Contribuição para o estudo da leitura de folhetos informativos nas farmácias
Portuguesas
Introdução
O arsenal terapêutico é considerado um dos recursos mais valiosos nos cuidados
de saúde, e os medicamentos a ferramenta mais comum, em uso hospitalar ou
ambulatório. Nas farmácias comunitárias, todos os medicamentos são obrigados a
apresentar um acondicionamento secundário rotulado e, no interior dessa
embalagem, uma bula. Esta última contém um conjunto de informações que devem
ser compreensíveis para o doente, permitindo o uso dos medicamentos de forma
adequada e segura 1. A forma legível, clara e compreensível da informação
escrita, incluindo a sua facilidade de utilização, devem estar demonstradas
através de provas de legibilidade ou 'lecturabilidade'. Os resultados dessas
provas, que envolvem doentes-alvo, são presentes ao INFARMED I.P. no momento da
autorização para a introdução no mercado, evidenciando a importância que as
autoridades de saúde dão à qualidade da informação escrita sobre medicamentos
de uso ambulatório 2.
Para além da informação incluída na embalagem dos medicamentos, os doentes
procuram informação escrita sobre saúde e terapêutica em diferentes fontes.
Actualmente, milhões de pessoas procuram informações médicasonline, as quais na
maioria dos casos são textos demasiado complexos para serem assimilados pelos
seus leitores, para além dos problemas na fiabilidade da informação. Em geral,
a dificuldade advém da gramática utilizada e da escolha das palavras empregues,
bem como do facto dos tópicos serem de difícil elucidação 3.
Uma outra fonte de informação escrita sobre saúde e terapêutica, frequente nos
vários serviços de cuidados de saúde, são os folhetos informativos. São
ferramentas que conferem autonomia ao doente, em função das competências
individuais. São diversos os temas abordados nestes folhetos, apresentados de
forma a interessar os utentes em geral e esclarecendo problemas e dúvidas de
saúde 4. Na farmácia comunitária existe uma ampla oferta de folhetos
informativos, desde panfletos de divulgação de marcas e produtos (como por
exemplo, na cosmética e dermofarmácia), até aos folhetos institucionais (como
por exemplo, os folhetos produzidos pela Direcção Geral de Saúde, D.G.S.) e
profissionais (como por exemplo, os folhetos iSaúde da Associação Nacional das
Farmácias, A.N.F.). Segundo alguns autores, os folhetos são a fonte de
informação mais eficiente, fiável, económica e prontamente disponível para o
utente, servindo de complemento à informação que é habitualmente fornecida
pelos profissionais de saúde. No caso das farmácias, para os folhetos
informativos aí distribuídos não é conhecida a sua facilidade de leitura e
compreensão, assim como a correspondência às expectativas da maioria dos
utentes 4.
Literacia, legibilidade e 'lecturabilidade'
A saúde, e em especial a sua promoção, encontram-se intimamente relacionadas
com o grau de escolaridade ou literacia dos indivíduos. Uma das definições de
literacia refere que esta é a capacidade de cada indivíduo compreender e usar a
informação escrita contida em vários materiais impressos, de modo a atingir os
seus objectivos, a desenvolver os seus próprios conhecimentos e
potencialidades, e a participar activamente na vida quotidiana 5,6. Embora não
seja possível estabelecer uma correspondência simples e absoluta entre os
níveis de instrução formal de uma população e o seu perfil de literacia, a
escolaridade é um indicador robusto dessa capacidade de utilizar a informação
escrita 6. Por outro lado, a literacia em saúde pode ser definida como a
capacidade individual em obter, processar e interpretar informação básica em
saúde e serviços de saúde, tendo por finalidade um adequado processo de tomada
de decisão em saúde, incluindo a 'navegação' no sistema de saúde 7. A atenção
crescente que a literacia em saúde tem tido nos últimos anos é, em parte,
atribuída ao crescimento exponencial da quantidade de informação disponível 5.
Dois aspectos centrais em literacia são os conceitos de legibilidade
(oulegibility) e de 'lecturabilidade' (uma tradução possível parareadability).
A legibilidade relaciona-se com a percepção visual, enquanto a
'lecturabilidade' diz respeito à compreensão intelectual do texto 8.
