. Nos
testes, o comportamento dos líderes e das bancadas é relacionado aos fatores
vinculados à dinâmica das eleições e ao posicionamento diante do governo. Na
tentativa de controlar os efeitos sobre a disciplina de uma variável que
antecede a própria inserção dos partidos na arena eleitoral - o tipo de
organização partidária -, insiro, nos testes, uma variável destinada a
diferenciar organizações mais coesas das menos coesas: o tempo de filiação à
organização partidária.
EFICIÊNCIA E ACCOUNTABILITY: A INFLUÊNCIA DAS DISPUTAS PRESIDENCIAIS SOBRE A
DINÂMICA ELEITORAL CONGRESSUAL
Nas análises sobre o comportamento dos partidos, fazem-se duas distinções
importantes: uma em torno da representação e outra em torno das eleições. Ambas
se fundam no pressuposto de que é nas eleições que se forjam as conexões entre
os representantes e os eleitores, e é a partir dessas conexões que emergem os
incentivos comportamentais fornecidos pelos últimos aos primeiros. Nesse
sentido, como diz Powell Jr. (2000), as eleições são a forma por meio da qual
os eleitores "formatam" o processo político.
A representação pode ser paroquialista ou nacional/geral. Esta se relaciona aos
interesses de uma constituencynacional;aprimeira,aos interesses de grupos
distrital ou regionalmente localizados e, conforme Shugart e Carey (1992), aos
interesses ideológicos ou políticos de setores sociais específicos, como
classes sociais, grupos étnicos ou religiosos, estejam ou não geograficamente
localizados. Eleições eficientes seriam aquelas em que os partidos apresentam
aos eleitores propostas de políticas nacionais alternativas, permitindo-lhes
uma identificação clara e um controle efetivo do desempenho governamental;
eleições representativas, as que possibilitam a expressão da diversidade de
interesses na assembleia. Um sistema eleitoral que maximizasse a
representatividade ofereceria a cada eleitor um partido situado próximo a seu
ponto ideal de políticas, mas não a identificabilidade de duas opções
competitivas de governo, não lhe capacitando, portanto, para o controle de seu
desempenho (Cox, 1987; Powell Jr., 2000; Shugart e Carey, 1992).
Historicamente, de acordo com Cox (1987), sistemas com eleições eficientes se
desenvolveram na Inglaterra. Partidos e candidatos, em virtude da dependência
prática do governo do voto de confiança da assembleia, teriam adquirido
incentivos para conduzir as campanhas em torno de políticas nacionais. Powell
Jr. (2000), pesquisando um número maior de sistemas, inclusive
presidencialistas, constata variabilidade quanto ao tipo de eleições e aponta
um trade-offentre eficiência e representatividade: sistemas eficientes,
especificamente os majoritários, seriam menos representativos da diversidade;
os que possibilitam maior representatividade, ou seja, os proporcionais,
dificilmente produziriam eficiência e capacitariam em menor medida os eleitores
para a accountability. No entanto, para o autor, mesmo possibilitando certo
grau de representatividade, os sistemas parlamentaristas seriam mais propensos
a produzir eficiência que os presidencialistas.
Distinções e conclusões semelhantes são elaboradas por Shugart e Carey (1992) a
propósito dos sistemas presidencialistas. Nesses sistemas, entretanto, em
virtude das eleições separadas, haveria mais opções, podendo-se atender aos
dois desideratos simultaneamente. Dependendo do tipo e do número efetivo de
partidos, tanto a eficiência pode emergir na eleição legislativa, embora sempre
em menor medida que no parlamentarismo, quanto pode ser difícil distinguir
alternativas de políticas na campanha presidencial.
O número de partidos seria influenciado pelo tipo de sistema eleitoral e pelo
ciclo das eleições presidenciais e congressuais. A tese pode ser assim
sintetizada: eleições concomitantes e por pluralidade reduzem o número de
partidos, possibilitando eficiência em ambas; eleições concorrentes, sendo a
presidencial por pluralidade e a congressual proporcional, teriam como efeito a
influência da primeira sobre a segunda, embora mantendo a possibilidade de
certa representatividade. Um maior número de partidos, na eleição para
assembleia, resultaria do incentivo às lideranças para aumentar seu poder de
barganha na posterior distribuição de cargos, pois a maior visibilidade da
disputa presidencial favoreceria o desempenho eleitoral dos partidos. O
incentivo à multiplicação dos partidos e à desvinculação das campanhas
executivas e congressuais seria ampliado quando as eleições são não
concomitantes ou quando a eleição presidencial é em dois turnos. A perspectiva
de um segundo turno desestimularia os partidos a estabelecerem acordos no
primeiro, com vistas a aumentar seu poder de barganha nas negociações de
composição do governo. Empiricamente, de acordo com Shugart e Carey, essas
combinações desencorajam a consolidação de políticas nacionais e incentivam a
fragmentação do sistema partidário, ou seja, coíbem a eficiência.
É importante salientar que, nos sistemas eficientes, um comportamento
parlamentar mais coordenado, evidenciado especialmente pela disciplina, é
estimulado pelo maior valor eleitoral da legenda partidária, ou seja, pela
possibilidade de os eleitores identificarem claramente os partidos que vão
governar e avaliarem facilmente seu desempenho. Nesse sentido, o argumento é
fundamentalmente diferente do que é desenvolvido por Samuels e Eaton (2002) e
Samuels (2003). De acordo com esses autores, nos sistemas presidencialistas, a
disciplina e a responsabilização dos partidos pelo governo podem ser
estimuladas pelo presidential coattail effects. Nesse caso, haveria
convergência entre as propostas apresentadas na campanha presidencial e aquelas
apresentadas pelas diversas elites partidárias (regionais ou locais) na disputa
legislativa. Nas eleições eficientes, também se prevê essa convergência, mas a
possibilidade de os partidos perdedores se alinharem ao governo é
significativamente menor, pois eles possuem interesses de longo prazo e não
estão dispostos a se responsabilizar por um governo que não elegeram.
A mesma coordenação da ação parlamentar, prevista nos sistemas eficientes e
naqueles em que há contágio da eleição presidencial, está relacionada, no
sistema norte-americano, de acordo com Kiewiet e McCubbins (1991) e Cox e
McCubbins (1993; 1995), à delegação de prerrogativas legislativas aos líderes.
Nesse sistema, no entanto, essa delegação, de acordo com os autores, esteve
condicionada à superação das divergências que dividiam os partidos na arena
eleitoral. Contudo, seu objetivo é o mesmo: imprimir visibilidade nacional à
legenda partidária tendo em vista a accountabilityeleitoral.
Apresentadas essas teses, uma rápida avaliação dos principais diagnósticos
sobre o sistema partidário, os partidos e as eleições permite uma melhor
aproximação da dinâmica atual.
Diagnósticos sobre o Sistema Partidário e as Eleições no Brasil
Os diagnósticos sobre o sistema partidário brasileiro têm sido marcadamente
negativos. Deparando-se com partidos organizacionalmente fracos e sem
enraizamento social, Lamounier e Meneguello (1986) classificam o sistema como
um "caso notório de subdesenvolvimento partidário". O diagnóstico de Lima
Júnior (1993:151) é semelhante: "O país não dispõe ainda de um sistema
partidário nacional". A fragmentação, a alta volatilidade e a distribuição
desigual da votação dos partidos entre os estados também sustentam os
diagnósticos de Mainwaring (1999) e Mainwaring e Jones (2003) de baixa
institucionalização e de nacionalização do sistema partidário.
As evidências são fortes. O sistema bipartidário, que surgiu com a legislação
de 1965, começa a ser desconstituído nas eleições de 1982, quando surgem PT**,
PDT e uma nova versão do PTB. Em 1986, surgem (ou ressurgem) outros partidos:
PCB, PC do B, PSB, PL e PDC. Ainda na década de 1980, surge outro grupo de
partidos a partir de cisões nos já existentes: o PFL foi criado em 1985, com a
divisão do PDS; o PSDB, em 1988, por membros da esquerda do PMDB. Assim, a
fragmentação do sistema foi abrupta (Lima Júnior, 1993). O número efetivo de
partidos (Ne) passou de 2,4 e 2,8, nas eleições de 1982 e 1986,
respectivamente, para 8,7; 8,2; 7,1; 8,5; e 9,3 nas eleições de 1990 a 2006,
respectivamente (Carlos Melo, 2007). Apesar da estabilização do número de
legendas em torno de trinta, a partir de 1994, e da concentração da votação em
um número menor, estudos ainda indicam, com base na análise das mudanças de
legenda durante a legislatura, a falta de coesão dos partidos (Mainwaring,
1999; Carlos Melo, 2004; 2006; 2007; Marenco dos Santos, 2001).
