Diplomacia e fiasco. Repensando a participação brasileira na Liga das Nações:
elementos para uma nova interpretação
No prefácio à primeira edição de Vinte anos de crise, publicada em 1939, pouco
após a invasão da Polônia por Hitler, E. H. Carr escreve que a "próxima
conferência de paz, se não quiser repetir o fiasco da última, terá de se
preocupar com assuntos mais fundamentais do que o traçado de fronteiras"2. Por
que "fiasco"? Porque, para Carr, a Primeira Guerra Mundial havia sido a
expressão da exaustão da ordem liberal " econômica e política " do século XIX e
o Tratado de Versalhes, produto da ilusão de que a continuidade daquela ordem
seria possível. Princípios como o da autodeterminação nacional, do comércio
livre e da segurança coletiva, tidos como supostamente absolutos, baseavam-se
na idéia liberal de uma natural harmonia de interesses3. A diplomacia do
entreguerras, incluindo-se aí notoriamente a que se passava no âmbito da Liga
das Nações, viveria ainda "vinte anos de crise" para dar lugar a um novo
século.
Notava ainda Carr que, com a guerra que se iniciava em 1939, tornava-se "quase
inevitável e fácil atribuir a catástrofe às ambições e à arrogância de um
punhado de homens, sem buscar uma explicação". No entanto, ponderava, "mesmo
quando a guerra já devasta, pode haver mais importância prática numa tentativa
de analisar as causas subjacentes e significativas do desastre, do que razões
imediatas e pessoais"4.
A busca de "causas subjacentes e significativas" deve também ser tentada para
entender um outro fiasco, também geralmente visto na perspectiva da ação de um
"punhado de homens": o veto brasileiro à adesão alemã à Liga das Nações, em
1926, e a posterior retirada brasileira da organização internacional.
O conjunto dos estudos brasileiros sobre a participação do Brasil na Liga das
Nações é praticamente unânime ao avaliá-la como um fiasco, resultante de
motivações notoriamente domésticas. De fato, os quatro anos do mandato
presidencial de Artur Bernardes coincidem com um período de forte crítica e
abalo das bases de funcionamento da Primeira República, em que grandes fissuras
aparecem no sistema político. É nesse momento, marcadamente autoritário, que o
governo brasileiro concentrará esforços para obter um assento permanente no
Conselho da Liga das Nações, fazendo, portanto, apelo à saída utilizada com
freqüência por governos que fazem frente a graus acentuados de instabilidade: a
busca de objetivos de política externa como artifício para apaziguar movimentos
de oposição e desviar a atenção dos problemas de política interna.
O principal objetivo do presente estudo é o de demonstrar que a historiografia
brasileira tem magnificado a responsabilidade brasileira nos acontecimentos de
março de 1926 na Liga das Nações e que se concentra demasiadamente nas
motivações do governo de Artur Bernardes, sem considerar aspectos decisivos
concernentes à política internacional, notadamente a européia, e questões de
ordem institucional próprias da Liga. Portanto, parece mais do que importante
inserir internacionalmente a diplomacia de Bernardes, ou seja, pensá-la no
contexto do fiasco da própria diplomacia internacional, dos "vinte anos de
crise".
Por fim, a análise desse episódio pode contribuir para a melhor compreensão do
atual momento da diplomacia brasileira junto à Organização das Nações Unidas
(ONU), particularmente no que diz respeito à candidatura do Brasil a um assento
permanente no Conselho de Segurança.
1. Os anos na Liga: revisitando o histórico
1.1. Os frutos da guerra (1920-1923)
Dizia um representante britânico, em 1921, que o grande interesse demonstrado
pelos brasileiros com relação à Liga das Nações explicava-se "provavelmente não
porque têm o menor conhecimento ou interesse pelos problemas europeus atuais,
mas simplesmente porque a indicação de brasileiros notáveis para postos
importantes no Conselho e na Corte Permanente [de Justiça Internacional]
aumenta o orgulho nacional."5
De fato, se considerações de prestígio não são negligenciáveis para motivar a
participação dos países latino-americanos na Liga das Nações, sem interesses
vitais a defender em seu âmbito, parece evidente que, no caso do Brasil, a
busca do prestígio e a oportunidade que a Liga oferece para alcançá-lo não
podem ser negligenciados. Por ter participado na Primeira Guerra Mundial junto
aos Aliados, o Brasil torna-se membro fundador da Liga das Nações, iniciando-
se, assim, à prática do multilateralismo político e universal, e de todas as
novidades que trazia - até então, as Conferências Pan-americanas e a
Conferência de Haia de 1907 haviam sido os únicos fóruns internacionais em que
havia participado. Mais importante: o Brasil é também indicado para ocupar um
dos quatro assentos não permanentes do Conselho da Liga no primeiro ano de
funcionamento do órgão, 1920, sendo reeleito para ocupar o mesmo assento
continuamente até 1925.
