Criatividade em contexto organizacional: o impacto de recompensas extrínsecas e
do feedback negativo no desempenho criativo
O paradigma mudou. Se noutros tempos, as organizações podiam responder às
necessidades do mercado quase sempre com a mesma fórmula, agora têm de
reinventar-se para manterem o seu valor no mercado. A competição deixou de ser
limitada a um pequeno número de empresas semelhantes. Atualmente competimos
contra todo o mundo. Neste contexto desafiante, a criatividade pode assumir um
papel-chave para qualquer organização que deseje afirmar-se ou, até mesmo,
sobreviver. As organizações devem ter a capacidade de produzir inovação e de
estar recetivas a esta, e as pessoas são essenciais neste processo. São as
pessoas que são criativas na resolução de problemas, na tomada de decisão, na
pesquisa e no desenvolvimento de novos produtos, serviços ou métodos de
trabalho (Williams & Yang, 1999). No fundo, porque só as pessoas têm a
capacidade de inventar e de sonhar. A criatividade nas organizações não
constitui nenhuma capacidade transcendental. A maioria das pessoas associa a
criatividade a grandes artistas, mas provavelmente não é esse tipo de
criatividade o mais procurado no mundo organizacional. Às organizações,
interessa a criatividade do dia a dia (Sternberg, 2012).
Pelos motivos acima referidos, a criatividade tornou-se um tópico de conversa
frequente. De acordo com James e Drown (2012), no período entre 2005 e 2009
registou-se um grande aumento de investigação relativamente à criatividade nas
organizações. Não obstante, apesar do aumento significativo da investigação
nesta área, existem ainda questões pouco esclarecidas sobre alguns fatores
subjacentes à criatividade, nomeadamente sobre os fatores que facilitam ou
inibem a criatividade, e, em particular, aqueles que estão relacionados com o
contexto organizacional (Mumford et al., 2012).
Esta investigação tem dois objetivos principais. Primeiro, pretende clarificar
um dos tópicos mais controversos presentes na literatura sobre criatividade.
Afinal, qual o impacto das recompensas extrínsecas na criatividade? Na
comunidade científica registam-se duas opiniões (e resultados) contraditórias.
Alguns autores defendem o impacto positivo das recompensas extrínsecas na
criatividade (p.e., Eisenberger & Armeli, 1997), enquanto outros defendem o
oposto (p.e., Amabile, 1985). Neste sentido, alguns autores apontam para a
necessidade de mais investigação sobre este tópico (Byron & Khazanchi,
2012; Klotz, Wheeler, Halbesleben, Brock & Bucley, 2012; Oldham & Baer,
2012; Zou & Shalley, 2008).
O segundo objetivo pretende responder a uma lacuna identificada por Zhou (2008)
referente à transmissão de feedback negativo e o seu impacto na criatividade.
Zhou (1998) identifica o feedbacknegativo como uma variável que pode inibir a
criatividade. No entanto, na necessidade de transmitir este tipo de feedback, o
que pode ser feito para amortecer o seu efeito negativo no desempenho criativo?
Esta investigação pretende também contribuir para a resposta a esta pergunta.
A clarificação das questões anteriores é importante para os profissionais
encarregues do desenvolvimento dos recursos humanos nas organizações. Os
especialistas em recursos humanos têm, muitas vezes, capacidade para
influenciar as variáveis organizacionais e contribuir para um ambiente propício
à criatividade, neste caso específico através de recompensas extrínsecas e da
transmissão de feedback(Waight, 2005). Embora existam vários estudos sobre
criatividade, são menos aqueles que se referem ao contexto organizacional, pelo
que, devido aos motivos anteriormente referidos, a mais-valia deste estudo está
na sua realização em contexto real organizacional.
Criatividade em Contexto Organizacional
A criatividade organizacional diz respeito à criatividade dos colaboradores no
seu contexto de trabalho e é essencial para que a inovação nas organizações
aconteça. Novos produtos, abordagens ou serviços estão dependentes de ideias
criativas das pessoas que constituem uma organização (Amabile, 1988). Mas o que
pode ser considerado criatividade nas organizações? Atualmente, os autores
definem criatividade enquanto geração de ideias originais, úteis e apropriadas
(Sternberg & Lubart, 1999; Zhou & Su, 2010), em qualquer domínio, no
que diz respeito a produtos, serviços, processos ou procedimentos, por
indivíduos ou equipas (Woodman, Sawyer & Griffin, 1993), sem que seja
necessária a implementação dessas ideias (Amabile, Conti, Coon, Lazenby &
Herron, 1996).
De acordo com esta definição, as ideias são consideradas originais se forem
únicas (isto é, se não existirem ideias iguais disponíveis) no contexto
organizacional específico, no momento atual; úteis, se potencialmente
acrescentarem valor à organização; e aplicáveis, se possíveis de serem
colocadas em prática no contexto organizacional (George, 2007; Shalley, Zhou
& Oldham, 2004). A utilidade e a aplicabilidade são condições necessárias,
ainda que intuitivamente a criatividade seja associada apenas à originalidade.
No entanto, nas organizações de que serviria a originalidade se não pudesse ser
aplicada? É necessário que as ideias também sejam úteis para responder a um
problema e possíveis de serem colocadas em prática, para que efetivamente
acrescentem valor ao negócio (Zhou & Shalley, 2003).
A definição anterior foca-se, sem dúvida, no produto. Os resultados criativos
podem ser qualquer produto observável, como uma ideia para uma nova abordagem
ao cliente. O foco no produto é tipicamente utilizado nos paradigmas
experimentais, nos quais a criatividade é vista como também dependente de um
contexto específico (Hennessey & Amabile, 2010). Anteriormente, os
investigadores focavam-se na ideia de que a criatividade era algo feito por um
tipo particular de indivíduos, uma abordagem que trouxe importantes contributos
como a clarificação de traços de personalidade preditores. No entanto, no
contexto organizacional, os investigadores têm vindo a assumir que todas as
pessoas, com capacidades normais, podem ter um desempenho criativo, em menor ou
maior grau, tendo em conta o ambiente envolvente (Amabile et al., 1996). Isto
significa que, se as condições convenientes existirem, qualquer pessoa em
qualquer contexto de trabalho poderá ser criativa (Shalley & Zhou, 2008;
Shalley et al., 2004). Embora existam funções que exigem mais criatividade do
que outras, a criatividade não deixa de ser essencial a todas as organizações
(Shalley & Gilson, 2004; Zhou & George, 2003).
A questão da influência do contexto está prevista num dos modelos mais
referidos para estudar a criatividade, o modelo componencial de criatividade de
Amabile (1983; 1988). É um modelo importante porque faz a ligação entre fatores
intra-individuais e contextuais (Pirola-Merlo & Mann, 2004). No que se
refere aos fatores intra-individuais, Amabile (1983) identifica três grandes
componentes ' as competências relevantes no domínio, as competências relevantes
de criatividade e a motivação para a tarefa. As competências relevantes no
domínio são consideradas a base para o desempenho criativo e englobam tudo o
que indivíduo sabe e consegue fazer no domínio específico no qual trabalha.
Relativamente às competências relevantes de criatividade, também podem ser
aplicadas a qualquer domínio, e estão incluídos o estilo cognitivo favorável à
tomada de novas perspetivas para os problemas; a aplicação de heurísticas para
a exploração de novas vias cognitivas e o estilo de trabalho.
Por último, a motivação para a tarefa, que nesta investigação merece especial
atenção pela implicação prática que tem para as organizações. Por um lado, a
motivação pode compensar um défice nas outras duas componentes, através de um
esforço adicional do indivíduo para adquirir as competências (Amabile, 1988) e
para manter, estimular e direcionar o comportamento (Klotz et al., 2012). Por
outro lado, a motivação é uma componente fácil de influenciar através de
variáveis presentes no contexto, incluindo, potencialmente, as recompensas
extrínsecas e o feedback.
Recompensas Extrínsecas e a Criatividade
A criatividade não acontece no vácuo. Existem fatores presentes no contexto
organizacional que inibem e favorecem a criatividade pelo efeito que têm na
motivação, e um deles refere-se às recompensas extrínsecas atribuídas aos
colaboradores. Pode a criatividade ser estimulada através de recompensas? Ou
será que as recompensas limitam o desempenho criativo? O impacto das
recompensas extrínsecas no desempenho criativo dos indivíduos é provavelmente o
tópico mais controverso na literatura sobre criatividade, no qual os resultados
empíricos e as opiniões inconsistentes não justificam a tomada de posição entre
as opiniões defendidas (Byron & Khazanchi, 2012; Hennessey & Amabile,
2010; Oldham & Baer, 2012).