Outro aspecto do sistema, a descentralização ou a falta de uma coordenação
nacional nos partidos, também tem sido reiterado. O fenômeno é antigo, tem sido
objeto de diversas análises e é denominado de diferentes maneiras. Lima Júnior
(1983; 1993) verificou sua manifestação na existência de subsistemas
partidários estaduais tanto no período de 1945 a 1964 quanto no atual; Nicolau
(1996) aponta o federalismo dos partidos atuais. De maneira geral, o quadro é
atribuído, como dito, à combinação de representação proporcional com lista
aberta, federalismo, distritos de grande magnitude e monopólio, por parte de
lideranças estaduais ou locais, da distribuição de recursos partidários
(Abrucio, 1998; Ames, 2003; Mainwaring, 1999; Samuels, 2003). Shugart e Carey
(1992) reforçam essas teses e apresentam mais uma sobre a dinâmica eleitoral
brasileira: a natureza excessivamente representativa das eleições presidenciais
em detrimento da eficiência e, portanto, da accountability.
A eficiência das eleições presidenciais e uma proposta de classificação dos
partidos
Como preveem Shugart e Carey (1992), a perspectiva de um segundo turno tem
encorajado a apresentação de candidatos por um grande número de partidos nas
cinco últimas eleições presidenciais. Esse número foi especialmente alto na
primeira eleição, a de 1989, quando concorreram 21 candidatos (Tabela_1), mas
caiu para uma média de 8,3 competidores nas quatro eleições subsequentes.
Apesar dessa média ainda alta, a distribuição da votação entre os competidores
concentra-se, na maioria das eleições a partir de 1994, em duas propostas de
governo, que é o principal indicador de eficiência eleitoral.
No primeiro turno da eleição de 1989, os candidatos mais votados, do PT e do
PRN, reuniram 47,7% da votação. Nessa ocasião, sobraram propostas de governo;
partidos com longa trajetória, como o PMDB, tiveram votações inexpressivas;
partidos destituídos de qualquer significado, como o PRN, lograram votações
surpreendentes (30,5%). Sobrou ineficiência, diriam Shugart e Carey, o que é
indicado pelo alto número efetivo de partidos (5,7).
Nas eleições de 1994, 1998, 2002 e 2006, a eficiência emerge. A disputa passa a
ser coordenada pelos partidos, mais especificamente o PT e o PSDB, que se
firmam "como alternativas de políticas perante o eleitorado nacional" (Melo,
2006:168), reunindo, nessas eleições, 81,3%, 84,8%, 69,6% e 90,2% dos votos
(média de 81,5%). Com esses percentuais, o Brasil praticamente se equipara aos
sistemas presidencialistas cujas eleições são classificadas como eficientes
(média de 85%)1.Em 1994 e em 1998, não houve segundo turno e, em 2006, apesar
de ter havido uma segunda rodada, os dois primeiros colocados obtiveram 90,2%
dos votos na primeira. Nas eleições de 1994 a 2006, o número efetivo de
partidos caiu para uma média de 2,72. Após a eleição de 1989, apenas duas vezes
(1998 e 2002) o terceiro candidato obteve mais de 10% dos votos. Nos sistemas
ineficientes, a votação dos terceiros candidatos reúne, em média, mais de 35%
da votação (Shugart e Carey, 1992). No Brasil, apenas em 1989 esse patamar foi
ultrapassado. A média das quatro últimas eleições é de 18,5%. Assim, o sistema,
nas eleições executivas federais, não possui o formato multipartidário
previsto. A distribuição dos votos entre os competidores, a partir de 1994,
denota uma escolha entre uma proposta de governo ou outra, ou seja, eficiência.
Antes de avaliar o impacto da eficiência das eleições presidenciais sobre o
desempenho eleitoral congressual dos partidos, cabe salientar que a simples
participação na disputa presidencial é vista como um estímulo à convergência
política, independentemente do grau de eficiência. As discussões de Duverger
(1994) e Lima Júnior (1999) apontam nessa direção. Duverger discute o sistema
partidário francês e distingue alguns fatores que propiciaram sua
nacionalização. O primeiro é o uso do rádio e da televisão, que tornou a
propaganda partidária mais uniforme no território e concentrada nas lideranças
nacionais; o segundo, a capacidade dos partidos para reunir votos, o que, na
visão do autor, depende de seu tamanho; o terceiro, a eleição popular do
presidente da República. De acordo com Lima Júnior, a disputa presidencial
brasileira, a partir da eleição de Jânio Quadros, tornou-se nacional tanto pelo
tamanho e pela complexidade socioeconômica do eleitorado, além de pela
magnitude do apoio necessário para a vitória presidencial, quanto pela
necessidade de articulação política vertical e horizontal:
Não se trata mais de um acerto político entre meia dúzia de
oligarquias estaduais; não se trata mais de o detentor do poder
escolher e fazer o seu sucessor; pelo contrário, a coalizão tem de
ser bem mais ampla, incluindo grandes e pequenos estados. O apelo
político tem de romper com particularidades locais e assumir um
caráter mais geral, mais universal (ibidem:20).
Partindo dessas análises, pode-se argumentar, portanto, que a participação dos
partidos na eleição presidencial estimula, nas elites partidárias, um esforço
de articulação dos interesses de suas diversas bases eleitorais à proposta
apresentada na campanha presidencial. Em um sistema com eleições presidenciais
eficientes, esse esforço é estimulado, ademais, pela relação entre eficiência e
desempenho eleitoral congressual, e pode-se esperar que ele se estenda à arena
parlamentar, manifestando-se sob a forma de maior coordenação ou centralização
das ações de liderança e das bancadas partidárias.
Apesar da eficiência, o grande número de competidores aconselha um olhar mais
cuidadoso sobre a participação dos partidos nas eleições presidenciais
brasileiras. A avaliação permitirá distinguir mais claramente aqueles que
possuem estímulos à coordenação ou à centralização da ação parlamentar, por
participarem com mais frequência e de forma mais consistente das eleições
presidenciais, daqueles que não os possuem, seja porque participam dessas
eleições apenas eventualmente, seja por apresentarem uma participação não
consistente ao longo do tempo. Na Tabela_2, distingue-se a participação dos
partidos nas cinco últimas eleições presidenciais em duas modalidades:
apresentando candidato e participando de coligação.
Como pode ser visto, há significativa variação entre os partidos. Apresentando
candidatos, PT e PSDB são os mais constantes competidores do atual período
democrático. São seguidos pelo PDT e pelo PCB/PPS3, que apresentaram candidatos
em três eleições, e pelo PMDB e pelo PDS/PPR/PPB/PP4 (doravante PDS-PP), que
disputaram apenas as duas primeiras eleições. PC do B, PSB, PFL e PTB têm se
destacado como parceiros de coligações presidenciais. No entanto, enquanto o PC
do B e o PSB têm demonstrado apoio reiterado aos candidatos petistas, em cinco
e três eleições, respectivamente, e o PFL, aos do PSDB, em três eleições, o PTB
trocou, em 2002, o apoio aos candidatos do PSDB, das duas eleições anteriores,
pelo apoio ao candidato do PCB-PPS. Não apresenta, portanto, um alinhamento
consistente.
Supondo que a participação nas eleições presidenciais estimula maior grau de
centralização política dos partidos, pode-se, a partir do número e da
modalidade de participação, classificá-los. PMDB, PDS-PP, PL e PTB são
competidores eventuais. Não atendem de forma contínua, ou consistente, no caso
do PTB, ao critério proposto, o que permite esperar que suas lideranças sejam
menos estimuladas a coerir em torno de uma proposta política mais abrangente na
arena eleitoral e a coordenar seu comportamento parlamentar. Podem ser
classificados, por isso, como partidos descentralizados. Por apresentarem
candidatos reiteradamente ou um alinhamento partidário consistente, PT, PSDB,
PDT, PCB-PPS, PSB, PC do B e PFL podem ser classificados como partidos
centralizados. Avariação em sua participação permite, no entanto, distinguir
três subtipos de partidos centralizados: 1) PT e PSDB apresentam persistência
na apresentação de candidatos e capacidade de angariar apoio eleitoral
significativo, como visto na Tabela 1. São partidos de "vocação" presidencial.
Nos termos propostos, são os partidos brasileiros com maior estímulo à
centralização; 2) PDT e PCB-PPS apresentam candidatos recorrentemente, embora
não com as mesmas frequência e capacidade de angariar votos que PT e PSDB.
Possuem, portanto, uma vocação menos consistente, que pode ser denominada
pretensão "presidencial"; 3) PC do B e PSB, por um lado, e PFL, por outro, são
parceiros reiterados e leais, ou "coadjuvantes", de coligações lideradas,
respectivamente, pelo PT e pelo PSDB. Apesar de não terem apresentado
candidatos nas últimas eleições, com exceção do PSB, essa participação lhes
exige permanentemente coordenação da ação política.
Constatada a eficiência das eleições presidenciais, resta a inconsistência do
fenômeno em face dos incentivos institucionais, pelo menos nos termos de
Shugart e Carey (1992). Embora as eleições executivas e legislativas tenham se
tornado "casadas" em 1994, regra mais conducente à eficiência que a de "eleição
solteira" que vigorou em 1989, como explicar eficiência em um sistema
multipartidário com eleições em dois turnos? Duverger (1994), discutindo a
polarização na Quinta República, sugere que ela foi propiciada pela combinação
de votação em dois turnos, nas disputas presidenciais e legislativas, e pela
força e disciplina adquiridas por um dos polos, o que lhe permitiria assumir e
manter o poder. A votação em dois turnos não é, porém, indispensável para o
surgimento de um sistema bipolar. Empiricamente, diz o autor, o bipolarismo
surge
[...] quando acontece de um partido atrair quase a metade dos votos
populares. Os outros são então forçados a se unir a fim de
restabelecer um equilíbrio. Quando duas coalizões se confrontam, a
representação proporcional dá a cada um de seus membros muita
liberdade para consolidar um sistema bipolar do tipo francês (ibidem:
84).