Essas questões adquirem maior significado quando se tem em mente o contexto
histórico vivido pela diplomacia e pela elite brasileira naquele momento. Fazer
parte da Liga representa "uma oportunidade única para o Brasil reforçar seu
status internacional, contando com o beneplácito das grandes potências"6.
Ampliar sua esfera de atuação, saindo dos parâmetros do americanismo, para
lançar-se em um empreendimento extra-continental. A sua presença na Liga,
portanto, representa um breve interregno universalista, que não deixa em
absoluto de estar calcado na visão de um mundo anárquico no qual a diplomacia
deve guiar-se pela busca do aumento dos recursos de poder7.
O Brasil estabelece, assim, com a Liga uma colaboração regular e mais
expressiva do que qualquer outro país latino-americano, como apontado pela
historiografia que trata especificamente da Liga das Nações e por autores
clássicos, a exemplo de Martin Wight: "Após o Acordo de Paz de 1919, existiam
várias potências semigrandes, cada qual querendo ser reconhecida como grande
potência. (...) O Brasil, com uma população de tamanho semelhante à da Polônia,
era a mais importante potência americana em Genebra, uma vez que os Estados
Unidos haviam decidido não fazer parte da Liga."8
Há que se considerar, no entanto, que durante os três anos da presidência
Epitácio Pessoa (1919-1922), que coincidem com os primeiros anos de
funcionamento da Liga, os delegados brasileiros em Genebra agem com bastante
autonomia, podendo ser creditados aos seus esforços espontâneos, e não a
instruções recebidas do Rio de Janeiro, os resultados quanto ao que poderia ser
de interesse brasileiro na organização internacional9. Com relação às bem-
sucedidas eleições para o Conselho durante as Assembléias de 1920, 1921 e 1922,
o Brasil, como os demais membros temporários do órgão, beneficia-se de
circunstâncias momentâneas que têm a ver, notadamente, com a ausência de regras
para a renovação desses assentos10.
O Pacto simplesmente estabelece em seu artigo 4º que os assentos temporários do
Conselho devem ser "escolhidos livremente pela Assembléia e nos momentos por
ela designados". Em 1921, é aprovada uma emenda ao artigo 4º do Pacto,
estabelecendo a competência da Assembléia para regulamentar o processo de
eleição ao Conselho. Dependendo da ratificação de todos os membros do Conselho,
a emenda só entra em vigor em 1926, quando a Espanha, então único membro do
Conselho que ainda não o fizera, decide ratificá-la. A resistência do governo
espanhol em ratificar a emenda ao artigo 4º torna-se mecanismo de pressão para
obter um assento permanente no Conselho, comprometendo a definição dessa
questão essencial, ou seja, a fixação de regras para as eleições dos membros
temporários do Conselho. Por longo tempo, a Espanha aposta no apoio britânico
para alcançar, com exclusividade, um assento permanente no Conselho. Já o
Brasil deposita o instrumento de ratificação da emenda junto ao Secretariado da
Liga em julho de 192311.
Em 1922, aumenta-se de quatro para seis o número de membros temporários do
Conselho e, contrariando diversas recomendações votadas em sessões anteriores,
no sentido de que nas eleições dos membros temporários do Conselho fosse
adotado o princípio da rotatividade e da distribuição geográfica, vota-se uma
recomendação visando a conferir um mandato de três anos aos membros
temporários, como forma de assegurar a continuidade de ação do Conselho. Os
Estados que tivessem permanecido três anos no Conselho tornar-se-iam
inelegíveis por igual período, ficando definida uma renovação anual de um terço
dos membros eletivos12.