Por exemplo, nos estudos de Eisenberger e colaboradores (Eisenberger &
Armeli, 1997; Eisenberger, Armeli & Pretz, 1998; Eisenberger & Aselage,
2009; Eisenberger & Rhoades, 2001; Eisenberger & Selbst, 1994), os
resultados apontam para um efeito positivo das recompensas na criatividade.
Contrariamente, nos estudos de Amabile e colaboradores (1986), de Joussemet e
Koestner (1999) ou de Kruglanski, Friedman e Zeevi (1971), as recompensas
apresentaram um efeito negativo na criatividade (os indivíduos com conhecimento
da existência de recompensas para o desempenho da tarefa tiveram resultados
menos criativos do que os indivíduos do grupo de controlo).
Estes resultados contraditórios não revelam mais do que a eterna divergência
entre duas linhas de investigação, o behaviorismo e a psicologia social
cognitiva. Existem muitas diferenças metodológicas nas instruções dadas, nas
tarefas criativas e até mesmo na avaliação do desempenho em tais tarefas
(Joussemet & Koestner, 1999). Por exemplo, se para os investigadores
behavioristas, a criatividade é igual a outro qualquer desempenho e a sua
ocorrência aumenta quando reforçada, para os investigadores sociais cognitivos,
as recompensas extrínsecas podem fazer com que os indivíduos se sintam
controlados ou desviem a sua atenção da tarefa para a recompensa, diminuindo a
motivação intrínseca (Hennessey & Amabile, 2010).
A motivação intrínseca constitui, para os últimos, um elemento fundamental para
o desempenho criativo e tem lugar de destaque no modelo de Amabile (1983). Para
Amabile (1988), os indivíduos com melhor desempenho criativo são aqueles que
estão motivados para a tarefa primeiramente pelo interesse, desafio e
satisfação que a mesma representa e não por fatores externos. Porquê a
sobreposição da motivação intrínseca? Segundo a literatura, Grant e Berry
(2011) apresentam como principais mecanismos, o afeto positivo, o interesse e a
curiosidade para aprender que a motivação intrínseca desperta. Sobre o afeto
positivo (p.e., Amabile, Barsade, Mueller & Staw, 2005), espera-se que
aumente a gama de informações cognitivas disponíveis e a atenção para assimilar
um maior conjunto de ideias; e incentive a flexibilidade cognitiva para
identificar padrões e associações de ideias. Sobre o interesse e a curiosidade
(p.e., Gagné & Deci, 2005), é esperado que proporcionem uma maior
predisposição para o risco, flexibilidade cognitiva e abertura à complexidade,
o que poderá resultar num maior foco em novas soluções. Além disso, tanto o
afeto como o interesse e a curiosidade também deverão aumentar a persistência
do indivíduo perante tarefas desafiantes e complexas.
Contudo, não existe concordância nos estudos científicos para se afirmar que a
motivação intrínseca é um ingrediente-chave (Grant & Berry, 2011; Shalley
et al., 2004; Zhou & Shalley, 2003), verificando-se inconsistências nos
resultados apresentados (p.e., Amabile, 1985; Amabile, Hennessey &
Grossman, 1986; Eisenberger & Aselage, 2009; Shalley & Perry-Smith,
2001; Zhang & Bartol, 2010). Ainda assim, tendo em conta a importância da
motivação intrínseca em outras áreas da psicologia organizacional, nesta
investigação será considerada como variável de controlo.
Tal como referido anteriormente, os psicólogos sociais cognitivos defendem que
as recompensas extrínsecas podem diminuir a motivação intrínseca e,
consequentemente, a criatividade; pressuposto baseado na teoria da avaliação
cognitiva (CET) (Ryan & Deci, 2000). Segundo os autores, este efeito
acontece porque a apresentação de recompensas extrínsecas desvia a atenção do
indivíduo da tarefa para a própria recompensa; e, principalmente, pelo impacto
que as recompensas extrínsecas podem ter na perceção dos indivíduos sobre a sua
autonomia. De acordo com a CET (Ryan & Deci, 2000) eventos (por exemplo,
recompensas) que não promovam o sentimento de autonomia podem ser entendidos
pelos indivíduos, como controladores, ao exigirem um determinado desempenho,
diminuindo assim a motivação intrínseca e a criatividade (Amabile &
Pillemer, 2012; Deci, Koestner & Ryan, 1999; Hennessey & Amabile,
2010). Numa era em que a autonomia assume especial destaque nas organizações,
esta teoria pode assumir-se como particularmente relevante.
Não obstante, nesta investigação é defendida a ideia de que as recompensas
extrínsecas podem motivar e estimular os colaboradores para um desempenho
criativo, dependendo das circunstâncias (Klotz et al., 2012). E duas razões
justificam este argumento. Primeiro, as recompensas extrínsecas podem servir
para reconhecer o colaborador e satisfazerem a necessidade humana de
competência pessoal. Segundo, podem aumentar o envolvimento do indivíduo na
atividade criativa (Shalley & Gilson, 2004). Estes dois argumentos
significam que, se o sistema de recompensas for baseado no suporte, se
providenciar informação útil para o colaborador sobre o desempenho e se
reconhecer a sua competência, a motivação intrínseca pode aumentar (Hennessey
& Amabile, 2010), assim como a criatividade. A informação e o
reconhecimento, relativamente ao seu desempenho, podem também levar a que o
indivíduo repita o comportamento no futuro (Klotz et al., 2012). Um estudo de
Abbey e Dickson (1983) vai ao encontro deste raciocínio. Neste estudo,
realizado com colaboradores da área de pesquisa e desenvolvimento duma empresa
industrial, verificou-se que o clima de trabalho inovador englobava um sistema
de recompensas que reconhecia os desempenhos excelentes. Ora, a criatividade
antecede a inovação.
No entanto, as circunstâncias em que as recompensas funcionam podem variar. Por
exemplo, é provável que nem todo o tipo de recompensas funcione para estimular
a criatividade. Na literatura podemos identificar três tipos de recompensas
utilizadas nos estudos sobre criatividade, nomeadamente as recompensas que se
destinam a envolver os indivíduos (engagement-contingent reward) (p.e., Selart,
Nordström, Kuvaas, Takemura, 2008), recompensas com vista a um desempenho
específico (performance-contingent reward) (p.e., Selart et al., 2008) e as
recompensas contingenciais à criatividade (creativity-contingent reward) (p.e.,
Byron & Khazanchi, 2012).
Relativamente às recompensas que se destinam a envolver os indivíduos, este
tipo de recompensas não apresenta informação nem faz qualquer exigência ou
requerimento (Unsworth, Wall & Carter, 2005) sobre o tipo de comportamento
ou competência desejados, o que pode limitar o desempenho criativo (Byron &
Khazanchi, 2012). Se o indivíduo não souber que tipo de desempenho é esperado,
especialmente quando é esperado mais do que um desempenho rotineiro, não é
expectável que o faça corretamente. Se queremos colaboradores criativos, então
é provável que tenhamos de os informar relativamente a esse aspeto. Quanto às
recompensas contingentes ao desempenho, é solicitado um desempenho específico
ao indivíduo, o que poderá minar a motivação intrínseca do mesmo, se este
sentir a recompensa enquanto um fator de controlo (Selart et al., 2008).
Por outro lado, a solução pode estar nas recompensas contingentes à
criatividade. Numa meta-análise de Byron e Khazanchi (2012) que englobou 60
estudos experimentais e não experimentais, os resultados indicaram que as
recompensas contingentes à criatividade tendem a aumentar o desempenho
criativo, ao contrário das recompensas focadas no desempenho rotineiro, que
tendem a ter efeitos negativos na criatividade. Também Eisenberger e Shanock
(2003) já haviam defendido esta ideia anteriormente. Este tipo de recompensas
clarifica o comportamento desejado, ajuda a que os indivíduos entendam que tipo
de competências e desempenho é esperado deles, sem propriamente controlá-los
para um desempenho mais específico que envolva outros fatores como pressão ou
competição. Ao envolver o critério claro de criatividade, a recompensa pode
direcionar a atenção, energia e esforço dos indivíduos para o desempenho
criativo (Byron & Khazanchi, 2012; Eisenberger & Selbst, 1994). Ao
apresentar este carácter informacional e não controlador, é esperado que este
tipo de recompensa estimule a criatividade, pelo que propomos a seguinte
hipótese:
H1: as recompensas extrínsecas contingentes à criatividade têm um impacto
positivo no desempenho criativo. Os indivíduos que recebem recompensas
contingentes à criatividade têm um melhor desempenho criativo do que os
indivíduos que não recebem este tipo de recompensas.