Assim, a polarização brasileira apresenta bastante similaridade com o caso
francês: alianças partidárias consistentes na disputa presidencial e, como será
visto, também nas congressuais, e a emergência de um partido que possui
diversas semelhanças com os tradicionais partidos de massa europeus - o PT5.
Esse partido se alia a outros de esquerda, especialmente o PC do B e o PSB, e
lança uma ameaça bastante crível, já em 1989, de conquista do governo federal.
Essa ameaça, concretizada em 2002, estimulou a aliança entre os partidos de
centro e de direita, liderada pelo PSDB. O quadro é salientado por Carlos Melo
(2007:280):
[...] a dinâmica presidencial vem gerando um efeito estruturante
sobre o sistema partidário. À exceção da eleição de 1989, quando 21
partidos lançaram nomes à disputa, e o número efetivo de candidatos
chegou a 5,7, nas quatro disputas seguintes o pleito foi polarizado
por dois blocos, à frente dos quais se destacavam o PT e o PSDB.
[...] os dois partidos [que] se firmaram como alternativas de
policesperante o eleitorado nacional.
O "efeito estruturante" das eleições presidenciais sobre o sistema partidário
brasileiro ocorre tanto no nível do eleitorado, o que é evidenciado pela
vinculação da votação presidencial à congressual e pela maior volatilidade
eleitoral dos partidos de vocação presidencial, quanto no nível das elites
partidárias. Como dito, é justamente porque a eficiência das eleições
presidenciais está associada ao comportamento do eleitorque ela vai influenciar
as estratégias dos partidos que delas participam de forma reiterada e
consistente, visando imprimir maior consistência, em termos nacionais, à
legenda partidária.
A influência da eficiência sobre o desempenho dos partidos nas eleições
congressuais
Em um sistema multipartidário, espera-se que a influência da eficiência das
disputas presidenciais sobre as congressuais seja evidenciada pela vinculação
entre os votos colocados nas urnas presidenciais e aqueles colocados nas
congressuais. Um desempenho eleitoral congressual diferenciado dos competidores
à Presidência é apontado por Fiorina (1974), Powell Jr. (2000) e Shugart e
Carey (1992). Para Powell Jr., premiação e punição de governos, bem como a
ordem das preferências manifestadas por propostas políticas ainda não testadas,
abrem espaço para accountabilitye decisividade nos sistemas eficientes, o que
seria indicado pela volatilidade mais alta dos votos dos partidos responsáveis
pelo governo6.
No sistema brasileiro, argumentar sobre a influência das eleições presidenciais
sobre as congressuais exige sempre contra-argumentar sobre o predomínio da
influência do federalismo sobre o desempenho e o comportamento dos partidos.
Considerando que a eficiência das eleições presidenciais é um fenômeno
relativamente recente, cabe avaliar se ela produz alguma alteração nesse
diagnóstico, pelo menos no que se refere ao desempenho eleitoral dos partidos e
aos seus alinhamentos. A análise da influência sobre o desempenho eleitoral é
feita a partir de dois indicadores: 1) volatilidade eleitoral nas eleições para
a Câmara; 2) correlação entre a votação obtida pelos partidos nas eleições para
as governadorias e para a Presidência e a que eles lograram nas eleições
congressuais. Como a volatilidade eleitoral, a correlação permite verificar a
influência da eficiência das disputas presidenciais sobre as congressuais, mas
permite também comparar a influência exercida pelas duas eleições executivas
(estadual e federal) sobre as congressuais7. A avaliação da influência da
eleição presidencial sobre os alinhamentos partidários é feita pela análise das
estratégias coligacionistas das elites nas disputas para a Câmara, o Senado e
as governadorias.
As coligações são analisadas na próxima seção. A Tabela_3 traz a volatilidade
por tipo de partido nas cinco últimas eleições para a Câmara.
Os dados apresentados - mais especificamente o fato de a volatilidade média dos
partidos de vocação presidencial ser mais que o dobro (1,5) da que é
apresentada pelos partidos de pretensão presidencial, pelos coadjuvantes e
pelos descentralizados (em torno de 0,7) - mostram que o eleitor tem
demonstrado capacidade de punir e de premiar, na eleição para a Câmara, os
partidos responsáveis pelos governos anteriores e estabelecer ordem de
preferência clara entre os competidores ainda não testados.
Uma análise mais detalhada dos dados eleitorais evidencia melhor o argumento.
Em 1994, PT e PSDB reuniram 54,3% e 27% dos votos, respectivamente (conforme
Tabela_1), no primeiro turno das eleições presidenciais. Na medida em que
nenhum deles havia sido testado no governo, a votação reflete o ordenamento das
preferências do eleitorado e a não punição ou a premiação pelo desempenho
governamental. Esse mesmo ordenamento é replicado na votação desses partidos
para a Câmara: PSDB cresce 5,3% e PT, 2,9% (a volatilidade de ambos é 4,1,
conforme Tabela_3). Em 1998, não houve punição, mas sim premiação pelo
desempenho do governo: o presidente da República é reeleito no primeiro turno,
com 53,1% dos votos, e o candidato do PT fica em segundo lugar na preferência
do eleitorado (31,7% dos votos). Esse ordenamento novamente se replica na
votação para a Câmara: PSDB cresce 3,5% e PT, 0,1% (a volatilidade de ambos é
1,8). Nas eleições presidenciais de 2002, o eleitorado manifesta preferência
pelo candidato do PT (46,4%), embora não o suficiente para elegê-lo no primeiro
turno, ficando o candidato do PSDB em segundo lugar, com 23,2% dos votos.
Embora esse resultado indique claramente preferência pelo PT, ele não nos
permite afirmar que houve punição do PSDB pelo seu desempenho no governo. Na
avaliação do desempenho eleitoral para a Câmara, no entanto, há indicação mais
clara de punição e de preferência: PSDB perde 3,2% dos votos conquistados em
1998; PT cresce sua votação em 5,2% (a volatilidade de ambos fica em 4,2). Nas
eleições presidenciais de 2006, os resultados eleitorais do primeiro turno são
menos definitivos, refletindo a crise em que se debateu o governo Lula a partir
de 2005: PT fica com 48,6% da votação; PSDB, com 41,6%. Na eleição para a
Câmara, a punição ao PT é clara: perde 3,5% dos votos conquistados em 2002. No
entanto, esse resultado não favorece o PSDB, cuja votação cai 0,6% (a
volatilidade de ambos é 2,1).
Assim, é clara a influência da eficiência das eleições presidenciais sobre o
desempenho eleitoral congressual dos partidos de vocação presidencial. No
entanto, como mencionado, argumentar sobre a influência das eleições
presidenciais sobre as congressuais exige sempre contra-argumentar sobre o
predomínio da influência do federalismo sobre o desempenho e o comportamento
dos partidos. Com o objetivo de comparar a influência das duas eleições
executivas (federal e estadual) sobre o desempenho eleitoral para a Câmara e o
Senado, apresento, na Tabela_4, a correlação entre as votações para esses
cargos.
Na avaliação dos coeficientes, percebe-se, em primeiro lugar, que a correlação
entre a votação para a escolha dos cargos executivos é maior com a votação para
a Câmara que para o Senado. A explicação para a diferença encontra-se no
sistema utilizado: o proporcional permite uma manifestação mais livre das
preferências na medida em que disponibiliza mais opções para o eleitor; o
majoritário restringe a escolha ao limitar a oferta de candidatos (Sartori,
1994). Em segundo os coeficientes indicam correlação significativa entre o
desempenho dos partidos que disputam as governadorias e seu desempenho nas
eleições legislativas, especialmente para a Câmara, nas cinco últimas eleições.
Em terceiro, a correlação entre o desempenho dos partidos que disputam a
Presidência e seu desempenho para a Câmara foi muito baixa, é claro, em 1990,
visto que a eleição presidencial ocorrera no ano anterior, e em 1994, quando as
eleições já são concorrentes. No entanto, a partir de 1998, o quadro se
inverte: a correlação entre a votação obtida pelos partidos que disputaram a
Presidência e a que eles obtiveram nas disputas congressuais, especialmente
para a Câmara, tornou-se mais alta. Assim, supondo que a correlação encontrada
aumente a probabilidade de relações de influência, pode-se concluir que, apesar
de as eleições para os governadores ainda influenciarem o desempenho
congressual dos partidos, essa influência é menor, nas três últimas eleições,
que a exercida pelas disputas presidenciais.
