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EuPTHUHu1645-00862012000200006

EuPTHUHu1645-00862012000200006

variedadeEu
Country of publicationPT
colégioHumanities
Great areaHuman Sciences
ISSN1645-0086
ano2012
Issue0002
Article number00006

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Estudo da basic need satisfaction in general scale para a língua portuguesa

A teoria de auto-determinação (TAD) define-se como uma teoria de motivação, interessada em apoiar as tendências naturais e intrínsecas para um comportamento efectivo e saudável (Deci & Ryan, 1985, 2002; Ryan & Deci, 2000). Partindo da perspectiva clássica Aristotélica de desenvolvimento humano, que postula uma tendência activa para o crescimento psicológico e sua integração, a TAD foca a dialéctica entre o organismo activo, com orientação inata para o crescimento e o contexto social que suporta ou bloqueia as tentativas de dominar e integrar as experiências vivenciadas de forma unificada e auto-coerente (Deci & Ryan, 2002).

Actualmente, a TAD é composta por cinco mini-teorias (cognitive evaluation theory; organismic integration theory; causality orientations theory, basic psychological needs theory e goal contents theory), cada uma relacionada com uma faceta da motivação ou funcionamento da personalidade, que se articulam e partilham a metateoria organicista e dialéctica e o conceito de necessidades básicas, consideradas como inatas, universais e essenciais ao funcionamento óptimo (Deci & Ryan, 2002, 2009). No âmbito da TAD,necessidade significa os nutrientes psicológicos inatos essenciais para o continuo crescimento psicológico, integridade e bem-estar(Deci & Ryan, 2000) e necessidade básica é um estado que necessita de ser energizado, caso contrário contribui para a patologia e para o mal-estar (Ryan & Deci, 2000).

Uma das mini-teorias denomina-se teoria das necessidades psicológicas básicas, um postulado teórico formulado para fornecer uma interpretação teórica a vários resultados empíricos (Deci & Vansteenkiste, 2004), que foca a importância das necessidades psicológicas com o bem-estar, defendendo que o grau de satisfação, com flutuações diárias e ao longo da vida, das três necessidades psicológicas básicas 'competência, autonomia e relações de pertença' é preditor do bem-estar psicológico e do funcionamento óptimo (Deci & Ryan, 1985, 2002; Reis, Sheldon, Gable, Roscoe, & Ryan, 2000; Ryan, 1995; Ryan & Deci, 2000). Estes resultados também se verificaram num estudo com mulheres portuguesas (Vieira, et al., 2011). A necessidade de competência é satisfeita ao experienciar que nas interacções e na busca activa para desenvolver capacidades se obtém os resultados desejados com eficácia (Deci & Ryan, 2002; Reis, Sheldon, Gable, Roscoe, & Ryan, 2000). a necessidade de autonomia é satisfeita ao agir de acordo com os valores integrados (Deci & Ryan, 2002); ou, expresso de outra forma, na possibilidade do comportamento ser auto-determinado (Ryan, Bernstein, & Warren Brown, 2010). A satisfação nas relações de pertença consiste em sentir-se próximo e ligado a outros significativos (Meyer, Enström, Harstveit, Bowles, & Beevers, 2007; Reis, et al., 2000), a uma tendência à proximidade e o desejo de ligação com outros (Wei, Shaffer, Young, & Zakalik, 2005); ou seja, a vivenciar relações de pertença gratificantes com outros significativos e com a comunidade.

Os contextos sociais têm impacto no bem-estar ao apoiarem ou bloquearem a satisfação das necessidades (Deci & Ryan, 1985, 2002; Ryan & Deci, 2000). O funcionamento saudável e o bem-estar aumentam quando as acções e interacções satisfazem as necessidades psicológicas básicas (Reis, et al., 2000). Os comportamentos naturais que compelem à acção, com o objectivo de satisfazer as necessidades, diferem mediante o sujeito, o tempo, a situação e a cultura mas se tiverem sucesso são experienciados resultados psicológicos positivos (Deci & Ryan, 2000, 2002).

A satisfação das necessidades psicológicas básicas é o processo psicológico central pelo qual a motivação intrínseca, a tendência inata integrativa e persecução de objectivos intrínsecos são facilitados, resultando em bem-estar e funcionamento óptimo (Deci & Vansteenkiste, 2004). Deci e Ryan (1995, 2000, 2002) propõem dois tipos de instrumentos para aferir as necessidades psicológicas básicas, um para medir a satisfação das necessidades em geral e outro em domínios específicos, como o domínio (a) do trabalho; (b) das relações interpessoais e (c) do exercício físico.