Feedback Negativo e a Criatividade
O sistema de recompensas não é o único evento contextual que pode influenciar a
criatividade. Quando analisamos contextos organizacionais, percebemos que
existem múltiplos fatores que podem afetar o desempenho dos indivíduos,
inclusive quando o desempenho é criativo. É o caso do feedback, uma das funções
chave das chefias. O feedback refere-se à informação recebida por um indivíduo
relativamente a um comportamento que o mesmo desempenhou, providenciada por
outro indivíduo que está numa posição que permite avaliar tal comportamento.
Este tipo de informação permite clarificar que desempenho é esperado do
indivíduo, tendo em conta objetivos estabelecidos (Ilgen, Fisher & Taylor,
1979), pelo que o feedback é uma ferramenta útil para a modificação de
comportamentos, aprendizagem e desenvolvimento (Hattie & Timperley, 2007),
além de poder também ser utilizado como estratégia motivacional, se responder a
necessidades de autoestima, competência, desenvolvimento e autorrealização
(Ilgen et al., 1979; Ryan & Deci, 2000; Zhou, 2008).
No entanto, transmitir feedback não é um processo simples, nem acontece sempre
de forma eficaz (Shalley & Gilson, 2004), especialmente se o feedback a ser
transmitido não for positivo. O feedback pode ter um impacto tanto positivo
como negativo no indivíduo que o recebe (Hattie & Timperley, 2007),
dependendo da perceção e resposta ao mesmo, que varia de acordo com uma série
de características (Ilgen et al., 1979). Particularmente no campo da
criatividade, a componente informacional do feedback é muito importante porque
permite que o indivíduo aprenda, compreenda e internalize padrões de trabalho
considerados criativos; e facilita a aquisição de competências e estratégias
criativas relevantes, que aumentam a probabilidade de os indivíduos
identificarem, de forma mais exata, o problema, gerarem mais ideias e
utilizarem padrões apropriados para avaliar e redefinir ideias (Zhou, 2008). O
feedback pode, desta forma, estimular os colaboradores para um desempenho mais
criativo, mas o seu impacto dependerá de fatores como o estilo e a valência da
informação que é apresentada (Egan, 2005; Shalley & Gilson, 2004; Zhou,
1998, 2008). Portanto, embora a importância do feedback não pareça ser
questionável, a preocupação surge ao tentar perceber como é que esta ferramenta
resulta como uma vitamina eficaz para a criatividade.
Neste sentido, Zhou (1998), num estudo no qual pretendia analisar a interação
entre a valência e o estilo do feedback e a autonomia na tarefa, faz uma
importante e clara distinção entre vários tipos de feedback. De acordo com a
autora, o feedback pode dividir-se em termos de valência ' positiva ou negativa
' e em termos de estilo ' informacional ou de controlo. A valência refere-se à
comparação de um desempenho criativo de um indivíduo com o desempenho de outros
indivíduos ou com algum outro critério identificado. Isto significa que se um
indivíduo receber feedback positivo, teve um desempenho criativo melhor ou
igual a um padrão ou critério. Pelo contrário, se receber feedback negativo, o
indivíduo teve um desempenho criativo inferior ao estabelecido. Já o estilo,
está relacionado com a forma como o feedback é transmitido. O estilo
informacional informa sobre o desempenho, mas não coloca nenhuma restrição ou
obrigação ao indivíduo. É o próprio indivíduo que mantém o controlo das suas
ações e comportamentos. No estilo de controlo são impostos determinados
resultados ou níveis de criatividade a atingir.
Os resultados deste estudo foram claros. Os indivíduos que receberam feedback
positivo tiveram melhores resultados criativos do que os que receberam feedback
negativo, assim como os indivíduos que receberam feedback informacional em
detrimento dos indivíduos que receberam feedback de controlo. Ao ser analisada
a interação entre o estilo e a valência, confirmou-se o esperado, o feedback
positivo e informacional estimula a criatividade, ao contrário do feedback
negativo e de controlo, que se assumiu como um inibidor da criatividade. Estes
resultados estão consonantes com a teoria da avaliação cognitiva (Ryan &
Deci, 2000) já referida anteriormente. Ou seja, a valência positiva e o estilo
informacional reconhecem a competência do indivíduo, informando-o sobre o seu
desempenho, sem conter mensagens que possam ser entendidas como controladoras
desse mesmo desempenho. Tal como no contexto das recompensas extrínsecas,
também na literatura relacionada com o efeito do feedback na criatividade, a
motivação intrínseca destaca-se. De acordo com Zhou (2008), se o feedback
impulsionar ou mantiver a motivação intrínseca, é esperado que a criatividade
seja estimulada. Para isso, deve reconhecer a competência e o desempenho do
indivíduo, sem minar a sua autonomia (Deci et al., 1999).
O feedback negativo tende, desta forma, a desencorajar o comportamento criativo
(George & Zhou, 2001). Mesmo transmitido de forma informacional, pode ter
um efeito nefasto no sentimento de competência do indivíduo e na motivação
intrínseca (Guay, Vallerand & Blanchard, 2000). Contudo, no contexto das
organizações, muitas vezes é necessário transmitir feedback negativo aos
colaboradores. Como deve reagir uma chefia? Ainda que a melhor solução pareça
ser transmitir feedback negativo de forma informacional, a verdade é que existe
uma lacuna na literatura sobre este tópico (Zhou, 2008). Esta investigação
propõe que a resposta esteja no feedback de desenvolvimento.
O feedback de desenvolvimento providencia informação que permite que os
indivíduos aprendam, se desenvolvam e façam melhorias no trabalho, potenciando
um desempenho mais criativo (Egan, 2005; George & Zhou, 2007; Zhou, 2003;
Zhou, & Shalhey, 2003). Além disso, o feedback de desenvolvimento também
coloca os indivíduos num modo de aprendizagem e aperfeiçoamento, no qual há
maior probabilidade de os mesmos apresentarem, naturalmente, novas soluções e
estratégias para problemas e melhorias relacionados com o trabalho (George
& Zhou, 2007), por direcionarem a sua energia para uma perspetiva mais
construtiva sobre o seu trabalho (Egan, 2005). O feedback de desenvolvimento
distingue-se um pouco do feedback informacional. Por exemplo, no feedback
informacional, o foco é apenas na questão como estou a ir?, a informação
refere-se ao desempenho ou comportamento passado, sem necessariamente abordar o
futuro. Por outro lado, este último aspeto é o centro do feedback de
desenvolvimento, que pretende responder à dúvida para onde? (Hattie &
Timperley, 2007), numa ótica de aperfeiçoamento contínuo. Permite que seja
transmitida informação comportamental relevante aos indivíduos para que estes
possam fazer melhorias no futuro (Zhou, 2003).
O feedback de desenvolvimento está, assim, ligado aos comportamentos de
suporte, por parte da chefia, que podem estimular a criatividade (Amabile,
Schatzel, Moneta & Kramer, 2004; Hennessey & Amabile, 2010). Num
estudo, George e Zhou (2007) confirmaram a importância do feedback de
desenvolvimento, transmitido pelo supervisor de cada colaborador, na
criatividade dos colaboradores, dependendo das circunstâncias. Também Zhou
(2003) constatou que o feedback de desenvolvimento, providenciado a
colaboradores na área da saúde, aumentou a probabilidade de estes colaboradores
demonstrarem um desempenho mais criativo. Neste estudo foi concluído que a
motivação intrínseca, dos mesmos colaboradores, aumentou através do feedback de
desenvolvimento transmitido.
Tendo em conta o efeito benéfico, identificado na literatura, do feedback de
desenvolvimento na criatividade, nos casos em que o indivíduo tem um desempenho
criativo inferior ao esperado, será uma boa solução fornecer feedback negativo,
num estilo informacional, e de seguida fornecer feedback de desenvolvimento? A
presente investigação testa esta hipótese. Ainda que o feedback negativo possa
implicar a diminuição da motivação intrínseca e da criatividade, provavelmente
este efeito negativo pode ser diminuído se for transmitido feedback de
desenvolvimento ao indivíduo imediatamente a seguir. Isto é, se forem
transmitidas informações que permitam ao indivíduo aprender e desenvolver
competências e estratégias importantes para a criatividade, provavelmente a
criatividade é estimulada através de duas vias: o aumento do sentimento de
competência e da motivação intrínseca; e a aprendizagem de novas estratégias e
competências relevantes para um desempenho criativo.