A influência da eficiência sobre os alinhamentos partidários: as coligações
eleitorais
As coligações nas eleições proporcionais foram permitidas nas eleições de 1950
a 1962, proibidas pela Lei Orgânica dos Partidos Políticos, de 1971, e
novamente liberadas a partir das eleições de 1986 (Lima Júnior, 1993). Entre
1986 e 1998, foi proibido aos partidos realizarem, para a Câmara, coligações
diferentes das firmadas para as governadorias. Em 2002 e em 2006, o TSE exigiu
a verticalização, ou seja, os partidos que participavam da disputa presidencial
não puderam fazer coligações diferentes nas disputas para os outros cargos
(federais e estaduais). Em 2006, foi aprovada a Emenda Constitucional nº52, que
institui a não obrigatoriedade de se manter a mesma coligação nos diversos
pleitos8.
Apesar de seu impacto positivo na proporcionalidade entre votos e cadeiras
(Braga, 2006), essas coligações são uma das especificidades do sistema
brasileiro mais condenadas na literatura. O argumento é que elas desvirtuam a
representação, ao possibilitar a transferência de votos, e estimulam a
fragmentação do sistema, ao permitir a sobrevivência de partidos que não
lograriam ultrapassar o coeficiente eleitoral se concorressem isoladamente.
As primeiras teses sobre o comportamento coligacionista foram elaboradas por
Soares (1964): a do esforço mínimo e a da resistência ideológica. A primeira
supõe que os partidos, especialmente os pequenos, visam a ganhos eleitorais, e,
por isso, o comportamento coligacionista denotaria racionalidade em face das
instituições; a tese da resistência ideológica supõe a influência das
ideologias dos partidos e de seu enraizamento social sobre o cálculo
coligacionista. Lima Júnior e Lavareda introduzem argumentos novos no debate.
Lima Júnior (1983) aponta a existência de "subsistemas partidários estaduais"
regidos por diferentes racionalidades. A principal contribuição de Lavareda
(1991) é mostrar que o cálculo coligacionista incorpora elementos estranhos à
disputa proporcional federal. Constatando que os grandes partidos perdiam
cadeiras para os pequenos, o autor argumenta que "[a]s coligações nesses
pleitos [os proporcionais federais] funcionavam como instrumento de barganha
para amealhar apoio de pequenos nas legendas nas eleições de soma zero - os
pleitos majoritários de turno único para os executivos estaduais" (ibidem:115-
116).
Entre os estudos que tratam das coligações do período atual, alguns comparam a
influência exercida pelas eleições para a Presidência e governadorias sobre as
coligações e votação congressuais. Nas coligações de 1994 e 1998 para a Câmara,
Samuels (2003) conclui que há maior congruência com as que se fizeram para as
governadorias que as firmadas para a Presidência. Na análise das votações e das
coligações congressuais, de 1990 a 2002, Braga (2006a), por outro lado, conclui
que, "dada a magnitude do colégio eleitoral da disputa presidencial, há, na
verdade, um processo de articulação envolvendo as lideranças nacionais e
estaduais para manter congruência nas coligações partidárias, de modo a
aumentar as chances de êxito na eleição em nível nacional" (ibidem:281-282).
A análise das coligações aqui visa apenas verificar se a polarização que emerge
na disputa presidencial se reflete no padrão aliancista dos partidos nas outras
disputas. Para isso, avalio as estratégias de cada um dos onze maiores partidos
(PC do B, PT, PSB, PDT, PCB-PPS, PSDB, PMDB, PL, PTB, PDS-PP, PFL),
especificamente os parceiros de coligação por eles escolhidos. Entendo cada par
de partidos, em uma coligação, como "aliança". Como a participação dos
micropartidos dificulta a avaliação das estratégias dos maiores, procuro antes
distinguir a contribuição desses dois grupos na evolução do número de
coligações.
A distribuição do número de "coligações (total)" (Tabela_5) mostra variação
entre os cargos e, no mesmo cargo, entre as eleições. Para a Câmara, esse
número apresenta crescimento em 1994, 2002 e 2006. Em 1994, o aumento está
relacionado com o comportamento dos partidos maiores, como pode ser visto pelo
número de "coligações com pelo menos um dos maiores partidos". Em 2002, o
aumento do total de coligações é explicado também pelo comportamento dos
maiores partidos e está relacionado com a exigência de verticalização. Como
mostra o aumento de "coligações com pelo menos um dos maiores partidos",
naquelas eleições, esses partidos multiplicaram as coligações para os três
cargos. Em 2006, o aumento no número de "coligações (total)" está relacionado
com a participação eleitoral dos micros, como pode ser visto na evolução do
número de "coligações apenas de micros".
O número de "coligações com pelo menos um dos maiores partidos" traz outras
informações importantes. Em primeiro lugar, ele reflete o número de estados em
que esses partidos participam de cada uma das disputas e suas preferências
quanto às modalidades. Em segundo, percebe-se relativa estabilidade no número
das coligações nas eleições para as governadorias (em torno de 76) e para o
Senado (em torno de 66). Essa estabilidade é interrompida apenas em 2002 pela
verticalização, como já salientado. Para a Câmara, não se pode falar em
estabilidade: desconsiderando os aumentos de 1994 (de 76 para 103) e de 2002
(de 87 para 122), há um leve crescimento do número de coligações (em torno de
6) entre as outras eleições. Vejamos como esses partidos preferem competir nas
eleições: se em alianças entre si ou em aliança apenas com micros ou
isoladamente (Tabela_6).
Nas eleições para a Câmara, percebe-se um aumento significativo das alianças
entre os maiores partidos em 1994 (329) e em 1998 (362), tendo-se por
referência a eleição de 1990 (240 alianças). Em 2002, em virtude da
verticalização, há uma queda brusca nessas alianças (202), mas, em 2006, elas
voltam a crescer (314), ficando ainda em um patamar superior ao de 1990. Nas
disputas para o Senado, esses partidos parecem aliar menos entre si nos anos em
que dois terços das cadeiras estão em disputa, o que parece influenciar,
inclusive, as estratégias adotadas nas eleições para as governadorias. A
oscilação inversa do número de "disputas isoladas de um dos maiores ou aliança
apenas com micros" parece confirmar essa tendência: nos anos em que dois terços
das cadeiras estão em disputa, há aumento dessas modalidades de participação
eleitoral.
O ponto a ser ressaltado é que, apesar de os maiores partidos terem aumentado,
em relação à eleição de 1990, o número de alianças entre si nas eleições para a
Câmara, especialmente em 1994 e em 1998, mostrando preferência pela acomodação
diversificada do maior número possível de parceiros na coligação, a avaliação
do número de alianças entre os partidos de vocação presidencial e seus
coadjuvantes aponta claramente para a polarização antes mesmo da exigência de
verticalização em 2002. Vejamos as alianças entre PT e PSDB (Tabela_7).
Os dois partidos de vocação presidencial participaram da mesma coligação nas
eleições para a Câmara, em 1990, em três estados; em 1994 e em 1998, em dois.
Para as governadorias, as escolhas são as mesmas, embora a participação tenha
sido menor; para o Senado, o número de alianças entre eles é uma em 1994 e duas
em 1998.
Os coadjuvantes seguem, em geral, estratégias semelhantes para a Câmara: o PC
do B acompanha o PT na restrição das alianças com o PSDB; o PSB mantém o mesmo
número em 1994 e em 19989. Cabe salientar que a polarização que existe entre o
PT e o PFL é mais radical que a que se instalou entre o PT e o PSDB. Esses dois
são os únicos partidos que nunca se aliaram nas disputas para o Legislativo
federal, mostrando que a resistência ideológica no cálculo coligacionista,
conforme Soares (1964), encontra evidências também no sistema atual, estando
presente, até mesmo, na polarização pelo cargo presidencial. Nas eleições
executivas estaduais, esses partidos também se colocaram sempre em campos
opostos, exceto em 2002, quando integraram uma mesma coligação: a que lançou o
candidato do PSL ao governo de Roraima.
A consistência da polarização entre os partidos de vocação presidencial e seus
coadjuvantes, nas eleições congressuais, pode ser avaliada, inclusive, em suas
estratégias coligacionistas em 2006. Visando à acomodação diversificada do
maior número de parceiros nos diversos pleitos, mas ainda sob a exigência de
verticalização, todos os partidos restringiram ao máximo as coligações
presidenciais. As únicas formalizadas foram justamente entre PT e PC do B, de
um lado, e PSDB e PFL, de outro.
Assim, a análise da votação e das coligações dos partidos nas eleições
presidenciais e congressuais mostra, em primeiro lugar, a eficiência das
primeiras e sua influência sobre o desempenho dos partidos nas últimas, em
detrimento, até mesmo, da influência das eleições para as governadorias; em
segundo, que a polarização instalada na disputa presidencial permeou os
cálculos das elites partidárias, quando da realização das coligações para o
Congresso e até para as governadorias, mesmo antes que a lei o exigisse e
simultaneamente ao aumento do número de alianças entre todos os maiores
partidos. No que segue, é investigada a pertinência da classificação dos
partidos em centralizados e descentralizados para a previsão de seu
comportamento parlamentar.