Segundo esse sistema, o Brasil deveria ser substituído no Conselho em 1923 -
assim como a Espanha e a Bélgica -, o que alteraria totalmente sua situação na
Liga. Esse é o contexto que coincide com o começo do mandato presidencial de
Artur Bernardes (1922-1926). Com as chances de reeleição ao assento no Conselho
fortemente diminuídas, o novo governo estabelece como um dos objetivos de sua
política externa a obtenção de um assento permanente no Conselho da Liga13.
1.2. Obter sucesso e a agradar a todos: a impossível fórmula para alcançar o
assento permanente
Afrânio de Mello Franco é escolhido por Bernardes para chefiar a delegação
brasileira à Assembléia de 1923. Pouco antes de deixar o Rio de Janeiro, Mello
Franco recebe de Genebra um relatório pessimista quanto às possibilidades de o
Brasil ser reeleito para o Conselho naquele ano. Entre outras questões, o
relatório fazia referência às dificuldades de entendimento com os países
latino-americanos. Ou seja, Mello Franco parte para sua missão consciente das
dificuldades que iria enfrentar14. Parte também com instruções do governo - de
Bernardes e de Felix Pacheco, seu Ministro das Relações Exteriores - para
buscar criar dois novos assentos permanentes no Conselho, para o Brasil e para
a Espanha15.
Ao chegar em Genebra, Mello Franco faz alterações nas instruções
governamentais. Sugere ao Conselho que um único assento permanente seja criado
e ocupado pela Espanha até a entrada da Alemanha. O Brasil ocuparia o assento
previsto para os Estados Unidos, mas vago pelo fato de o congresso norte-
americano não ter ratificado o Tratado de Versalhes, do qual o Pacto da Liga
era um anexo. Sendo a participação norte-americana na Liga cada vez mais
remota, Mello Franco vê nesse arranjo uma forma de manter o Brasil no Conselho
indefinidamente16.
Segundo o próprio Mello Franco, sua fórmula é relativamente bem recebida pelos
membros do Conselho, com exceção de Robert Cecil, representante britânico, que
se opõe categoricamente ao aumento do número de membros permanentes17, e do
representante espanhol, Quiñonez de León, que declara que seu país jamais
aceitaria guardar um lugar para a Alemanha. Mello Franco adapta, então, sua
fórmula, sugerindo que a Espanha representasse no Conselho os países hispano-
americanos18.
Apesar da resistência do Presidente da República e do Ministro Félix Pacheco às
modificações feitas à fórmula original, que previa a criação de dois assentos
permanentes para o Brasil e para a Espanha - sobretudo quanto à idéia de o
Brasil substituir os Estados Unidos, que poderia ser interpretada como ato de
"vassalagem à grande República"19 -, Mello Franco escreve confidencialmente a
Robert Cecil, León Bourgeois, representante belga, e Hjalmar Branting,
representante sueco, expondo em detalhes sua fórmula. Encontra-se, inclusive,
com Cecil, em mais uma tentativa de convencê-lo: fala-lhe da decepção de seu
governo com a atitude britânica, maior obstáculo às aspirações brasileiras, e
sai do encontro convencido de que a posição britânica havia mudado, já que
Cecil prometera examinar "com simpatia" a fórmula brasileira20.
O tempo demonstrará o excessivo otimismo de Mello Franco, pois a oposição
britânica não desaparece. Pelo menos naquele ano, no entanto, e apesar das
recomendações aprovadas em anos anteriores, a Assembléia, a uma única exceção,
reelege os membros temporários em exercício.21
As crescentes dificuldades para a reeleição ao Conselho fazem com que o governo
brasileiro - "segundo círculo diplomático do continente e um dos maiores da
atualidade"22, em sua avaliação - se organize melhor para converter os governos
estrangeiros à sua causa. Em março de 1924, cria uma embaixada junto à Liga.
Afrânio de Mello é nomeado embaixador e Raul Fernandes embaixador em missão
especial, com a função de auxiliá-lo. No verão europeu de 1924, Raul Fernandes
vai a Londres, Paris, Haia, Praga, Estocolmo e Bruxelas. Dos contatos mantidos,
acaba persuadido da justeza das modificações feitas por Mello Franco na fórmula
original do governo, pois percebe a resistência européia e dos latino-
americanos à idéia de criar-se um assento permanente para o Brasil, e da
importância de insistir-se sobre o argumento geográfico ou continental, já que
existia posição geral favorável a que o Brasil ocupasse o assento dos Estados
Unidos ("do continente americano")23.