Uma das estratégias que pode ser providenciada é o brainstorming. A estratégia
do brainstorming é uma das técnicas mais populares para aumentar a criatividade
em grupo perante um problema determinado previamente (Baruah & Paulus,
2008), pelo que é um dos processos mais adotados, nas organizações, para a
geração de ideias criativas (Heslin, 2009). Embora o brainstorming seja uma
técnica clássica para a geração de ideias em grupo, também pode ser adaptado
para ser utilizado a um nível individual, no qual o indivíduo é o único
responsável pelo processo criativo. Alguns autores apontam para a maior
eficácia e produtividade do brainstorming individual, comparativamente ao
brainstorming em grupo (Smith, Linsey & Kerne, 2010), ao nível da
quantidade das ideias geradas (Harari & Graham, 1975; Paulus & Yang,
2000) e da originalidade de ideias (Heslin, 2009). Desta forma, a técnica do
brainstorming individual, parece constituir uma ferramenta útil para a geração
de ideias criativas. Tendo em conta o referencial teórico anterior, são
colocadas as seguintes hipóteses:
H2a: o feedback negativo tem um impacto negativo no desempenho criativo. Após a
receção do feedback negativo, os indivíduos diminuem o desempenho criativo.
H2b: o feedback de desenvolvimento (através do brainstorming individual) tem um
impacto positivo no desempenho criativo. Os indivíduos que recebem feedback
negativo informacional seguido de feedback de desenvolvimento têm um melhor
desempenho criativo do que os indivíduos que recebem apenas feedback negativo.
Metodologia
Design e Participantes
Foi utilizado um design experimental com quatro condições (2x2, inter-
individual), no qual metade dos participantes foram informados da existência de
uma recompensa pela participação em tarefas criativas e a outra metade não
recebeu esta informação. Além disso, em cada uma das condições anteriores,
metade dos participantes recebeu feedback negativo informacional sobre o seu
desempenho e a outra metade recebeu feedback negativo informacional seguido de
feedback de desenvolvimento. Os participantes foram distribuídos aleatoriamente
pelas condições experimentais. Participaram 83 enfermeiros do Hospital da
Horta, provenientes de todos os serviços do hospital, que correspondem a 69% da
população de enfermagem do hospital. A idade média da amostra foi de 37.4 anos
e 85% dos participantes eram do sexo feminino. Por último, a média de serviço
dos enfermeiros naquele hospital específico era de 12.8 anos e na profissão de
enfermagem de 13.91 anos.
Procedimentos
Todos os enfermeiros do hospital foram convidados, de forma voluntária, a
participar no estudo. Inicialmente os participantes foram informados de que o
estudo era sobre criatividade nas organizações e destinava-se a perceber a
forma como as pessoas podiam ser mais criativas no seu local de trabalho. Após
todas as formalidades (consentimento informado; garantia de anonimato e
confidencialidade dos dados; possibilidade de desistência), procedeu-se à
recolha de dados. A recolha de dados está dividida essencialmente em dois
momentos. Num primeiro momento, é pedido aos participantes que respondam a um
breve questionário relativamente à participação na experiência, antes de
receberem qualquer instrução. Este questionário destina-se a medir a motivação
intrínseca (Guay et al., 2000). De seguida são dadas as instruções
relativamente à existência da recompensa, ao grupo que recebe recompensa; e as
instruções sobre as tarefas a serem desempenhadas, a ambos os grupos.
A ambos os grupos experimentais (ao grupo com recompensa, logo após a
informação sobre a recompensa) foi explicado verbalmente que: irá participar
em duas tarefas de resolução criativa de problemas. A participação neste tipo
de tarefas pressupõe que os indivíduos sejam criativos, tanto quando possível,
para resolver os problemas identificados. No entanto, é necessário esclarecer
que, embora associemos naturalmente a criatividade apenas ao conceito da
originalidade, uma ideia realmente criativa, além de original (isto é, não
existe neste contexto específico, no momento atual), é também útil, ao
interveniente do problema, e possível de ser posta em prática (por exemplo, por
não apresentar problemas éticos), no contexto no qual se insere. O objetivo é
gerar o máximo número de ideias criativas que quiser e que conseguir para
resolver os problemas identificados. Não foi referido qualquer padrão de
desempenho específico, à exceção da referência à criatividade como um critério
da tarefa proposta.
De seguida foi apresentada a primeira tarefa, com instruções escritas, que
frisavam novamente a necessidade de o participante refletir sobre as três
condições para uma ideia ser considerada criativa (originalidade, utilidade e
aplicabilidade). Após a leitura das instruções pelo participante, o
experimentador perguntou se tinha percebido o objetivo da tarefa e o problema
apresentado. Depois da conclusão da primeira tarefa, os participantes
responderam, novamente, ao questionário destinado a avaliar a motivação
intrínseca, mas desta vez foi-lhes dito para refletirem sobre a tarefa que
tinham acabado de realizar, porque o questionário destinava-se a medir o
interesse na realização da tarefa anterior.
O segundo momento da experiência começa com a transmissão de feedback (falso)
aos participantes sobre o seu desempenho da tarefa anterior. Ambos os grupos
são divididos em duas subamostras. Uma das subamostras recebe feedback negativo
informacional e a outra recebe também o feedback anterior, no entanto, recebe
ainda feedback de desenvolvimento. De seguida, é entregue a segunda tarefa com
um problema diferente, mas com instruções escritas iguais às apresentadas na
primeira tarefa. É também dito ao participante esta é a segunda tarefa, o
objetivo é exatamente igual ao da primeira tarefa, isto é, gerar o máximo
número de ideias criativas que quiser e conseguir, sem nunca esquecer que uma
ideia criativa é original, útil e possível de ser posta em prática, no contexto
específico. Foi igualmente perguntado aos participantes se tinham percebido o
objetivo da tarefa.
Após a finalização da segunda tarefa, a motivação intrínseca foi novamente
medida, através do mesmo questionário e foi dito aos participantes para terem
em consideração a última tarefa realizada, ou seja, o segundo problema que lhes
foi pedido para resolver. No final, foi feito um debriefing aos participantes
para explicar que o feedback transmitido era falso, de acordo com um guião
estabelecido, pelo que não refletia o real desempenho de cada participante.
Além disso, os participantes do grupo sem recompensa foram informados de que
também receberiam uma recompensa.
Medidas
Variáveis independentes
Recompensas extrínsecas. As recompensas extrínsecas foram manipuladas através
da informação transmitida ao participante antes de ser apresentada a primeira
tarefa criativa. Ao grupo que tem conhecimento da recompensa foi transmitida a
seguinte informação, antes de lhe explicar a primeira tarefa que irá
desempenhar, tenho de informá-lo(a) de que, por estar a participar nestas duas
tarefas de resolução criativa de problemas, irá receber uma recompensa no final
da sua participação. Nós acreditamos que a criatividade é uma mais-valia nas
organizações e que deve ser recompensada por isso. A instrução anterior
transmite, claramente, que a recompensa é pela participação numa tarefa
criativa, que é esperado que os participantes sejam criativos na resolução dos
problemas apresentados, sem no entanto, estabelecer um padrão de desempenho
específico, que poderia minar a criatividade. Não foi dada nenhuma informação
aos participantes relativamente ao tipo de recompensa que seria entregue.
Feedback. Foi utilizado um guião específico e determinado para os dois tipos de
feedback transmitidos. Este tipo de procedimento tem sido utilizado em vários
estudos (p.e., Fodor & Carver, 2000; Zhou, 1998), pelo que o feedback
transmitido foi adaptado de um guião utilizado por Zhou (1998). O guião de
feedback negativo informacional serve apenas para informar os indivíduos sobre
o seu desempenho na (primeira) tarefa, tal como prevê a CET (Deci et al.,
1999), pelo que foi transmitido aos participantes a seguinte informação de
forma verbal, enquanto esteve a responder ao questionário, vi atentamente as
suas respostas à primeira tarefa e reparei que não foram muito criativas. Tal
como lhe disse, para uma ideia ser considerada criativa, é necessário que seja
original, útil e possível de ser posta em prática. Neste sentido, as suas
ideias eram úteis e aplicáveis, no entanto faltou a parte da originalidade.