A INFLUÊNCIA DA DINÂMICA ELEITORAL SOBRE O COMPORTAMENTO DOS PARTIDOS NA ARENA
PARLAMENTAR
Com o objetivo de avaliar se a dinâmica das eleições presidenciais e
congressuais influencia o comportamento parlamentar dos partidos, testo três
conjuntos de hipótese. Os dois primeiros focam o comportamento das lideranças;
o último, o das bancadas partidárias. Os testes são realizados com dados das
votações nominais da Câmara e do Senado.
A Influência da Dinâmica Eleitoral sobre o Comportamento das Lideranças
O comportamento das lideranças parlamentares pode ser avaliado a partir de duas
variáveis: a coordenação que imprimem ao comportamento das bancadas partidárias
nas votações e a coerência que mantêm entre o resultado das urnas e o
posicionamento diante dos governos.
A coordenação do voto das bancadas parlamentares é uma estratégia
potencialmente excelente para se adquirir visibilidade política. Para que um
partido seja capaz de transmitir uma imagem com contornos minimamente definidos
no sistema político brasileiro, em que o Executivo possui substantivo poder de
agenda, faz-se necessário que aquele coloque sua marca na produção legislativa.
Essa estratégia é feita de forma afirmativa, aprovando ou rejeitando as
proposições, ou negativa, impedindo sua votação, o que pode ocorrer quando o
líder declara obstrução, na tentativa de provocar falta de quórum. Por outro
lado, sempre há votações em que parlamentares e lideranças preferem não se
posicionar, mais especificamente as de projetos que contrariam os interesses de
suas bases eleitorais. Nessas ocasiões, o encaminhamento é pela abstenção, o
líder libera a bancada ou não encaminha a votação, ou seja, o partido não
manifesta sua posição na votação e, assim, não se responsabiliza por seu
resultado.
Dados esses nexos, é plausível esperar que: 1) os partidos centralizados
utilizem mais a primeira estratégia - coordenem mais o comportamento das
bancadas -, na medida em que estão, desde as eleições, responsabilizados pelas
ações do governo ou contrários a elas, o que requer que imprimam visibilidade
nacional à atuação partidária; 2) os partidos descentralizados utilizem mais a
segunda estratégia - coordenem menos -, na medida em que, sendo sua
constituencyregional ou setorial, não possuem, em geral, interesse em aumentar
a visibilidade nacional da legenda. Esses são os incentivos que advêm da arena
eleitoral. Por outro lado, dadas as prerrogativas do Executivo no processo
decisório, mais especificamente seu monopólio na distribuição de recursos
importantes para os legisladores, é plausível esperar que, integrando a base
governista e, portanto, tendo acesso aos recursos, as lideranças dos partidos
descentralizados sejam mais estimuladas, negativa ou positivamente, a coordenar
o comportamento de suas bancadas.
Para avaliar a coordenação, utilizo uma análise de regressão pelo método dos
Mínimos Quadrados Ordinários (MQO). Os dados referem-se às votações realizadas
na Câmara, distribuídas nas treze coalizões de governo do período de 1991 a
200710. Os partidos analisados são: PT, PC do B, PSB, PDT, PCB-PPS, PSDB, PMDB,
PL, PTB, PDS-PP, PFL.
As variáveis são: dependente: coordenação das lideranças parlamentares(%),
calculada da seguinte maneira: número de votações com encaminhamentos pela
aprovação ou rejeição das proposições (sim, não) e pela obstrução da votação
sobre o total de votações do período de vigência da coalizão; independentes: 1)
eficiência eleitoral: dummyque distingue as coalizões do período com eleições
eficientes daquelas do período com eleição não eficiente (categoria de
referência: não eficiência para o período de 1991 a 1994); 2) tipo de partido:
dummyque distingue partido centralizado de descentralizado11 (referência:
descentralizado); 3) posição diante do governo: dummyque distingue a posição do
partido diante do governo (referência: não integrado à base); 4) governo Lula:
dummyque busca controlar diferenças na coordenação entre os governos no período
com eleições eficientes (referência: governos Collor/Itamar e Fernando
Henrique)12. No último modelo, substitui-se a variável eficiênciapor uma
dummypara governos Fernando Henrique(referência: governos Collor/Itamar e
Lula), a fim de verificar se há diferenças na coordenação apenas entre governos
(Tabela_8).
As hipóteses estatísticas são: 1) no período com eleições eficientes, as
lideranças coordenam mais o comportamento das bancadas que no período com
eleição não eficiente; 2) as lideranças dos partidos centralizados coordenam
mais o comportamento das bancadas que as dos descentralizados; 3) as lideranças
partidárias coordenam mais o comportamento das bancadas quando integram a
coalizão governista que quando não integram.
No primeiro modelo, comprova-se a primeira hipótese. No período com eleições
eficientes, as lideranças partidárias coordenam o comportamento das bancadas
5,343 pontos a mais que no período com eleição não eficiente13. No governo
Lula, tendo-se por referência os governos anteriores, a coordenação é aumentada
em 6,555 pontos. No segundo modelo, a introdução da variável tipo de
partidoaltera muito pouco os resultados. Essa variável apresenta coeficiente
baixo, sem significância estatística e no sentido contrário ao esperado (-
0,571). A capacidade explicativa de ambos os modelos é de 12,6% e de 12,7% da
variação, respectivamente, com significância estatística em torno de 1%.
No terceiro modelo, em que se introduz a variável posição diante do governo,
esses resultados são alterados: no período com eleições eficientes, os partidos
coordenam o comportamento das bancadas 4,868 pontos a mais que no período com
eleição não eficiente. O efeito cresce no governo Lula, quando a coordenação é
de 5,729 pontos a mais que nos governos Collor/Itamar e Fernando Henrique. Ser
partido centralizado, em relação a ser descentralizado, implica um aumento de
0,765 ponto na taxa de coordenação (sem significância estatística), efeito bem
menor que aquele que se verifica quando o partido integra formalmente a base de
apoio ao governo, que é de 4,543 pontos. Assim, a terceira hipótese encontra
muito mais sustentação nos dados que a segunda: integrar a base governista
motiva mais as lideranças a coordenarem a atuação das bancadas que ser
centralizado. A capacidade explicativa do terceiro modelo é a mesma do quarto:
15% da variação da taxa de coordenação, com significância estatística em torno
de 1%. No quarto modelo, a variável eficiênciaé substituída por governos
Fernando Henrique, o que não altera os coeficientes das variáveis tipo de
partidoe posição diante do governo, mas contribui para especificar melhor a
evolução da coordenação entre os governos: nos governos Fernando Henrique, a
coordenação é 4,868 pontos a mais que nos governos Collor/Itamar; no governo
Lula, 10,596 pontos a mais que nos anteriores.
De forma sucinta, os resultados mostram que: 1) não há diferença
estatisticamente significativa entre a coordenação exercida pelos líderes dos
partidos centralizados e descentralizados; 2) todos os partidos - centralizados
e descentralizados - coordenam muito mais o comportamento das bancadas quando
integram a base do governo; 3) a coordenação nas votações nominais tem crescido
significativamente ao longo do período. Assim, eles indicam, sobretudo, a
crescente força dos incentivos (negativos ou positivos) fornecidos pelos
governos aos partidos de sua base de apoio na Câmara dos Deputados.
Para o Senado, esse teste não pode ser realizado em virtude da não
disponibilidade dos dados do período de 1991 a 1998; para o período de 1999 a
2007, pelo baixo número de encaminhamentos das lideranças dos partidos
descentralizados14.
O segundo conjunto de hipóteses está relacionado com o grau de coerência que os
partidos mantêm entre posicionamento eleitoral e posicionamento parlamentar. A
expectativa é de que os partidos centralizados, por possuírem um horizonte
político mais amplo, vinculem, de forma mais consistente que os
descentralizados, o resultado das urnas a seu comportamento diante dos
governos. As hipóteses específicas são testadas pela apresentação abaixo, em
gráficos, da taxa de convergência entre os encaminhamentos do líder do governo
e os dos líderes dos partidos centralizados, por subtipo, e descentralizados.
Primeira hipótese. Nas eleições eficientes, os partidos de vocação presidencial
e seus coadjuvantes posicionam-se, na Câmara, de forma mais consistente na
oposição ao governo quando perdem as eleições e oapoiam, também de forma mais
consistente, quando o elegem (Gráfico_1).
A hipótese não é completamente comprovada no período com eleição não eficiente.
Nas coalizões Collor 2 e Collor 3, apenas o PSDB se posiciona de forma ambígua;
nas coalizões do governo Itamar, todos os partidos se posicionam de forma
ambígua, com exceção do PSDB. No período com eleições eficientes, o resultado
mostra-se conforme esperado: de 1995 a 2003, PT e seus coadjuvantes ficam na
oposição ao governo eleito pelo PSDB e pelo PFL, exceto na última coalizão de
Fernando Henrique II, quando o PT apresenta convergência com o líder do governo
em 50% das votações. De 2003 a 2007, esses competidores trocam de lugar: PT e
seus coadjuvantes passam a apoiar o governo que elegeram; PSDB e PFL passam
para a oposição clara. Apenas em 2005, na coalizão Lula 3-4, esses dois
partidos e o PC do B diminuem um pouco sua coerência, aumentando-a logo em
seguida.