Autores como Gerrit Willem Ovink definiram legibilidade como "a facilidade e
precisão com a qual o leitor percebe os textos impressos" 8. A leitura
eficiente de uma página impressa requer que o leitor converta, o mais rápido
possível, símbolos tipográficos ou caracteres, em palavras. A legibilidade
corresponde à facilidade em desempenhar esta descodificação 9. Trata-se,
portanto, da capacidade de distinção das formas canónicas, o que entendemos ser
uma letra, distinguindo umas letras das outras e a sua forma do fundo. É uma
propriedade intrínseca da letra, que lhe permite ser percebida como a letra que
é, não bastando somente descodificar, sendo preciso que o leitor a
contextualize na sua leitura 10.
Quando se fala de 'lecturabilidade' (ou 'apreensibilidade') não existe uma
definição consensualmente precisa. É muitas vezes definida como a capacidade
que um texto tem de suscitar apetência para ser lido, de atrair o leitor, mas
acima de tudo de facilitar a compreensão do seu conteúdo. A legibilidade e a
'lecturabilidade' não são a mesma coisa, sendo certo que a legibilidade
influencia a 'lecturabilidade', e vice-versa. Embora diferentes documentos
possam apresentar diferentes graus de legibilidade, todos eles devem ser de
fácil compreensão textual. Na verdade, poderemos ter um documento totalmente
legível e este não ser de fácil compreensão, i.e. apresentar uma baixa
'lecturabilidade'. Deste modo, o termo 'lecturabilidade' engloba todos os
factores que afectam o sucesso na leitura e compreensão de um texto,
nomeadamente 4:
O interesse e motivação do leitor;
Os aspectos relacionados com a impressão e ilustrações;
A relação entre a complexidade das palavras e frases utilizadas e a
capacidade de leitura do receptor.
Os 3 factores anteriores podem ser avaliados por diferentes métodos, desde a
entrevista ao leitor à análise gráfica do design da informação escrita. No
presente trabalho, foi avaliado o 3º factor, i.e. a complexidade das palavras e
da construção frásica, através de fórmulas matemáticas específicas. Estas
indicam a relação entre a complexidade das palavras e frases, e a capacidade de
leitura do receptor, presentes na informação escrita. Neste estudo foram
avaliadas peças de informação escrita disponíveis nas farmácias Portuguesas, em
particular os folhetos informativos iSaúde.
A avaliação completa da 'lecturabilidade' dos folhetos informativos iSaúde
deveria incluir a apreciação de aspectos como por exemplo o design gráfico e as
características intrínsecas aos utentes das farmácias Portuguesas, como por
exemplo a capacidade de leitura do receptor. Pode-se avaliar a capacidade de
leitura do receptor através de testes também utilizados na medição da literacia
em saúde. Dois exemplos são o REALM (Rapid Estimation of Adult Literacy in
Medicine) e o TOFHLA (Test Of Functional Health Literacy in Adults). O primeiro
baseia-se na capacidade de reconhecimento de palavras como instrumento de
competências de leitura, enquanto o segundo na alfabetização através da leitura
de passagens onde há um espaço para inserir a palavra mais correcta. Ambos os
métodos são executados por aplicação presencial numa amostra populacional 11.
Fórmulas de 'lecturabilidade'
Na década de 1920 foram propostas por autores como R. Flesch e H.G. McLaughlin
as primeiras fórmulas para classificar o nível de dificuldade de leitura e
compreensão de um texto, genericamente designadas por fórmulas de
'lecturabilidade' 12,13. Estas fórmulas correspondem a equações matemáticas que
melhor expressam a relação entre duas dimensões: uma relativa às dificuldades
sentidas pelos leitores de um texto e uma outra relativa às características
linguísticas desse texto. São, portanto, fórmulas usadas para prever a
dificuldade em ler textos com determinadas características linguísticas 14.
Uma das fórmulas mais populares, muito utilizada em mensagens e textos de
informação em saúde, é o SMOG (Simple Measure of Gobbledygook) 15. Esta
fórmula, proposta por Harry G. McLaughlin em 1969, estima os anos de
escolaridade no contexto educacional Norte-Americano necessários para
compreender completamente um excerto escrito 16. Realça a interacção entre o
texto e um grupo de leitores com características conhecidas, tais como a
competência de leitura, o conhecimento prévio e a motivação 13. A avaliação da
'lecturabilidade' pelo SMOG atribui um valor numérico (ou uma classificação) a
uma amostra de texto escrito. Tem sido muito utilizada pela sua fiabilidade e
facilidade de uso 15.
Uma outra fórmula de 'lecturabilidade' é o Índice Flesch-Kincaid. Foi
desenvolvido inicialmente por Rudolf Flesch em 1948 e readaptado pela Marinha
Americana por Kincaid. A fórmula Flesch-Kincaid utiliza a sintaxe, a contagem
de palavras e a extensão das mesmas para designar os níveis de leitura,
determinando o grau de escolaridade necessário para a compreensão de um texto
3,12,17.