Após a transmissão da informação anterior, a metade dos participantes foi
entregue a segunda tarefa. A outra metade recebeu, antes da segunda tarefa,
feedback de desenvolvimento através de um documento com a técnica do
brainstorming descrita. Antes da entrega do documento foi transmitida a
seguinte informação, vou providenciar-lhe uma técnica que é muito utilizada
para o aumento da criatividade. É muito utilizada em equipas no contexto de
trabalho. Provavelmente até já a conhece, refere-se à técnica do brainstorming.
Pedia-lhe que lesse as instruções e, se considerar que lhe pode ser útil para a
realização da segunda tarefa, que seguisse os seus passos.
A construção do guião de brainstorming teve como base as quatro regras
elaboradas por Osborn (1963), a) os indivíduos devem expressar todas as ideias
de que se lembram, mesmo as ideias mais bizarras são permitidas, sem a
preocupação imediata com a qualidade ou com a avaliação das ideias; b) não é
permitido criticar ou julgar qualquer ideia; c) a ideia é gerar tantas ideias
quanto possíveis; d) combinar e melhorar as ideias explicitadas para que surjam
novas e melhores ideias (Baruah & Paulus, 2008; Heslin, 2009; Linsey &
Becker, 2010). Geralmente só após uma exaustiva lista de ideias é que se
procede à avaliação das mesmas. O brainstorming individual é igual ao
brainstorming em grupo relativamente às regras anteriores e tipicamente inclui
técnicas como a escrita livre e a associação de palavras. Tendo em conta que a
participação é individual, não faria sentido optar-se pelo brainstorming em
grupo.
O documento entregue aos participantes continha a seguinte informação, Todas
as pessoas conseguem ser criativas, muitas vezes é uma questão de treino ou de
aprender algumas estratégias. Quando se fala em criatividade, provavelmente
associa este termo a grandes artistas, certo? Mas a criatividade não está
presente apenas em obras de arte ou em grandes descobertas científicas. A
criatividade também acontece no nosso dia a dia, em aspetos básicos com os
quais lidamos diariamente, sem termos consciência de que estamos a ser
criativos. Uma ideia criativa pode ser um novo método para organizar melhor os
horários dos turnos ou a ideia de fazer um jantar mensal para aumentar o
espírito de equipa. Ou então, começar a investigar um tratamento de ponta, para
que os pacientes sejam melhor atendidos. Neste sentido, o brainstorming é uma
ferramenta que nos ajuda a gerar ideias criativas. Geralmente é utilizado por
equipas, mas também pode funcionar muito bem a um nível individual. Mais
especificamente sobre esta técnica, a ideia é gerarmos o máximo de ideias que
conseguirmos, sem nos importarmos se tais ideias nos parecem menos boas ou até
mesmo bizarras. Não vale autocriticarmo-nos, nem sabotarmos as nossas próprias
ideias. Elas poderão verificar-se brilhantes na fase da avaliação! O mais
importante é deixar fluir as ideias na nossa cabeça com total liberdade mental.
Podemos registar as nossas ideias ' sejam apenas conceitos, palavras-chave ou
frases ' à medida que as mesmas vão surgindo, por exemplo em post-its coloridos
colados na parede. Também pode ajudar se se colocar numa perspetiva diferente,
por exemplo, como se fosse você o beneficiário da sua ideia criativa (o
paciente, por exemplo). Só depois de gerarmos o máximo de ideias que
conseguirmos é que analisamos a qualidade das ideias. Nesta fase sim devemos
preocupar-nos em avaliar e selecionar as ideias que são verdadeiramente
criativas, ou seja, as ideias que não estão implementadas neste momento nesta
organização (originalidade) e que são úteis e podem ser postas em prática neste
contexto. Temos de ter em consideração o seu benefício, para ambos os
interessados, e se a ideia é eticamente possível de ser posta em prática.
Variável dependente
Criatividade. A criatividade foi medida pela avaliação das respostas dos
participantes nas duas tarefas de geração de ideias. Ambas as tarefas
apresentadas aos participantes eram aplicadas ao contexto de trabalho dos
mesmos, de forma a estarem consonantes com a definição e o modelo de
criatividade defendido, o qual prevê que as competências no domínio específico
sejam relevantes e imprescindíveis para um desempenho criativo (Amabile, 1983).
No entanto, as tarefas não eram demasiado específicas, isto é, não eram
restritivas a uma área específica de enfermagem, mas dois problemas abrangentes
e que para os quais qualquer enfermeiro deve estar contextualizado.
A primeira tarefa referia-se ao problema, Imagine que é anunciado, no hospital
no qual trabalha, que os pacientes estão internados mais tempo do que o
suposto, pois o tempo de recuperação é mais lento do que o normal. Desta forma,
o hospital pretende implementar medidas para reduzir o tempo de internamento
dos seus pacientes. Neste sentido, pedimos-lhe que sugira ideias de medidas que
possam ser implementadas com vista ao objetivo anterior. Na segunda tarefa era
descrito o problema, Imagine que é anunciado, no hospital no qual trabalha,
que irão ser implementadas medidas para que os utentes tenham uma menor
perceção do tempo que esperam em salas de espera (por exemplo, para consultas
ou nas urgências) de forma a aumentar os índices de satisfação dos mesmos.
Sugira ideias que possam ser implementadas com vista ao objetivo anterior.
Para ambas as tarefas, além das instruções verbais já referidas, foram
transmitidas as seguintes instruções escritas, Por favor, leia atentamente o
seguinte problema e sugira ideias criativas, de forma escrita, para resolver o
problema apresentado. Não se esqueça, uma ideia criativa é uma ideia original
(que não está implementada nem a ser utilizada, neste momento, no seu
hospital), útil, para responder ao problema identificado e apropriada
(perfeitamente possível de ser posta em prática, no mesmo contexto, pois não
acarreta problemas (p.e., éticos, ilegais ou económicos) nem para o hospital
(incluindo a equipa hospitalar) nem para os pacientes e significa uma melhoria
para os intervenientes anteriores).
Este tipo de tarefas tem sido utilizado em vários estudos, no contexto da
criatividade (p.e., Amabile et al., 1986; Joussemet & Koestner, 1999;
Selart et al., 2008; Shalley, 1991; Shalley & Perry-Smith, 2001; Zhou,
1998). São tarefas abertas, sem uma solução óbvia ou respostas pré-
determinadas, o que permite dar espaço à geração de ideias criativas.
Nesta investigação as respostas dos participantes foram avaliadas pelo diretor
geral de enfermagem, que faz parte do conselho de administração do hospital
atualmente, e tem 27 anos de serviço enquanto enfermeiro na organização. Cada
ideia criativa dos participantes foi avaliada de acordo com uma escala de 7
pontos nos seguintes três itens referentes às três dimensões avaliadas '
originalidade, utilidade e aplicabilidade. Foram transmitidas as seguintes
informações, Por favor, leia atentamente todas as ideias geradas pelos
participantes e classifique cada ideia, individualmente, de acordo com a
seguinte escala. A escala apresentada era a seguinte:
- Originalidade (1 nada original; 7 extremamente original): em que grau esta
ideia é nova (i.e. não é aplicada no momento presente) no hospital para
solucionar o problema apresentado?
- Aplicabilidade(1 nada aplicável; 7 extremamente aplicável): em que grau
esta ideia pode ser aplicada neste hospital para resolver o problema (p.e., em
termos éticos, judiciais e económicos)?
- Utilidade (1 nada útil; 7 extremamente útil): em que grau esta ideia é
útil (para o hospital e para os pacientes) para resolver o problema
apresentado?
Dado que os participantes geraram várias ideias, cada ideia foi avaliada
independentemente, pelo que no final foi feita uma média de cada indivíduo para
determinar o desempenho criativo geral na tarefa. O avaliador não teve
conhecimento da identidade dos participantes nem da condição experimental à
qual pertenciam, para minimizar possíveis enviesamentos nos resultados. Além
disso, avaliou indivíduo por indivíduo, isto é, só após a avaliação total de um
indivíduo é que o avaliador passou ao indivíduo seguinte. Procedimentos
semelhantes a este têm sido utilizados noutros estudos (p.e., West &
Anderson, 1996).