Também em 1924, o governo brasileiro dá início a uma campanha no Brasil,
intensificada em 1925, para divulgar seu objetivo de obter um assento
permanente no Conselho da Liga, o que passa a ser divulgado nos jornais
cariocas pró-governo com muita intensidade. Na época, o embaixador francês no
Rio de Janeiro, Alexandre Conty, escreve a Paris repetidas vezes sobre a
atenção apaixonada que o Ministro Félix Pacheco demonstra com relação ao papel
brasileiro na Liga. O embaixador menciona que "assim que um representante do
Brasil se manifestava em Genebra, seu gesto era informado a todos os jornais do
Rio de Janeiro (...); as palavras que havia pronunciado eram, assim,
reproduzidas por extenso"24.
A Assembléia de 1924 se realiza sem que a emenda ao artigo 4º esteja em vigor e
reelege ao Conselho o Brasil e os demais cinco países membros temporários
eleitos no ano anterior25. Mais uma vez os delegados brasileiros têm a
satisfação de comunicar ao governo no Rio que o Brasil permanecia no Conselho,
mas as preocupações quanto ao futuro acentuam-se, já que uma nova reeleição é
tida como totalmente impossível26.
1.3. O problema alemão
Durante a Assembléia de 1924, o governo alemão encaminha um memorando aos
governos com assento no Conselho a fim de consultá-los sobre a adesão da
Alemanha à Liga das Nações27. Até então, o governo francês mostrara-se
inflexível com relação ao "perigo alemão", mas com a substituição de Raymond
Poincaré por Aristide Briand a adesão da Alemanha tornava-se possível28. O
memorando objetiva saber se o governo alemão contaria com o apoio do Conselho
para aderir à Liga e em que condições a adesão se daria. A admissão acompanhada
de um assento permanente no Conselho seria o reconhecimento da condição da
Alemanha de grande potência e entrevê o fim de seu isolamento. De todo modo, a
adesão sem a concessão do assento permanente no Conselho é vista como
intolerável pela opinião pública na Alemanha, onde a Liga das Nações, por ser
inseparável do Tratado de Versalhes, é conhecida como "liga dos inimigos"29.
Os governos britânico e francês respondem que tais questões deveriam ser
endereçadas à Liga e não tratadas bilateralmente. Adiantam, entretanto, que não
fariam objeção a que a Alemanha recebesse um assento permanente no Conselho no
momento de sua adesão30. O governo brasileiro, por sua vez, afirma que o
"Brasil não tem nenhuma objeção a priori à entrada da Alemanha como membro da
Sociedade das Nações, [e que] ao contrário, deseja que essa entrada se
concretize. Nesse sentido, em princípio, o Brasil não se opõe a que esse novo
membro obtenha um lugar permanente no Conselho." E completa: "o governo do
Brasil (...) acha que as questões levantadas com relação aos desejos expressos
pela Alemanha são de natureza que não devem ser tratadas de governo a governo
mas, de preferência, expostas e discutidas pelo conjunto dos membros da
Sociedade e no seio da mesma (...)."31 A resposta utilizava-se, portanto, de
termos suficientemente vagos para inspirar dúvidas sobre o apoio brasileiro às
condições da adesão alemã.
Em abril de 1925, Régis de Oliveira é nomeado embaixador em Londres. No
primeiro encontro oficial com Austen Chamberlain, Ministro britânico dos
Negócios Estrangeiros, no dia 26 de abril, dá prioridade à questão da
candidatura brasileira ao Conselho. A reação de Chamberlain não apresenta
novidade: explica a Régis de Oliveira que todos os países com assento
temporário no Conselho haviam apresentado a mesma solicitação e que seu
"problema não era defender qualquer país, mas sim de justificar uma escolha
particular face às reivindicações contraditórias e a necessidade de conservar
um equilíbrio entre os membros permanentes e temporários."32 Meses mais tarde,
no dia 30 de julho, o embaixador reencontra Chamberlain, entregando-lhe um
longo memorando confidencial que expõe em detalhes o ponto de vista do Brasil
sobre a composição do Conselho, memorando que é também enviado aos demais
governos com assento no Conselho.