Objectivos
O principal objectivo deste estudo foi a experimentação das ferramentas SMOG e
Índice Flesh-Kincaid para a análise da 'lecturabilidade' de folhetos de
informação iSaúde em utilização pelos utentes das farmácias Portuguesas.
Materiais e métodos
Este trabalho propõe a análise de uma amostra de conveniência de folhetos
informativos iSaúde, distribuídos gratuitamente aos utentes das farmácias
Portuguesas, pelas fórmulas de 'lecturabilidade' SMOG e Flesch-Kincaid. Foram
escolhidos estes folhetos técnico-profissionais dada a sua maior variedade e
elevada disponibilidade nas farmácias, comparativamente aos folhetos
institucionais, estes últimos passíveis de serem obtidos também noutros
serviços de saúde.
Estão disponíveis nas farmácias Portuguesas um total de 62 folhetos
informativos iSaúde, aos quais foram aplicados em simultâneo os seguintes
critérios de inclusão no estudo:
Folhetos com 30 ou mais frases (requisito para aplicação da fórmula SMOG);
Folhetos com 250 ou mais palavras (requisito para a aplicação fiável da
fórmula Flesch-Kincaid);
Folhetos cronologicamente recentes, com o máximo de 2 anos após a sua
concepção e produção;
Folhetos sobre condições prevalentes no panorama da saúde em ambulatório em
Portugal.
Os folhetos que respeitaram os critérios de inclusão foram 23. Estes foram
analisados no seu conteúdo e agrupados em 4 grandes grupos temáticos: nutrição
(4), higiene (6), prevenção (9) e geriatria (4). Foi aleatoriamente escolhido 1
folheto de cada um dos grupos, os quais se encontram na tabela 1.
Tabela 1
Folhetos informativos seleccionados (em Português)
As 2 fórmulas de 'lecturabilidade' utilizadas foram desenvolvidas e têm sido
aplicadas na língua inglesa. Estas fórmulas consideram a quantidade de palavras
e as suas respectivas sílabas, não estando demonstrada a sua validade para a
análise de textos escritos noutras línguas 18. Deste modo, foi realizada a
tradução dos 4 folhetos informativos do Português para Inglês, recorrendo a 2
tradutores técnicos independentes. Uma versão de consenso em Inglês foi obtida
para cada um dos folhetos informativos. Foi depois obtida uma retroversão do
Inglês para o Português por um 3º tradutor técnico, sendo confirmada a
justaposição dos textos traduzidos com os originais.
Para a utilização do SMOG é necessário seguir as seguintes regras de aplicação:
Contar 10 frases consecutivas próximas do início do texto, no meio e perto do
fim. São estas 30 frases que serão avaliadas. Contam como uma frase qualquer
sequência de palavras que termina com um ponto final, um ponto de interrogação
ou um ponto de exclamação. Caso se utilizem mais que 30 frases, deve ser
calculado o quociente indicado entre parêntesis na fórmula SMOG abaixo
apresentada;
Nas 30 frases seleccionadas contam-se todas as palavras com três ou mais
sílabas, i.e. qualquer sequência de letras em que se distingue pelo menos três
sílabas na sua leitura contextualizada em voz alta (polissílabos
oupolysyllables). As palavras polissilábicas repetidas são igualmente contadas;
Calcular a raiz quadrada do número de polissílabos, o que deve ser feito para
o quadrado perfeito mais próximo. Por exemplo, se a contagem de polissílabos é
igual a 95, deve ser usado o próximo quadrado perfeito, neste caso 100 (raiz
quadrada de 10). Se a contagem está entre dois quadrados perfeitos, deve
escolher-se o número mais baixo. Por exemplo, se a contagem é igual a 110,
utiliza-se a raiz quadrada de 100 e não a de 121;
Completar o cálculo através da fórmula que a seguir se apresenta.
Fórmula SMOG
O valor obtido de SMOG corresponde ao grau de escolaridade que um indivíduo
deve ter alcançado para compreender plenamente o texto avaliado 14.
Na tabela 2 são apresentados os valores de SMOG, a sua correspondência aos
níveis de escolaridade nos E.U.A., e a correspondência destes com os níveis de
escolaridade em Portugal, de acordo com o Portaria nº 699 de 12 de Julho de
2006.