Variável controlo
Motivação intrínseca.Tendo em consideração a importância que os autores
atribuem à motivação intrínseca, no contexto da criatividade, esta variável foi
medida apenas para efeitos de controlo, através da Escala de Motivação
Situacional (SIMS) desenvolvida por Guay e colaboradores (2000). A medição da
motivação intrínseca foi realizada em três momentos ' antes da primeira tarefa
(T1), após a primeira tarefa antes do feedback negativo (T2), e após a segunda
tarefa (T3) ' para verificar se os indivíduos apresentavam variabilidade após a
introdução das variáveis independentes e para perceber o efeito da motivação
intrínseca reportada no desempenho criativo dos mesmos.
A SIMS destina-se a medir a motivação em contexto de laboratório e em estudos
de campo, no decurso de uma tarefa específica. A motivação situacional refere-
se à motivação que os indivíduos experienciam aquando o envolvimento numa
determinada atividade e providencia informação útil relativamente aos processos
autorregulatórios dos indivíduos (Guay et al., 2000). A escala conta com 16
itens, divididos em quatro subescalas. Sobre a motivação intrínseca, os itens
correspondentes são quatro: porque penso que esta atividade é interessante,
porque considero que esta atividade é agradável, porque esta atividade é
divertida, e porque me sinto bem quando realizo esta atividade. Cada item da
escala é classificado de acordo com uma escala de Likert de 7 pontos (1 não
corresponde nada e 7 corresponde exatamente).
De acordo com Guay et al. (2000), a SIMS apresenta capacidade suficiente para
detetar mudanças intra-individuais na motivação. Este aspeto é especialmente
importante, uma vez que nesta investigação pretende-se avaliar a motivação em
três momentos, dois desses momentos após a apresentação de duas variáveis
independentes. Além disso, a escala não apresenta sensibilidade relativamente
ao sexo do indivíduo.
Todavia, tendo em conta a origem da escala, foi utilizada uma versão portuguesa
traduzida e adaptada no contexto académico português por Gamboa, Valadas e
Paixão (2013). Ainda que a validação da escala tenha sido feita no contexto
académico, a tradução da mesma segue completamente a escala original, não sendo
registadas alterações significativas. Neste âmbito, uma vez que o propósito da
escala original é a avaliação da motivação situacional em contexto
laboratorial, espera-se que a adaptação desenvolvida por Gamboa et al. (2013)
esteja também apta para o mesmo propósito.
Foi realizada uma análise fatorial exploratória a este instrumento, para
avaliar a sua estrutura interna e determinar se as medidas hipotéticas medem
efetivamente o que se pretende medir. A extração dos fatores foi realizada com
base no método de análise em várias componentes principais com rotação oblimin.
A seleção dos itens para o fator respeitou os seguintes critérios: 1) depois de
ter sido realizada a rotação oblimin, consideraram-se os itens saturados a mais
de 0.50; 2) não foi eliminado nenhum dos três itens, dado que todos os itens
apresentavam peso fatorial superior a 0.50 e não existiam itens ambíguos; 3)
calculou-se os alfas de Cronbach, a correlação entre item e o valor global da
escala, bem como o valor de alfa, caso o item fosse eliminado (Castanheira,
2005). A análise fatorial foi levada a cabo para os três tempos em que foi
medida a motivação intrínseca e obteve-se um fator único, em todos os tempos,
que explica 67,4% (T1), 66,6% (T2) e 71,8% (T3), no qual estavam incluídos
todos os itens. Alphas de .74, .74 e .80, nos momentos respetivos. Um alfa de
.74 revela uma consistência aceitável e um alfa de .80, uma boa consistência
interna do instrumento. Estes resultados vão ao encontro da solução de fator
único já proposta pelos autores da escala original (com um alfa de .95) e pelos
autores que desenvolveram a adaptação da escala ao contexto escolar português
(com um alfa de .89).
Manipulation check
Foram utilizadas duas perguntas com resposta dicotómica (sim ou não) para
verificar a manipulação das variáveis independentes (feedback e recompensas
extrínsecas), nomeadamente perguntou-se aos sujeitos se tinham percebido,
claramente, o feedback transmitido, através da pergunta considera que a
informação transmitida, relativa ao feedback negativo, foi credível? e
considera clara a informação transmitida relativa ao feedback negativo?; e se
tinham percebido que lhes seria atribuída uma recompensa, pela participação nas
duas tarefas de resolução criativa de problemas, através da pergunta considera
clara a informação transmitida relativamente à entrega da recompensa? e ficou
claro para si que receberia uma recompensa pela participação em duas tarefas de
resolução criativa de problemas?. De acordo com os resultados da manipulation
check, três indivíduos não acreditaram no feedback transmitido, pelo que a
amostra final refere-se a apenas 80 enfermeiros, pela necessidade de eliminar
dados referentes aos três participantes.
Resultados
Análises preliminares
No Quadro_1 apresentam-se as médias e os desvios-padrão das variáveis em estudo
nos diferentes tempos. De uma forma geral, ao nível da criatividade, os
participantes obtiveram uma média de 4.63, na primeira tarefa e de 4.19, na
segunda tarefa. Ao considerar os itens utilizados para avaliar a criatividade
separadamente, o item originalidade apresenta uma média de 3.05 e de 4.92, na
primeira e na segunda tarefa, respetivamente. No caso do item utilidade, os
resultados apresentam uma média de 5.94 na primeira tarefa e de 4.46, na
segunda tarefa. Por último, o item aplicabilidade, as médias apresentadas são
4.92 e 3.20, para as tarefas respetivamente. Quanto ao número médio de ideias
geradas na primeira tarefa foi de 3.75 e de 5.34, na segunda tarefa. Sobre a
motivação intrínseca, no primeiro momento, os participantes apresentaram uma
média de 4.95. Já no segundo e no terceiro momento, regista-se uma média de
5.57 e 5.75, respetivamente.
A análise de variância às condições experimentais (2 (com recompensa vs. sem
recompensa) x 2 (feedback negativo vs. feedback negativo e feedback de
desenvolvimento)) revelou a ausência de efeito sobre o desempenho criativo na
segunda tarefa (F(1, 79) = .204; p= .653; η2 = .003) (Quadro_2). Isto significa
que não houve interação entre as recompensas extrínsecas e o tipo de feedback,
o que permite fazer a análise individual às variáveis, no teste de hipóteses.
Teste de hipóteses
Para testar as nossas hipóteses foi levado a cabo um conjunto de análises de
variância (ANOVA) para verificar se existiam diferenças significativas entre os
indivíduos nas diferentes condições do estudo. A hipótese 1 previa que as
recompensas extrínsecas contingentes à criatividade teriam um impacto positivo
no desempenho criativo. Para testar esta hipótese fizemos uma ANOVA a um fator,
comparando o grupo que tinha conhecimento antecipado de que iria receber uma
recompensa com o grupo a quem não foi dito nada sobre uma eventual recompensa.
Não se verificaram diferenças significativas quanto à introdução de recompensas
(F(1, 78) =.491; p = .485; partial η2 =.006) (Quadro_3), pelo que a hipótese
não foi suportada.
Relativamente à hipótese 2a, esta hipótese previa que da primeira para a
segunda tarefa, isto é, após a transmissão de feedback negativo, os
participantes diminuiriam o desempenho criativo. Para testar esta hipótese
fizemos uma ANOVA a um fator com medidas repetidas, para verificar a diferença
entre o desempenho criativo dos indivíduos da primeira para a segunda tarefa.
Foi verificada uma diferença significativa do tempo um (primeira tarefa) para o
tempo dois (segunda tarefa) (F(1,78) = 12.40; p = .001; Wilk's Λ = .863;
partial η2= .137). A média no tempo dois (Mt2= 4.19, DP=0.63) era
significativamente menor do que a média no tempo um (Mt1= 4.63, DP= 0.92), pelo
que os resultados permitem confirmar esta hipótese (Figura_1).
Por último, a hipótese 2b previa que os indivíduos que receberam feedback
negativo informacional seguido de feedback de desenvolvimento teriam um melhor
desempenho criativo do que os indivíduos que receberam apenas feedback
negativo. Para testar esta hipótese fizemos uma ANOVA a um fator, comparando o
grupo que tinha recebido apenas feedback negativo, com o grupo que tinha
recebido feedback de desenvolvimento, após feedback negativo, através da
técnica do brainstorming individual, na segunda tarefa. Não foi verificado um
efeito do tipo de feedback transmitido (F(1,78) =.108; p = .744; Wilk's Λ =
.999; partial η2=.001). As diferenças de médias observadas entre os grupos não
são estatisticamente significativas (Mfn = 4.24, DP= 0.615; Mfn+d= 4.14,
DP=0.638), pelo que a hipótese não foi suportada (Quadro_4).