A Basic Need Satisfaction in General Scale (BNSG), que teve origem na adaptação da Basic Needs Satisfaction at Work Scale(TAD; Gagné, 2003; Johnston & Finney, 2010), é um questionário de auto-preenchimento,com livre acesso no sítio da self-determination theory(SDT), ou TAD,da Universidade de Rochester1 e é o instrumento proposto pelos autores para aferir as necessidades de satisfação em geral. Composto por 21 itens, com uma escala de resposta tipo Likert de sete pontos, divididos por três subescalas, que correspondem às três necessidades psicológicas básicas (a) com sete itens na subescala da autonomia, (b) com seis itens na subescala da competência e (c) oito itens para a subescala das relações de pertença. O instrumento tem flexibilidade para ser utilizado com as três subescalas agregadas ou com cada uma das subescalas de forma independente. Os autores, Deci e Ryan, referem que alguns estudos optaram por utilizar três itens por subescala num total de nove itens. É um instrumento construído a partir da teoria, razão pela qual os autores nunca se debruçaram muito sobre a sua estrutura com base na investigação estatística.

Johnston e Finney (2010) analisaram pela primeira vez a estrutura factorial do instrumento optando pela análise factorial confirmatória para testar a solução factorial de um e de três factores. Como não obtiveram um modelo ajustado aos dados optaram pela redução da escala para 16 itens. Conforme as autoras afirmam, apesar de existirem vários estudos onde o questionário foi utilizado, não um artigo dos autores originais com as qualidades psicométricas do instrumento nem outros estudos sobre a estrutura factorial.

Ryan (2011) elucida que a obtenção de uma solução factorial com três factores depende do contexto de avaliação, podendo por vezes ser esperado, e até pretendido, outro tipo de solução. Como, e.g., a um nível geral de avaliação as três diferentes necessidades podem demonstrar o quanto se integram ao saturarem num factor comum. Também alerta que a análise factorial, como técnica útil para apurar constructos independentes, não deve ser considerada como o mais importante indicador de validade, nem a ela subjugar a construção de questionários sob pena de ser redutor e teoricamente empobrecedor. Deverá ser considerado um conjunto de resultados de análises a vários níveis, sendo essencial na interpretação dos resultados o suporte da teoria.

O anterior vem ao encontro com o defendido por Messick (1989), que define validade como uma avaliação global do grau em que as evidências empíricas e as fundamentações teóricas apoiam a adequação e a pertinência das interpretações e acções, com base nos resultados dos testes ou outros modos de avaliação. Para Messick (1995) a concepção tradicional de validade (conteúdo, critério e constructo) é incompleta, fragmentada e descura as implicações das interpretações dos resultados como base para a acção e as consequências sociais. Este autor defende uma ideia unificada de validade com seis aspectos (conteúdo, substantivo, estrutural, generalização, externa, consequencial) que funcionam como um critério geral de validade.

A adaptação deste instrumento para a população portuguesa justifica-se pela elevada aplicabilidade da TAD e utilidade na prática clínica mas também pela ausência de estudos das qualidades psicométricas do questionário, principalmente a nível da sua estrutura factorial.

O objectivo do estudo é descrever o processo de adaptação da versão portuguesa da BNSG e contribuir para o estudo métrico da escala.

MÉTODO Foram realizados dois estudos, um com amostras de conveniência da comunidade do Sul do país e outra do Norte.

Adaptação à língua portuguesa Após autorização dos autores do questionário, procedemos à sua tradução e adaptação à população portuguesa. O instrumento foi submetido ao processo de tradução, retroversão e retradução com dois tradutores bilingues independentes, sendo que na retroversão não houve acesso à versão original. Após análise e discussão de uma versão de consenso, tendo em vista uma população alargada, surgiram alternativas para alguns dos itens (e.g., for myself; sense of accomplishment; I pretty much keep to myself and don't have a lot of social contacts) que foram apresentadas a dois peritos na área de psicologia para assegurar a validade de conteúdo e equivalência lexical e cultural.

Em paralelo, num informal pré-teste, por e-mail, seguido de reflexão falada em formato de entrevista com dez participantes, com idades entre os 26 e 50 anos, foi apresentado um questionário com duas ou três alternativas semelhantes, da versão consenso, e solicitado para optarem pela que preferissem. Com o objectivo de melhor aferir a compreensibilidade e adequabilidade dos itens.A ausência de ajuste dos itens ao género do leitor foi notada e mencionada por dois participantes, do género feminino, na reflexão falada, pelo que foi efectuada essa alteração, na versão portuguesa, da BNSG.

Por último, a nível gráfico, o instrumento foi uniformizado com os questionários Perceived Competence e Health Care Climate Questionnaire, da TAD, adaptados à população portuguesa por Mestre e Ribeiro (2008).