Tabela 2
SMOG, níveis educacionais e exemplos de textos para cada score
Para aplicar o Índice Flesch-Kincaid é necessário:
Calcular a média do número de palavras usadas por frase;
Calcular o número médio de sílabas por palavra;
Multiplicar o número médio de palavras (CMS ou comprimento médio da frase)
por 0,39 e adicioná-lo ao número médio de sílabas por palavra (ou SPP)
multiplicado por 11,8;
Subtrair o resultado de 15,59.
Índice Flesch-Kincaid
Flesch-Kincaid = ([0,39 × CMS] + 11,8 × SPP]) - 15,59
O resultado estima o número de anos de estudo necessários para a adequada
compreensão do texto 17. Por exemplo, uma pontuação de 9,3 significa que um
aluno com nove anos de escolaridade nos E.U.A. seria capaz de ler o documento.
Teoricamente, a pontuação mais baixa seria -3,4. Contudo, este é um resultado
improvável uma vez que não existem passagens reais em que cada frase seja
constituída por uma única palavra com apenas uma sílaba. Os resultados
negativos são relatados como zero e os números superiores a 12 são relatados
como 12. Esta situação é a que se verifica nas estatísticas automáticas de
'lecturabilidade' possíveis de obter através do MS Word 9.
No presente estudo, para obter as contagens necessárias para a aplicação das
duas fórmulas foi utilizada uma página Web (http://www.wordcalc.com/), com a
qual se procedeu à contagem automática das sílabas e polissílabos. Foi feita
uma contagem manual de um parágrafo e confirmada a qualidade da contagem
automática, em Inglês. Foi decidido utilizar esta forma de contagem dado que se
trata de um processo complexo, porquanto a contagem manual pode conduzir a
erros resultantes em especial das variações linguísticas entre o Português e o
Inglês.
A aplicação de 2 métodos independentes para a avaliação da 'lecturabilidade'
permitiu ter uma estimativa da validade dos resultados através da sua
convergência, neste caso medida por um teste de correlação não-paramétrico (ró
de Sperman). Desta forma, estão melhor garantidas a validade e a fiabilidade
dos resultados do estudo.
Resultados
Os quatro folhetos seleccionados apresentaram os seguintes títulos em Inglês:
Image:
1. Food and comfort accessories - SAFE CHOICES FROM 0 TO 4 MONTHS;
2. Healthy mouth - AT ANY AGE;
3. Infants and children - SUNNY DAYS IN SAFETY;
4. Seniors and drugs - USE THEM SAFELY.
Na tabela 3 são apresentados as contagens iniciais necessárias para a aplicação
posterior das fórmulas SMOG e Flesch-Kincaid. Na tabela 4 são apresentados os
valores de 'lecturabilidade' obtidos através das 2 fórmulas. (fig. 1)
Tabela 3
Folhetos e respectivas estatísticas
Tabela 4
Scores finais de SMOG e Flesch-Kincaid, e sua correspondência ao grau de
escolaridade nos E.U.A. e em Portugal
Figura 1
Distribuição dos scores obtidos por folheto informativo utilizando as fórmulas
de lecturabilidade' em estudo
O folheto de mais fácil leitura e compreensão foi o número 2 (Boca Sã - EM
QUALQUER IDADE), sendo que o que se revelou de maior dificuldade de leitura e
compreensão foi o número 1 (Acessórios de Alimentação e Conforto - ESCOLHAS
SEGURAS DOS 0 AOS 4 MESES). O valor médio de SMOG para os 4 folhetos é de 11,13
(DP = 0,81), enquanto o valor médio de Flesch-Kincaid é igual a 8,32 (DP =
0,90). Os valores obtidos pelas duas fórmulas independentes estavam
correlacionados (ró = 0,948,p = 0,51), indicando que as medidas apresentaram
validade convergente.
Discussão
Neste estudo foram determinados através de duas fórmulas de 'lecturabilidade'
valores que reflectem anos de escolaridade necessários para a leitura assertiva
dos folhetos informativos iSaúde, disponíveis ao público na rede nacional de
farmácias associadas na A.N.F. O cuidado colocado na concepção e produção
destes folhetos deve proporcionar ao utente uma mensagem escrita, que
correctamente lida e interpretada contribui para a sua educação em saúde.