Segunda hipótese. No período com eleições eficientes, os partidos de pretensão
presidencial são mais coerentes com seu posicionamento eleitoral que no período
com eleição não eficiente (Gráfico_2).
Dado que PDT e PPS não elegeram seus candidatos presidenciais, seu
comportamento em relação ao governo, nos dois períodos (eficiente e não
eficiente), deve ser analisado considerando-se seu alinhamento nas eleições. A
hipótese de menor coerência no período, com eleição não eficiente, não encontra
sustentação nos dados: os dois partidos fizeram oposição consistente ao governo
a que se opuseram na arena eleitoral. Essa mesma coerência é constatada no
período com eleições eficientes, conforme esperado: sendo partidos de esquerda
e não se tendo alinhado ao PSDB em 1994 e em 1998, ambos se posicionam
claramente na oposição (convergência menor que 40%). Essa estratégia mostra
capacidade de sobrevivência política independentemente dos recursos que podem
ser auferidos quando se integra a base governista e, assim, esforço em manter a
consistência eleitoral da legenda. A mesma coerência é apresentada no governo
de centro-esquerda de Lula. Embora tenham inicialmente integrado sua base de
sustentação, apoiando-o consistentemente nas duas primeiras coalizões, ambos
diminuem bastante o apoio, a partir de 2004, e se desligam do governo, no
início de 2005, quando entendem que o alinhamento poderia prejudicar o valor
eleitoral da legenda.
Terceira hipótese. Os partidos descentralizados apresentam, na Câmara,
comportamento menos autônomo em relação ao governo que os centralizados,
independentemente da natureza das eleições e de seu alinhamento eleitoral
(Gráfico_3).
Conforme esperado, diferentemente dos partidos centralizados, a tendência entre
os descentralizados é de alinhamento ao governo, independentemente de
integrarem formalmente sua base de apoio, da ideologia e da natureza das
eleições. Apenas o PDS-PP, até Fernando Henrique I, e o PL, na segunda coalizão
de Fernando Henrique I e na primeira de Fernando Henrique II, marcaram posição
mais clara na oposição (convergência menor que 40%). Todos os outros partidos,
em todas as outras coalizões, apresentam taxas de convergência maiores que 50%.
O teste dessas hipóteses também fica prejudicado no Senado Federal. No Gráfico
4, em caráter apenas ilustrativo, apresento as taxas de convergência entre os
encaminhamentos dos líderes dos governos e os dos partidos que encaminharam
frequentemente a votação nas coalizões de Fernando Henrique II e Lula.
Como pode ser visto, no Senado Federal, PSDB, PT, PFL e PMDB apresentam padrões
de comportamento bastante semelhantes aos verificados na Câmara dos Deputados.
PFL e PSDB transformam o apoio convicto oferecido ao governo Fernando Henrique
em oposição ostensiva ao governo Lula, sendo que o último, no entanto, diminui
a oposição em 2005; PT passa da oposição ao segundo governo Fernando Henrique,
no qual a convergência máxima com o governo foi em 45% das votações da segunda
coalizão, para o apoio sem reservas ao governo Lula; PMDB aparece sempre
apoiando os governos, independentemente de estar formalmente integrado à base
governista e de seu alinhamento nas eleições.
Assim, o tipo de participação dos partidos nas eleições presidenciais e o
resultado das urnas se mostram como critérios pertinentes para a previsão do
comportamento de seus líderes, em relação ao governo, na arena parlamentar.
Embora a diferença entre os períodos não seja a esperada, os dados indicam que
os partidos que participam reiteradamente das eleições presidenciais - os
centralizados - mantêm significativa consistência em seu posicionamento
ideológico e maior coerência, quando comparados aos descentralizados, entre o
resultado das urnas e seu posicionamento diante do governo. Esse comportamento
mostra maior independência em relação aos recursos que podem ser auferidos
quando se integra a base governista, indicando que o interesse em manter a
consistência nacional da legenda partidária orienta predominantemente suas
estratégias.
A Influência da Dinâmica Eleitoral sobre o Comportamento das Bancadas
Na avaliação do comportamento das bancadas nas votações nominais, espera-se que
os incentivos derivados da dinâmica eleitoral influenciem sua disposição15 em
face dos recursos fornecidos pelo Poder Executivo e pelas lideranças
parlamentares, que personificam os interesses do partido na Câmara e no Senado
e, consequentemente, sua disciplina.
Para o teste, utilizo também a regressão MQO. Avariável dependente é
índice de fidelidade partidária
16. Os partidos analisados são: PT, PC do B, PSB, PDT, PPS, PSDB, PMDB, PL,
PTB, PDS-PP e PFL. Os dados das votações nominais da Câmara estão distribuídos
em treze coalizões de governo do período de 1991 a 200717. As hipóteses
estatísticas são: 1) nas coalizões do período com eleições eficientes, os
partidos são mais disciplinados que nas do período não eficiente; 2) os
partidos centralizados são mais disciplinados que os descentralizados; 3) os
partidos centralizados são mais disciplinados que os descentralizados quando
integram a base governista que quando não integram.
Argumentei que os partidos centralizados são aqueles que, por sua participação
reiterada e consistente nas disputas presidenciais, se esforçam por coordenar,
na arena congressual, os interesses de suas bases eleitorais em torno da
proposta que apresentam ou apoiam na disputa presidencial, e que esse
comportamento denota centralização em torno de políticas e visa à maximização
do valor eleitoral da legenda partidária. O suposto é que esses partidos sejam,
portanto, politicamente mais coesos e que essa coesão seja revelada, até mesmo,
por uma maior disciplina parlamentar.
Com o objetivo de verificar se essa coesão política não é influenciada por uma
variável que antecede a própria inserção dos partidos na arena eleitoral, qual
seja, uma coesão fundamentada em incentivos de identidade, estimulada pelo tipo
de organização partidária, nos termos sugeridos por Panebianco (1990) e Sartori
(1994), utilizo o percentual de membros do partido com tempo de filiação
superior a oito anos como indicador de coesão organizacional. O procedimento
parece pertinente, pois a coesão organizacional resulta do compartilhamento de
valores, da adesão dos membros ao programa ou a causas do partido que,
supostamente, varia com o tempo de convivência18. A partir disso, acrescento
mais duas hipóteses às enunciadas anteriormente: 4) quanto maior o percentual
de membros com tempo de filiação superior a oito anos no partido, maior a
disciplina; 5) o efeito da coesão política sobre a disciplina é independente do
efeito da coesão organizacional.
As variáveis independentes são: 1) eficiência eleitoral: dummyque distingue as
coalizões do período com eleições eficientes das do período com eleição não
eficiente (categoria de referência: não eficiência); 2) tipo de partido:
dummyque distingue partido centralizado de partido descentralizado (referência:
descentralizado); 3) posição diante do governo: dummyque distingue a posição do
partido diante do governo (referência: não integrado à base governista); 4)
tipo*posição: variável que objetiva captar o efeito de interação entre ser
centralizado e estar formalmente integrado à base governista; 5) governo Lula:
dummyque tem por objetivo distinguir diferenças entre os governos (referência:
governos Fernando Henrique e governos Collor e Itamar). O controle das
diferenças entre os governos Itamar e Collor, por um lado, e os governos de
Fernando Henrique e de Lula, por outro, ocorre pela variável eficiência.
Buscando controlar variações apenas entre os governos, testo, por fim, a
substituição da variável eficiênciapor uma dummypara os governos Fernando
Henrique; 6) Membros com filiação = oito anos: percentual de membros com tempo
de filiação igual ou maior a oito anos (Tabela_9).
A hipótese de que os partidos são mais disciplinados no período com eleições
eficientes que no período anterior é refutada no primeiro modelo. O efeito
agregado das variáveis eficiência eleitorale governo Lulaexplica menos de 2% da
variação do índice de fidelidade entre os partidos, sem significância
estatística. A refutação dessa hipótese mostra que aquilo que pode ser
corriqueiro e até banal nos sistemas eficientes parlamentaristas ou
presidencialistas com reduzido número de partidos não é válido para o sistema
brasileiro, independentemente de outras especificações.
No segundo modelo, em que se introduz a primeira e principal especificação, a
variável tipo de partido, logra-se explicar 20% da variação no índice de
fidelidade, com significância estatística em torno de 1%. Ser partido
centralizado, tendo-se por referência ser descentralizado, implica um aumento
no índice de 5,853 pontos. Corrobora-se, portanto, a segunda hipótese. Os
coeficientes das variáveis eficiênciae governo Lulapermanecem com sinal
contrário ao esperado e sem significância estatística: no período com eleições
eficientes, os partidos apresentam menor disciplina (-0,490 pontos) que no
período não eficiente e, no governo Lula, diminuem ainda mais o índice (-
1,468).
No terceiro modelo, em que se introduz a variável posição diante do governo, o
efeito da variável tipo de partidocresce: ser centralizado implica um aumento
de 6,015 pontos no índice de fidelidade, e estar formalmente integrado à base
do governo implica um aumento de 0,550 ponto (sem significância estatística).