Os procedimentos de adaptação à língua portuguesa no estudo 2 foram idênticos ao do estudo 1 com as seguintes excepções: o pré-teste foi efectuado a dois grupos de alunos universitários (uma turma de ciclo, ano; e uma turma de mestrado ano, ambos de cursos de exercício e saúde, correspondendo a 45 alunos). Após o preenchimento, foi proporcionado um momento de discussão acerca de problemas sentidos, dificuldades na compreensão de itens ou outros. As notas retiradas deste pré-teste foram discutidas pelos investigadores e tradutores da escala até se chegar ao consenso final dos itens do questionário.

O questionário final foi depois harmonizado graficamente com outros questionários como, por exemplo, o Behavioral Regulations for Exercise Questionnaire-2 (Palmeira, Teixeira, Silva, & Markland, 2007) e um conjunto de questões demográficas.

Material O material utilizado consistiu num questionário sociodemográfico e na versão portuguesa da BNSG. No questionário sociodemográfico constavam questões sobre a idade, género, escolaridade, estado civil, eventual incapacidade física ou mental.

A versão portuguesa da BNSG (Anexo A) do instrumento que a TAD propõe, de 21 itens, para aferir se as três necessidades básicas estão a ser satisfeitas, é composto por três subescalas, (autonomia, competência e relações de pertença).

Com sete itens, na subescala de autonomia (e.g., Sinto-me livre para decidir por mim próprio/a como viver a minha vida. ou Na minha vida diária tenho que fazer frequentemente o que me mandam). Na subescala da competência, seis itens (e.g., Frequentemente não me sinto muito competente ou Fui capaz de aprender recentemente novas competências interessantes). E a subescala das relações de pertença composta por oito itens (e.g., Dou-me bem com as pessoas com quem contacto ou Sou uma pessoa reservada e não tenho muitos relacionamentos sociais).

Os itens são avaliados numa escala de resposta tipo Likert de 7 pontos (de 1 =Nada verdadeiroa7 = Totalmente verdadeiro). A pontuação é efectuada pelo somatório das respostas dos itens de cada subescala após inversão da pontuação dos itens negativos. Os valores mais elevados correspondem a um maior grau de satisfação das necessidades.

Análise estatística O tratamento estatístico dos dados foi efectuado na versão 15.0 do software estatístico Statistical Package for Social Sciences (SPSS). Os procedimentos estatísticos utilizados no SPSS consistiram na análise descritiva, cálculo da consistência interna (alpha de Cronbach) e na análise factorial exploratória em componentes principais.

Estudo 1 Participantes Participaram no estudo 420 indivíduos (58% mulheres e 42% homens), com intervalo idades entre os 18 e os 85 anos (M= 39,99, DP= 11,89), seleccionados aleatoriamente da população em geral abrangendo diferentes estatutos socioeconómicos, estados civis e níveis de escolaridade. A condição de participação foi a idade superior a 18 anos.

Procedimento A recolha de dados foi efectuada por via electrónica (i.e., e-mail) ou em papel, para abranger uma população mais alargada. Ambos estruturados de igual forma, com uma nota introdutória inicial, seguida do questionário sóciodemográfico e por fim a versão portuguesa da BNSG. Os participantes foram informados ' por informação constante na nota introdutória ' sobre (a) identificação institucional dos investigadores; (b) objectivo do estudo; (c) que a participação era voluntária; (d) os dados recolhidos eram anónimos e confidenciais; e (e) da importância da sua participação.

O tempo de administração foi de sete minutos, em média.

RESULTADOS O instrumento, considerando a estrutura original com itens propostos, apresenta uma boa consistência interna global, uma consistência interna aceitável na subescala das relações de pertença e uma baixa consistência interna nas subescalas da autonomia e competência (Quadro 1).

Quadro_1 Comparação dos alpha de Cronbach de ambos os estudos

Os 21 itens, da versão portuguesa, foram submetidos à análise factorial exploratória, com método de extracção em componentes principais (ACP), rotação varimax e critério de normalização de Kaiser. Os valores de Kaiser (KMO = 0,87) e teste de esfericidade de Bartlett (0,0001) revelaram adequabilidade para a realização da análise.

Depois de efectuada a ACP, bem como a observação do scree plot, foram encontrados três componentes com eigenvalue superior a 1, que explicam 44,9% da variância (figura 1). A carga no primeiro componente é elevada, sendo a maioria acima de 0,40, sugerindo a adequação da existência de um único factor. Foram obtidas correlações moderadas entre as subescalas (entre 0,56 e 0,59), relacionadas positiva e significativamente entre si (p < 0,001).