De acordo com os resultados obtidos pela fórmula SMOG, os anos de escolaridade
necessários para a compreensão dos folhetos informativos varia entre os 8 e os
10 anos de escolaridade, com uma média igual a 11 anos, valores corroborados
pelo Índice Flesch-Kincaid (7 a 9 anos de escolaridade, com uma média de 8,3
anos). De acordo com os dados obtidos, o folheto com menor SMOG foi
classificado com 9,95, isto é, o nível de educação mínimo exigido para a sua
boa leitura e compreensão corresponderá ao actual ensino básico obrigatório, ou
seja, o 9º ano de escolaridade completo. Em Portugal, de acordo com o Inquérito
ao Emprego do INE, verificou-se no 4º trimestre de 2009 que cerca de 45,9 % da
população activa possuía menos que o 3º ciclo de escolaridade completo 19. Este
baixo nível de alfabetização acentua-se em geral para a população idosa,
conhecida pela elevada frequência de utilização das farmácias de comunidade.
Deste modo, os folhetos informativos iSaúde disponibilizados pela rede de
farmácias são um recurso que pode não estar a proporcionar a todos os seus
utentes a utilidade esperada. A possibilidade de não compreender totalmente
informações de saúde aumenta o risco de tomada de decisões menos acertadas,
contribuindo para um estado de saúde mais precário e a gastos desnecessários
para os serviços de saúde 3,20.
Estudos anteriores demonstraram que os folhetos informativos sobre saúde devem
ser escritos num nível igual ou inferior aos 8 anos de escolaridade, chegando
alguns autores a defender um SMOG menor ou igual a 5 7,21. Verificou-se ainda
que a informação escrita sobre saúde ao nível de um 10º ano de escolaridade é
menos eficaz na mudança de comportamento do que materiais escritos ao nível de
um 3º ano 4. Valores de SMOG compreendidos entre 5 e 8 são defendidos por
diferentes investigadores como aqueles que conseguem melhor promover a correcta
assimilação da informação escrita. Deste modo, os resultados do presente estudo
indicam que se justifica uma extensão da análise da 'lecturabilidade' dos
textos escritos nos actuais folhetos informáticos iSaúde, a sua potencial
revisão e simplificação, mesmo sabendo que os farmacêuticos se disponibilizam
para explicar oralmente o conteúdo dessa informação escrita. Para além da
simplificação destes textos, sugere-se a elaboração de um resumo final e a
inclusão de FAQs (ou perguntas frequentes) de forma a melhorar a ligação entre
a informação e a realidade do utente.
A dificuldade de apreensão da informação é um problema que também se coloca com
os folhetos informativos dos medicamentos (bulas ouinserts), em que os valores
de 'lecturabilidade' são sistematicamente elevados, demonstrando que a
informação pode estar inacessível à maioria dos doentes 7,21. Assim, parece
ainda mais justificado, no contexto nacional, o desenvolvimento de ferramentas
válidas de análise dos factores que influenciam a legibilidade e compreensão da
informação escrita em saúde (incluindo os medicamentos em ambulatório), as
quais estão naturalmente para além da aplicação das fórmulas aqui apresentadas.
Limitações
A principal fonte de enviesamento dos resultados pode resultar da tradução dos
textos, mesmo que se tenham seguido os cuidados metodológicos habitualmente
utilizados em processos sensíveis, como por exemplo na validação transcultural
e linguística de ferramentas psicométricas e inquéritos de auto-preeenchimento
(tradução/retroversão). Contudo, dado o estilo de escrita presente em folhetos
para o público, o qual se deseja simples, directo e sem ambiguidades, a
qualidade das traduções e retroversões foi menos difícil de assegurar.
Por outro lado, estudos anteriores demonstraram que a fórmula SMOG pode
apresentar, para os mesmos excertos de texto, resultados superiores aos do
Índice Flesch-Kincaid 3,13. As causas mais óbvias para as possíveis
discrepâncias são a utilização de variáveis diferentes e as diferenças nos
algoritmos 13. No entanto, mais importante que a possibilidade de não
sobreposição dos resultados para um texto específico, será o grau de
consistência interna de cada instrumento e de correlação dos resultados entre
os dois instrumentos. Apesar de existirem estudos que afirmam que o Índice
Flesch-Kincaid não é uma fórmula muito correcta (uma vez que não inclui algumas
variáveis fundamentais) 22, reconhece-se a importância da mesma neste estudo
para a validação dos valores obtidos com o SMOG.
Conclusões
As fórmulas de 'lecturabilidade', quando usadas correctamente, podem ser
instrumentos importantes para avaliar e ajustar a produção de meios que
contribuem para o aumento das probabilidades de sucesso em educação para a
saúde. Será desejável desenvolver instrumentos que permitam a avaliação da
legibilidade, 'lecturabilidade' e literacia em saúde na língua Portuguesa.
Conflito de interesse
Os autores declaram não haver conflito de interesse.