As variáveis eficiênciae governo Lulatambém têm seu efeito aumentado,
continuando com o sinal inverso ao esperado e sem significância estatística: os
partidos no período com eleições eficientes e, dentro desse período, no governo
Lula, têm seu índice diminuído em 0,548 e 1,568 ponto, respectivamente. Esse
modelo apresenta praticamente a mesma capacidade explicativa do anterior (20%)
e é estatisticamente significativo também em torno de 1%.
No quarto modelo, em que é inserida a variável tipo*posição, logra-se explicar
em torno de 25% da variação. No período com eleições eficientes, os partidos
são menos disciplinados em 1,197 ponto (sem significância estatística) em
relação ao período com eleição não eficiente. A queda no índice aumenta para
1,648 ponto (também sem significância estatística), quando os partidos estão
formalmente integrados à base, e para 2,173 pontos no governo Lula, tendo-se
por referência os governos Collor/Itamar e Fernando Henrique. O efeito da
variável tipo de partidopermanece positivo e de considerável magnitude: os
partidos centralizados são mais disciplinados que os descentralizados em 4,032
pontos. O coeficiente da variável tipo*posiçãomostra que esses partidos
aumentam sua disciplina especialmente quando estão formalmente integrados à
base do governo: o índice aumenta 5,527 pontos.
No modelo 5, em que se inclui a variável relacionada ao tempo de filiação,
explica-se 28,4% da variação (nível de significância de 1%). Em relação ao
modelo anterior, há alterações na magnitude dos coeficientes: no período com
eleições eficientes, os partidos são menos disciplinados em 1,714 ponto e,
quando integram formalmente a base governista, sua disciplina diminui em 0,880
ponto (ambos os coeficientes sem significância estatística); a queda é
especialmente grande no governo Lula, quando o índice diminui em 2,153 pontos.
Os coeficientes das variáveis tipo de partidoe tipo*posiçãopermanecem altos e
positivos: ser centralizado implica um aumento no índice de 3,847; ser
centralizado e integrar formalmente a base governista, um aumento de 4,737
pontos. Por fim, o coeficiente da variável que mede o efeito do percentual de
membros do partido com tempo de filiação igual ou superior a oito anos indica
um efeito também considerável: a cada 10% de aumento no tamanho desse grupo
dentro do partido, seu índice fica acrescido em 0,420 ponto. Isso significa que
um partido, em que todos os membros possuem oito ou mais anos de filiação, terá
seu índice acrescido em 4,200 pontos. Comprova-se, assim, a quarta hipótese: a
coesão organizacional influencia positivamente a disciplina parlamentar. A
manutenção da significância estatística e da considerável magnitude dos
coeficientes das variáveis tipo de partidoe tipo*posição, nesse modelo,
corrobora também a quinta hipótese: a coesão política influencia a disciplina
partidária independentemente da coesão organizacional.
No modelo 6, a variável eficiênciaé substituída por governos Fernando Henrique.
O procedimento não altera a magnitude e a significância estatística dos
coeficientes das outras variáveis, mas especifica melhor a evolução da
disciplina no período. Os partidos nos governos Fernando Henrique, tendo-se por
referência os anteriores, têm seu índice diminuído em 1,714 pontos (ainda sem
significância estatística); no governo Lula, a queda é de 3,867 pontos. Esse
modelo possui significância estatística em torno de 1% e sua capacidade para
explicar a variação do índice de fidelidade partidária é de 28,4%.
Para o Senado, os dados disponíveis referem-se ao período de 1999 a 2007, o que
impossibilita o teste da hipótese relacionada à eficiência. Infelizmente, os
dados sobre o tempo de filiação dos senadores também não estão disponíveis. Na
Tabela_10, apresento os coeficientes encontrados no teste de duas hipóteses: 1)
os partidos centralizados são mais disciplinados que os descentralizados; 2) os
partidos são mais disciplinados quando integram a base governista que quando
não integram.
No Senado, os resultados encontrados indicam baixo efeito das variáveis
selecionadas sobre a variação do índice. O último modelo explica apenas 8,4% da
variação e não é estatisticamente significativo. De qualquer forma, é possível
verificar que os partidos formalmente integrados à base são 4,896 pontos mais
disciplinados que os não integrados e que ser centralizado implica um aumento
no índice de 2,141 pontos (sem significância estatística). Os partidos no
Senado são também menos disciplinados no governo Lula que no governo anterior:
a diferença é de 2,381 pontos, também sem significância estatística.
CONCLUSÃO
O objetivo da discussão desenvolvida neste artigo foi explicar, a partir de
fatores relacionados à dinâmica da arena eleitoral, a variação no comportamento
dos partidos na arena parlamentar. Pela análise da votação e das coligações
realizadas nas eleições presidenciais e congressuais, verificou-se que as
primeiras tornaram-se eficientes, a partir de 1994, e passaram a influenciar o
desempenho e as estratégias coligacionistas dos partidos nas disputas
congressuais, especificamente daqueles que apresentaram candidatos
presidenciais de forma reiterada ou apoiaram candidatos de outros partidos de
forma consistente.
Com base nesses achados, argumentei que o tipo de posicionamento dos partidos
nas eleições presidenciais influencia seu comportamento parlamentar: os
participantes reiterados e consistentes - denominados centralizados -
comportam-se de forma mais coordenada, a fim de manter ou aumentar a
consistência nacional da legenda partidária, dada a influência da eficiência
sobre seu desempenho eleitoral congressual, e como resultado da coesão
política, estimulada pela própria participação nas disputas presidenciais; esse
interesse e o esforço de coordenação da ação parlamentar não foram esperados
dos participantes eventuais, denominados, por isso, descentralizados. As
evidências de que o posicionamento dos partidos nas eleições presidenciais
influencia sua atuação parlamentar foram buscadas no comportamento das
lideranças e das bancadas partidárias nas votações nominais.
Os testes que trataram do comportamento dos líderes, na Câmara, mostraram que:
1) eles coordenam mais o comportamento das bancadas no período com eleições
eficientes que o fizeram no período anterior, especialmente quando integram a
base governista; 2) as lideranças dos partidos centralizados, no período com
eleições eficientes, mantêm maior coerência que as dos centralizados entre o
resultado das eleições ou sua posição ideológica e seu posicionamento diante do
governo, responsabilizando-se por seus projetos ou opondo-se a eles mais
consistentemente. Desses achados, pode-se concluir, em primeiro lugar, que o
crescente esforço de coordenação por parte das lideranças (dos partidos
centralizados e descentralizados) foi estimulado pela polarização que se
instalou no sistema, o que é claramente resultado da eficiência, mas é preciso
salientar que os estímulos variam de acordo com a posição política. Para os
partidos que fazem oposição ao governo, que são normalmente, como visto, apenas
os centralizados, esse esforço está relacionado com o interesse em imprimir
visibilidade à atuaçãodopartido,marcandoassimposição juntoaoeleitorado. Para os
partidos da base governista, por outro lado, o esforço de coordenação pode ser
atribuído também aos incentivos seletivos (negativos e positivos) que eles
recebem do governo; por exemplo, a possibilidade de execução de emendas
orçamentárias e de acesso a recursos extraorçamentários ou a cargos públicos.
Como os dois tipos de partido coordenam mais o comportamento das bancadas
quando integram a base governista, pode-se inferir que, no caso dos partidos
centralizados, esses incentivos se acumulam com os estímulos que advêm da arena
eleitoral; no caso dos descentralizados, os incentivos do governo são, da
perspectiva aqui adotada, os principais.
Na investigação do comportamento das bancadas, foi evidenciado que: 1) integrar
a base governista influencia a disciplina parlamentar de forma negativa, embora
estatisticamente não significativa. No entanto, controlada a disciplina pelo
tipo de partido, verifica-se, de forma estatisticamente significativa, que 2)
as bancadas dos partidos centralizados são mais disciplinadas que as dos
descentralizados e, quando integram a base governista, sua disciplina aumenta
ainda mais; 3) a coesão que se forja no âmbito organizacional influencia
positivamente a disciplina, mas de forma independente da coesão política,
construída na dinâmica das eleições; 4) os partidos diminuíram sua disciplina
ao longo dos governos analisados.
A queda na disciplina partidária ao longo do período, que contrariou a
expectativa de que a eficiência eleitoral a influenciasse positivamente, e o
fato de a participação na base governista também não influenciá-la
significativamente, e muito menos de forma positiva, devem ser analisados em
conjunto com o aumento da coordenação exercida pelas lideranças ao longo do
período. Ao coordenarem mais o comportamento das bancadas, os líderes passaram
a exigir dos parlamentares um posicionamento explícito em votações
conflituosas, inclusive em períodos de crise política, como a que marcou o
primeiro governo Lula. Essa maior exigência acabou acarretando a diminuição da
disciplina de todos os partidos, independentemente de seu tipo (centralizado ou
descentralizado) e de seu posicionamento em relação ao governo. No entanto, é
importante ressaltar que, apesar dos desafios que essa exigência impõe aos
parlamentares, as bancadas dos partidos centralizados mostraram maior
disciplina que as dos descentralizados, especialmente apoiando os governos que
elegeram e, assim, assumindo os ônus e os bônus de seu desempenho perante o
eleitorado.