Análises suplementares
Para um conhecimento mais aprofundado sobre as variações do desempenho criativo
dos indivíduos nas duas tarefas, foram realizadas análises de medidas repetidas
às três dimensões utilizadas para avaliar a criatividade, separadamente. Como
referido, a análise foi realizada para verificar a existência de diferenças
entre a avaliação nas duas tarefas, após a transmissão de feedback negativo; e
diferenças entre os dois grupos, no que se refere ao tipo de feedback que
recebem antes da segunda tarefa.
Relativamente ao item originalidade, de acordo com a análise realizada, foram
encontradas diferenças significativas entre a primeira e a segunda tarefa (F
(1,78) = 57.80; p < .001; Wilk's Λ = .574; partial ?2= .426). Estas diferenças
indicam que os indivíduos, de ambas as condições experimentais, aumentaram a
originalidade nas ideias fornecidas (MO1= 3.04, DP= 1.77; MO2= 4.91, DP= 1.56).
Também foram encontradas diferenças significativas entre os dois grupos
experimentais (feedback negativo vs. feedback negativo com feedback de
desenvolvimento) (F(1,78) = 4.73; p= .033; Wilk's Λ= .943; partial η2= .057). A
diferença encontrada nas respostas entre os indivíduos que recebem feedback
negativo e os indivíduos que recebem feedback negativo seguido de feedback de
desenvolvimento (brainstorming individual) indica que os participantes que
recebiam apenas feedback negativo apresentaram respostas menos originais (M =
4.66, DP= 1.69) do que os participantes que receberam feedback negativo e
desenvolvimento (M= 5.17, DP = 1.39) (Quadro_5).
No critério utilidade, são também encontradas diferenças significativas entre
a primeira e a segunda tarefa (F(1,78) = 47.06; p < .001; Wilk's Λ = .624;
partial η2= .376), que indicam que a classificação das ideias criativas dos
indivíduos no item utilidade desce significativamente da primeira tarefa para
a segunda (MU1 = 5.93, DP= 1.51; MU2= 4.45, DP= 1.44). Contudo, ao contrário do
ocorrido no critério originalidade, não foram verificadas diferenças entre os
grupos experimentais relativamente ao tipo de feedback transmitido (F(1,78) =
1.34; p= .249; Wilk's Λ = .983; partial η2 = .017). Isto significa que tanto os
indivíduos que recebem feedback negativo (M= 4.64, DP= 1.40) como os indivíduos
que recebem feedback negativo com feedback de desenvolvimento (M= 4.26, DP=
1.47) descem as classificações no critério utilidade (Quadro_5).
Relativamente à diferença entre o desempenho no critério aplicabilidade nas
duas tarefas, são encontradas diferenças significativas (F(1,78) = 61.86; p <
.001; Wilk's Λ =.558; partial η2= .442), nas quais a aplicabilidade das
ideias geradas desceu significativamente (MA1 = 4.91, DP= 1.55; MA2= 3.20, DP=
1.28). Mas tal como no critério utilidade, os dados não demonstram diferenças
significativas entre os grupos relativamente aos dois tipos de feedback
transmitidos (F(1,78) = 3.48; p= .066; Wilk's Λ = .957; partial η2= .043), ou
seja, tanto os indivíduos que recebem feedback negativo (M= 3.40, DP= 1.23)
como os indivíduos que recebem feedback de desenvolvimento após feedback
negativo (M= 2.99, DP= 1.32) (Quadro_5).
Por último, também procedemos à análise de correlações entre as variáveis em
estudo e a motivação intrínseca, para efeitos de controlo. Para as correlações
entre variáveis foi utilizado o critério de Cohen e Cohen (1983) para a sua
descrição. De acordo com este critério, as correlações são consideradas fracas
entre 0 e .20, moderadas entre .20 e .40 e fortes acima de .40. A motivação
intrínseca no primeiro e no terceiro momentos não se correlacionou com a
criatividade nem na primeira tarefa, nem com a segunda tarefa. No entanto, no
que se refere à motivação no segundo momento (embora não se correlacione com a
criatividade na primeira tarefa), todavia, correlaciona-se com a criatividade
na segunda tarefa (r = -.224, p = .046), o que significa que quanto maior é a
motivação intrínseca para a tarefa (no segundo momento em que é medida), menor
é o desempenho criativo do indivíduo na segunda tarefa. Além disso, os
indivíduos que receberam feedback de desenvolvimento, após o feedback negativo,
apresentam maiores níveis de motivação no terceiro momento, o único medido após
a receção de feedback (r= .256, p= .022).
Discussão
Esta investigação teve como principais objetivos estudar o efeito das
recompensas extrínsecas e do feedback negativo na criatividade. Embora o
impacto de recompensas extrínsecas na criatividade já tenha sido amplamente
estudado, os resultados são inconsistentes e não permitem uma tomada de posição
relativamente às opiniões defendidas (Klotz et al., 2012; Oldham & Baer,
2012). Neste estudo, foi utilizado um tipo específico de recompensas
identificado na literatura, as recompensas contingentes à criatividade.Ao
contrário do esperado, este tipo de recompensas extrínsecas não teve impacto
significativo no desempenho criativo dos indivíduos, o que vai contra aos
resultados obtidos por Byron e Khazanchi (2012). Ainda que este tipo de
recompensas providenciasse informação sobre o tipo de objetivos a serem
alcançados e sobre o tipo de comportamento valorizado e esperado nas duas
tarefas a desempenhar (e não minassem os sentimentos de autonomia e
competência) (Byron & Khazanchi, 2012), a recompensa não apresentou efeito
na criatividade.
Uma explicação possível para a promessa de recompensas não ter tido efeito no
desempenho criativo pode estar relacionada com as instruções dadas aos
participantes. A ambos os grupos (com e sem recompensa) foi explicitado que o
desempenho esperado era criativo (objetivo é gerar o máximo número de ideias
que quiser e que conseguir para resolver os problemas identificados). Neste
sentido, acabou por ser estabelecido um objetivo (Shalley, 1991) e um
requerimento aos participantes (Unsworth et al., 2005) para um desempenho
criativo. O efeito positivo do estabelecimento de objetivos para um desempenho
criativo já foi previamente demonstrado por Shalley (1991) e pode servir como
um mecanismo para induzir os indivíduos a desempenhar um nível desejado por
meio de um efeito de priming, que leva os indivíduos a alocarem o seu esforço e
atenção na criatividade. Ou seja, a promessa de recompensas pode não ter levado
os indivíduos a terem um desempenho criativo superior àquele incentivado pela
simples definição de objetivos criativos. Estes resultados, embora contrários
aos obtidos em estudos anteriores, são consistentes com a teoria da definição
de objetivos (Locke & Latham, 2002).
No que se refere ao impacto do feedback negativo na criatividade, tal como
sugerido por Zhou (1998), o feedback negativo, neste estudo, aparenta ter tido
impacto negativo do desempenho criativo dos indivíduos. Ainda que a diminuição
do desempenho criativo, da primeira para a segunda tarefa, não possa ser
atribuída com certeza ao feedback negativo (devido à não utilização de um grupo
de controlo), tendo em conta a distribuição aleatória e o controlo de
variáveis, a transmissão de feedback negativo é a causa mais provável para a
diminuição de desempenho identificada. No entanto, o impacto negativo do
feedback negativo na criatividade não aconteceu através da diminuição da
motivação intrínseca após a receção de feedback, como defendido por Zhou
(1998). Nesta investigação, a motivação intrínseca dos indivíduos para a tarefa
específica não se correlacionou com o desempenho criativo dos mesmos em tal
tarefa específica. Após as análises suplementares aos três itens utilizados
para classificar o desempenho criativo, os resultados indicaram que os
indivíduos aumentaram as classificações no item originalidade, ao contrário
dos itens utilidade e aplicabilidade, nos quais os indivíduos diminuíram o
seu desempenho. Desta forma, a diminuição do desempenho criativo aconteceu
provavelmente porque os indivíduos focaram-se no problema apresentado durante o
feedback negativo ' a originalidade - e esqueceram-se dos outros aspetos
relevantes para que uma ideia seja considerada criativa ' a utilidade e a
aplicabilidade. Estes resultados suscitam uma importante reflexão sobre o
impacto do feedback negativo no desempenho.