Figura 1 Scree Plot do estudo 1

DISCUSSÃO A ACP da versão portuguesa da escala não confirma a distribuição dos itens nos três componentes propostos no instrumento original. Os resultados obtidos na população portuguesa corroboram os de Johnston e Finney (2010), na população americana, onde emergem três componentes no scree plot, com a maioria dos itens a apresentar carga apropriada no primeiro factor.

Estudo 2 Participantes Participaram no estudo 408 indivíduos (51% mulheres e 49% homens), com intervalo idades entre os 18 e os 75 anos (M= 35,05, DP= 11,91), praticantes de exercício em contextos de ginásios e health-clubs, abrangendo diferentes estatutos socioeconómicos, estados civis e níveis de escolaridade. A condição de participação foi a idade superior a 18 anos.

Procedimento A recolha de dados foi efectuada no âmbito de um estudo alargado sobre a adesão ao exercício em contextos de ginásio e health-clubs. Foi pedida autorização às instituições, após o que os questionários foram entregues aos sócios que se voluntariaram para o estudo. A bateria de questionários teve uma estrutura semelhante ao estudo 1.

RESULTADOS O valor de Kaiser-Meyer-Olkin foi de 0,82 e o teste de esfericidade de Bartlett revela significância estatística (0,0001). Os três componentes da ACP explicam 41,1% da variância total. O scree plot também sugere três componentes (figura 2). A maioria dos itens satura no primeiro factor, que explica 23,6% da variância. As correlações entre as subescalas também são estatisticamente significativas mas moderadas (entre 0,43 e 0,53). A consistência interna das subescalas é baixa também neste estudo (Quadro_1)

Figura 2 Scree Plot do estudo 2

DISCUSSÃO Optamos pela análise factorial exploratória seguindo as recomendações de Gorsuch (1988) que alerta para o uso indevido da análise factorial confirmatória com funções exploratórias. Não nos pareceu apropriado alterar a escala com base em critérios estatísticos, por considerarmos que os critérios conceptuais são sempre mais importantes, nem de recorrer a procedimentos de data torturing como Mills (1993) os apelida.

Os valores de alpha de Cronbach, das subescalas da autonomia (0,58 e 0,67) e da competência (0,57 e 0,64), são baixos se considerarmos os padrões psicométricos recomendados, o que, dados o número reduzido de itens não é estranho. A consistência interna da escala global é apropriada.

Estamos de acordo com Boyle (1991), que num artigo sobre se a homogeneidade do item indicaria consistência interna ou redundância nas escalas psicométricas, defende, citando diferentes autores, que uma alta consistência interna não equivale a fidelidade, podendo ser indicador de redundância e afunilamento de uma escala. Melhorar a fidelidade em constructos dinâmicos, que estudam o comportamento em diferentes situações, pode significar perder informação relevante (Rotter, 1990; Schwartz & Daltroy, 1999).

O estudo 2 confirma os resultados do estudo1, sugerindo a unidimensionalidade do instrumento, embora a utilização das três subescalas, em conjunto ou em separado, pareça ser apropriado.

CONCLUSÕES Ambos os estudos pretendem contribuir para o estudo da BNSG à língua portuguesa, com o objectivo de se obter a versão portuguesa do instrumento. A informação preliminar recolhida sugere que as necessidades básicas de autonomia, competência e relações de pertença constituem dimensões importantes na TAD, embora a análise estrutural formal da escala nunca tenha encontrado os três componentes e os valores psicométricos tendam a ser baixos.

Ryan (2011) refere-se a este aspecto e defende a versatilidade da estrutura do instrumento consoante o contexto de avaliação. Na prática, é expectável a um nível geral de avaliação que, para uma necessidade ser satisfeita as outras também o sejam. As três necessidades, ao apresentarem-se significativamente correlacionadas e com saturações cruzadas, pode significar o funcionamento integral das necessidades. Ou seja, a escala foi inicialmente desenvolvida com base na teoria sem preocupações de ajustamento psicométrico. Como Rotter (1990) defende, os métodos estatísticos são ferramentas úteis mas não substituem a teoria do comportamento. Assim, propomo-nos assumir esta perspectiva de não valorização excessiva dos aspectos métricos da escala, valorizando antes os aspectos teóricos, embora os valores psicométricos encontrados, sejam apropriados não apenas pela sua magnitude, como pela consistência entre os nossos dois estudos, como também com outros estudos que inspecionaram as propriedades métricas.

Em suma, pela sua utilidade e comprovada validade de conteúdo, a escala pode ser utilizada na população portuguesa no formato proposto pelos autores na versão original ou seja com as três subescalas ou dimensões. O instrumento tem potencialidade para se tornar mais depurado à medida que surgirem novos contributos sobre as necessidades básicas subjacentes ao bem-estar e funcionamento óptimo.


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