Esses achados mostram a complexidade da dinâmica eleitoral brasileira e,
consequentemente, dos incentivos sobre o sistema partidário. Em primeiro lugar,
o argumento de que os partidos são organizações débeis, pouco
institucionalizadas e nacionalizadas, porque descentralizadas e pouco coesas,
não mais se sustenta sem qualificações. Os partidos que participam de forma
reiterada e consistente das eleições presidenciais - PT, PSDB, PFL, PSB, PDT,
PPS e PC do B - apresentam estratégias que denotam significativa coordenação da
ação política quando comparados àqueles que participam delas apenas
eventualmente. Assim, os aspectos partidários do comportamento parlamentar não
devem ser atribuídos exclusivamente, ou mesmo principalmente, à centralização
do processo decisório: da dinâmica das eleições, assim como da arena
organizacional, também emergem incentivos no sentido do partidarismo; um
partidarismo que, aliás, se firma de forma independente dos recursos que podem
ser auferidos do alinhamento aos governos.Em segundo lugar, a pesquisa mostra
que a influência das eleições presidenciais sobre a configuração do sistema de
partidos nãose faz em detrimento da influência do federalismo, possibilitada
pelo desenho do sistema eleitoral, o que explica a força eleitoral e o
comportamento de partidos como PMDB, PTB, PL e PDS-PP.
NOTAS
1. Em Venezuela, Filipinas, República Dominicana, Nicarágua, Brasil (1945-1964)
e Colômbia (1930, 1942-1946, 1974-1990), de acordo com Shugart e Carey (1992),
a média do primeiro colocado é de 49,7%; a do segundo, 34,9%. Nos sistemas que
exigem segundo turno - Brasil e Chile (1989), Equador (1978-1988), França
(1965-1988), Peru (1980-1990), Polônia (1990) -, a média de votos do primeiro
colocado é de 39,5%; a do segundo, 25,1%.
2. No Chile, o Ne para Presidência é 4,0 em 1958; para a assembleia, em 1961,
6,4. Nos sistemas que não possuem segundo turno - Venezuela, República
Dominicana, Nicarágua, Costa Rica, Brasil (1945-1960) -, a média de candidatos
presidenciais efetivos é de 2,5; o Ne na eleição para a assembleia é 3,1. Nos
sistemas que exigem o segundo turno - Chile (1989), Equador, Peru, Brasil
(1989-1990), França e Portugal -, o número de candidatos presidenciais efetivos
é 4,1; o Ne para a assembleia, 5,8 (Shugart e Carey, 1992:180 e 220).
3. O PCB, que disputou as eleições presidenciais e congressuais de 1989 e 1990,
era uma das divisões do PCB, criado em 1922. Em 1994, esse partido disputa as
eleições legislativas sob a denominação PPS. Surge, nessa ocasião, outro PCB,
registrado no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com outro número.
4. A legenda remonta à Arena (Aliança Renovadora Nacional). Em 1982, esse
partido disputa as eleições sob a denominação PDS. Em 1993, o PDS incorpora o
PDC e altera seu nome para PPR, que disputa as eleições em 1994. Em 1995, o PPR
funde-se ao PP, dando origem ao PPB, que disputa as eleições de 1998 e 2002. Em
2003, o PPB muda sua designação para PP (Figueiredo e Limongi, 1999; Melo,
2006).
5. Alemán e Saiegh (2007) discutem a polarização que ocorre nas eleições
executivas e legislativas do Chile. Diferentemente da polarização brasileira, a
chilena ocorre pela agregação de todos os partidos em duas coalizões: a
Concertación por la Democracia e a Alianza por Chile. Os autores explicam essa
polarização pelos incentivos à coalescência oriundos da legislação que regula
as eleições legislativas e pelo realinhamento do conflito social.
6. É interessante notar que há, na literatura, duas expectativas normativamente
contraditórias relativas à volatilidade. Tendo em vista a accountability,
conforme os autores citados, o ideal é a volatilidade alta. Quando o foco se
desloca para a avaliação da estabilidade dos vínculos entre partidos e
eleitores, do grau de enraizamento social dos partidos ou da estabilidade do
sistema, a volatilidade baixa se torna o ideal, como mostram os estudos de
Mainwaring.
7. A correlação entre a votação obtida pelos partidos nas disputas executivas e
congressuais não autoriza a inferência de que o eleitor vinculou seu voto.
Evidência nessa direção seria fornecida por pesquisas com o próprio eleitor,
como em Carreirão e Kinzo (2004), Rennó (2006). No entanto, é plausível esperar
que essa correlação aumente a probabilidade de que a vinculação tenha ocorrido.
8. A emenda foi aprovada em 8/3/2006. Em sua redação original, previa-se, no 2º
parágrafo, a aplicação da regra "às eleições que ocorrerão em 2002". O Conselho
Federal da Ordem dos Advogados do Brasil apresentou ao Supremo Tribunal Federal
uma ação direta de inconstitucionalidade (nº 3.685-3) referida a esse
parágrafo, alegando a violação do princípio da anterioridade da lei eleitoral e
das garantias individuais da segurança jurídica e do devido processo legal. Ao
afirmarem a procedência da ação de inconstitucionalidade em 22/3/2006, os
ministros ressaltaram ainda a impossibilidade empírica de se aplicar a regra às
eleições de 2002.
9. Para a Câmara, o PC do B se alia ao PSDB em seis, dois e dois estados em
1990, 1994 e 1998, respectivamente; o número de alianças do PSB com o PSDB,
nessas eleições, é de três, seis e seis.
10. A Tabela_1, no Apêndice, traz o número de votações por coalizão (Câmara e
Senado); o Quadro_1, os dados das coalizões. Na seleção das votações, utilizei
os critérios de Figueiredo e Limongi (1999): excluí as votações unânimes e não
válidas. Na verdade, houve quatorze coalizões no período analisado, mas, como
nas coalizões 3 e 4 do governo Lula, houve apenas três votações válidas e não
unânimes, com encaminhamento do líder no Senado, tratei-as conjuntamente nos
diversos testes. A diferença entre elas é a presença, na primeira, do PV. Por
fim, importa esclarecer que, na medida em que suponho relação entre o resultado
das urnas e o comportamento parlamentar, não foram incluídas, em nenhum dos
testes, as votações da coalizão Collor 1, de 1990, realizadas pela
representação eleita em 1986.
11. Embora os partidos centralizados tenham sido classificados em três
subtipos, o que permite supor comportamentos diferentes também entre eles,
tratá-los separadamente na regressão implicaria a inclusão de mais duas
dummies, o que prejudica os resultados em uma amostra tão pequena.
12. Como se trata de uma série temporal, as variáveis eficiênciae
governosimpedem também que os efeitos verificados em um período enviesem os
resultados dos períodos seguintes.
13. Testei a substituição da variável eficiênciapelo percentual de votação
alcançado pelas coligações presidenciais efetivas. Tendo alcançado o mesmo
resultado, escolhi manter a dummy.
14. No Senado, há um menor número de votações no plenário e maior unanimidade,
como pode ser visto na Tabela_1, no Apêndice. As votações não unânimes na
Câmara atingem um percentual de 69,8% do total; no Senado, 54,2%. Além disso,
cabe salientar que, quando o partido integra um bloco, os líderes de partido
podem encaminhar junto com o líder do bloco (na mesma direção ou em direção
diversa) ou se omitir, supostamente aceitando a orientação dada pelo líder do
bloco. Como o objetivo, nesta seção, é investigar o posicionamento dos
partidos, não computei as votações em que o líder do partido não se manifestou.
Com isso, a amostra ficou restrita a trinta partidos no período de 1999 a 2007.
Entre os descentralizados, apenas o PMDB possui dados para as seis coalizões do
período.
15. Disposição, de acordo com Rosemberg (1968:32), "refere-se não a uma
condição ou estado do indivíduo, mas a uma tendência de reagir de certa
maneira, em determinadas circunstâncias".
16. O índice é construído da seguinte maneira: 1) calcula-se, para cada
votação, o percentual de parlamentares do partido que votam conforme
encaminhado pelo líder, tendo-se por referência o total de parlamentares do
partido presentes na votação; 2) calcula-se a média dos percentuais, de cada
partido, no período de vigência da coalizão. As Tabelas_2 e 3, no Apêndice,
trazem o índice de fidelidade dos partidos na Câmara e no Senado,
respectivamente.
17. Os encaminhamentos considerados foram: aprovação, rejeição, obstrução e
abstenção. Para o cálculo, foram considerados, nas duas Casas, os
encaminhamentos do líder do bloco quando o líder do partido se omitiu. A
inclusão do encaminhamento do líder do bloco e o de abstenção, não utilizados
no cálculo da taxa de coordenação, justifica-se pelo fato de que, nesta seção,
o foco está sobre o comportamento do parlamentar, e não na visibilidade que a
votação oferece ao partido.
18. No tratamento desse dado, procedi assim: 1) computei o tempo de filiação
dos membros dos onze partidos considerando a configuração das bancadas no
início de cada uma das treze coalizões; 2) classifiquei os membros em: filiado
há menos de oito anos, com oito anos ou mais; 3) calculei o percentual de cada
grupo tendo por referência o total de membros do partido.