Neste estudo, o feedback negativo transmitido aparenta ter aumentado o
desempenho dos participantes relativamente ao problema identificado, o que nos
pode levar a pensar que a transmissão de feedback negativo informacional e
específico pode ser útil para a melhoria do desempenho. Por um lado, o feedback
específico permite que o indivíduo tenha conhecimento do aspeto onde teve um
mau desempenho, o que torna muito mais fácil a melhoria de tal aspeto,
especialmente em tarefas sem resposta óbvia (Lipnevich & Smith, 2009). Por
outro lado, o impacto positivo do feedback negativo no desempenho do indivíduo
pode estar relacionado com a teoria de estabelecimento de objetivos (Locke
& Latham, 2002). Quando o feedback é negativo, os indivíduos optam por
aumentar o nível de esforço quando existe um objetivo claro identificado e
quando o compromisso com o mesmo é elevado, tal como a crença da probabilidade
de sucesso é também elevada (Kluger & DeNisi, 1996). Novamente, ao encontro
da teoria de estabelecimento de objetivos, surge a importância do
estabelecimento de requerimentos (Unsworth et al., 2005). O requerimento
(através da ênfase na necessidade de mais originalidade nas respostas) pode ter
tido influência no desempenho. Desta vez, não um requerimento para a
criatividade (creative requirement) (Unsworth et al., 2005), mas um
requerimento para uma das facetas da criatividade, a originalidade. Também
relacionado com a teoria de estabelecimento de objetivos, Roskes, De Dreu e
Nijstad (2012) sugerem que os indivíduos motivados para evitar outcomes
negativos podem ser criativos quando a criatividade é percebida como funcional
para o alcance de um objetivo estabelecido, o que os motiva para um esforço
extra, através de um estilo de persistência cognitiva. Este argumento poderá
constituir uma justificação para o impacto positivo do feedback negativo, no
desempenho dos indivíduos, ao nível da originalidade.
Por último, sobre o feedback de desenvolvimento, os indivíduos que receberam
este tipo de feedback através da técnica do brainstorming individual não
tiveram resultados mais criativos do que os indivíduos que receberam apenas
feedback negativo. Na abordagem do brainstorming os indivíduos são encorajados
a gerar o máximo número de ideias, sem necessariamente pensar na sua qualidade
(Paulus & Yang, 2000). Desta forma, a avaliação das ideias em termos de
utilidade e aplicabilidade pode ter faltado. Todavia, os indivíduos que
receberam a técnica do brainstorming individual tiveram ideias ainda mais
originais do que os indivíduos que receberam apenas feedback negativo. Isto
sugere que o brainstorming individual pode ser uma boa técnica para gerar
ideias originais. Além disso, e mais importante, o feedback de desenvolvimento
aparece associado a uma maior motivação intrínseca no terceiro momento em que é
medida, o que coincide com a tarefa realizada após a transmissão de feedback.
Os indivíduos que receberam feedback de desenvolvimento apresentaram uma maior
motivação intrínseca do que os indivíduos que receberam apenas feedback
negativo. Este resultado está de acordo com um resultado obtido por Zhou (2003)
e sugere que ao proporcionar aos indivíduos uma estratégia útil à melhoria do
desempenho, pode fazer com que a sua motivação intrínseca aumente.
Limitações e aplicações práticas
Uma das limitações deste estudo refere-se à generalização dos resultados ao
contexto de trabalho. É possível que os resultados obtidos apenas se verifiquem
em laboratório, em tarefas relativamente curtas e num contexto no qual as
variáveis são controladas. Pelo contrário, no contexto de trabalho existem
outras variáveis que podem entrar em jogo e influenciar o possível impacto
tanto das recompensas extrínsecas quanto do feedback no desempenho criativo.
Além disso, o estudo também foi realizado com uma amostra de enfermeiros, o que
não nos permite generalizar a outras populações
Uma segunda limitação está relacionada com a não utilização de grupo de
controlo, no caso do feedback. Este facto não nos permite afirmar com certeza
de que o desempenho diminui após a transmissão de feedback devido à transmissão
do mesmo, nem que o aumento do desempenho do indivíduo no item originalidade
acontece devido ao feedback fornecido. No entanto, tendo em conta o controlo de
variáveis e a distribuição aleatória pelos grupos experimentais, a causa mais
provável para ambos os acontecimentos é a transmissão de feedback negativo.
Este estudo apresenta ainda uma terceira limitação referente à utilização de
apenas um expert para avaliação das ideias criativas dos indivíduos. A maioria
dos estudos (p.e. Shalley & Perry-Smith, 2001; Zhou, 1998) utiliza dois ou
mais experts como júris para a avaliação da criatividade. Neste estudo foi
apenas possível recolher a avaliação através de um indivíduo, que, todavia,
representa um cargo no conselho de administração do hospital e tem quase 30
anos de experiência na profissão e na organização.
Por último, em termos de limitações, podemos apontar também a ausência da
verificação da atratividade da recompensa pelos participantes. A atratividade
da recompensa pode constituir um fator condicionante para a motivação dos
indivíduos e para o seu desempenho criativo. De acordo com a teoria da
expectativa de Vroom (1964), o indivíduo determina a sua ação, com base nas
suas perceções, atitudes e crenças, como consequência para evitar sofrimento ou
aumentar o prazer. Porter e Lawler (1968) acrescentam ainda a esta teoria que o
esforço individual irá depender do grau em que um outcome é valorizado pelo
indivíduo. O valor ou atratividade da recompensa pode ter condicionado o
esforço do indivíduo para a resolução da tarefa. Num estudo experimental futuro
deverá ser realizada esta verificação. Aponta-se ainda a ausência de
verificação da motivação do expert durante a avaliação dos participantes. Ao
longo da tarefa, o expert poderá ter sofrido oscilações em termos de motivação
e fadiga, o que, por sua vez, pode ter interferido com sua avaliação das
ideias. Consideramos relevante que seja feita esta verificação num próximo
estudo experimental.
Em termos de aplicação prática, esta investigação acrescenta uma faceta
positiva ao feedback negativo. A transmissão de feedback negativo é um problema
frequente nas organizações. Não são só as chefias que evitam a transmissão
deste tipo de feedback, como igualmente os colaboradores muitas vezes falham em
melhorar o desempenho, em resposta a este tipo de feedback (Zhou, 2008). Neste
caso isso não se verificou. Os indivíduos melhoraram o desempenho no problema
identificado, o que sugere que o feedback negativo, se for transmitido de forma
informacional, específica e diretamente ligado à tarefa, pode ter um efeito
positivo no desempenho. Ainda, segundo este estudo, o brainstorming individual
apresenta-se como uma ferramenta útil à geração de ideias originais, mas não
necessariamente de ideias criativas. Isto porque, provavelmente, a discussão em
equipa é importante na fase de avaliação das ideias (para verificar a utilidade
e aplicabilidade das mesmas). No entanto, se desejarmos que os nossos
colaboradores gerem ideias com maior grau de originalidade, esta é uma boa
técnica a ser treinada.
Estudos futuros
Em suma, tendo em conta a discussão de resultados, levantam-se algumas questões
pertinentes para estudos futuros, nomeadamente ao nível da não existência de
relação entre as recompensas extrínsecas e o desempenho criativo. Seria
interessante perceber se o estabelecimento de um objetivo ou de um requerimento
para o desempenho criativo é mais saliente, pelo menos em contexto
laboratorial, do que a apresentação de recompensas extrínsecas. É também
importante refletir sobre a metodologia e design mais indicados para estudar o
efeito das recompensas extrínsecas na criatividade.
Relativamente à relação positiva entre o feedback negativo e o aumento da
originalidade nas ideias, além das justificações apresentadas na discussão dos
resultados, outra hipótese explicativa pode residir no impacto do humor
negativo na relação entre o feedback negativo e o desempenho indivíduo. De
acordo com George e Zhou (2002), o humor negativo pode levar a que os
indivíduos sejam mais críticos e mais exigentes a sinalizar a existência de
problemas ou a necessidade de melhoria. Estes dois aspetos podem ter feito com
que os indivíduos procurassem gerar respostas mais originais. Um estudo de
Kaufman e Vosburg (1997) vai ao encontro deste raciocínio, no qual os
indivíduos com estados de humor negativos tiveram um melhor desempenho criativo
em tarefas de resolução criativa de problemas do que os indivíduos com estados
de humor neutros ou positivos. Assim, pode ser interessante, em futuras
investigações, estudar a relação entre o feedback negativo e o humor negativo e
o impacto desta relação no desempenho criativo.