O memorando brasileiro lembra que o Brasil havia ratificado a emenda ao artigo
4º do Pacto, o que demostrava sua boa vontade com relação à necessidade de
estabelecer-se um procedimento quanto à eleição dos membros temporários - a
Espanha, outra perpétua candidata, ainda não o havia feito -, e que até então,
o Brasil havia sido continuamente reeleito para um assento que o próprio Pacto
havia-lhe atribuído. Afirma que "a entrada da Alemanha na Liga das Nações [...
e sua admissão] como membro do Conselho agravará o desequilíbrio, aliás, já
existente, na representação dos diversos continentes nos assentos permanentes
do Conselho. Com efeito, enquanto a Europa terá, a partir de então, quatro
representantes permanentes no Conselho, a América não terá nenhum. E isso não
ocorrerá sem dar aos Estados Unidos o forte argumento em favor de sua tese
segundo o qual a Liga das Nações é um instrumento de política européia a
serviço de uma aliança entre os governos das grandes potências." O Brasil não
se opõe à permanência da Espanha no Conselho, mas enfatizava que se esse
assento lhe fosse acordado, o número de Estados europeus permanentes no
Conselho aumentaria ainda mais. Na hipótese da aplicação do sistema de rodízio
e da substituição do Brasil por um outro Estado latino-americano, um novo
desequilíbrio se criaria, pois, se um assento havia sido atribuído à Espanha,
os países hispano-americanos seriam representados por dois Estados, enquanto o
ramo lusófono não teria nenhum representante no Conselho. O memorando busca
demonstrar, finalmente, que a "solução mais justa" seria de "manter o Brasil no
Conselho por um outro meio que não o sufrágio universal". Entretanto, "caso se
desejasse, com uma flagrante injustiça, fazer prevalecer para a América somente
as objeções relativas ao aumento do número de membros permanentes no Conselho
(...), dever-se-ia manter o assento reservado aos Estados Unidos pelo artigo 4º
e que esse assento seja ocupado provisoriamente pelo Brasil, até que a grande
República junte-se novamente à Liga das Nações."33
Em 11 de setembro de 1925, Mello Franco encontra-se com Chamberlain em Genebra.
Discutem demoradamente sobre a questão da ampliação do Conselho. Chamberlain
reitera o que já havia afirmado ao embaixador Régis de Oliveira e acrescenta
que qualquer transformação na composição do Conselho poderia levantar suspeitas
por parte da Alemanha no sentido de que as grandes potências visariam criar
vozes incondicionais em seu favor. O delegado britânico lembra que
representantes da Alemanha estariam presentes à conferência que se reuniria
dentro de algumas semanas em Locarno, ocasião apropriada para decidir-se sobre
o futuro do Conselho34.
Viu-se que, em 1924, o governo alemão havia anunciado sua intenção de aderir à
Liga e de obter um assento permanente no Conselho, enquanto que o Brasil e a
Espanha continuavam a insistir sobre suas reivindicações. As sessões da
Assembléia haviam chegado apenas a soluções provisórias, com valor unicamente
moral, no sentido de que fosse empregado um sistema de rotatividade e que se
observassem as diversidades geográficas. Mais uma sessão acontece, a Assembléia
de 1925, sem que a emenda ao Artigo 4º esteja em vigor, por falta da
ratificação espanhola. A Assembléia de 1925 reelege os membros temporários do
Conselho em função35.
Permanece, portanto, perigosamente, a ausência de regras para eleição dos
membros temporários do Conselho, criando uma situação de grande incerteza. De
fato, a "[cada] ano, a eleição do Conselho é um espetáculo pouco edificante"36
e a crise de março de 1926 estava em plena maturação.
1.4. Os (Des)Acordos de Locarno
Os Acordos de Locarno assinalam a reaproximação franco-alemã, passo considerado
decisivo para a segurança no continente europeu37. Em Locarno, a diplomacia
alemã vê satisfeitas algumas das condições contidas no memorando de setembro de
1924. No que diz respeito ao artigo 16 do Pacto, acorda-se que "cada Estado
membro da Liga deve colaborar lealmente e eficientemente para que o Pacto seja
respeitado, e opor-se a todo ato de agressão, de forma compatível com sua
situação militar e levando-se em conta sua posição geográfica."38 Chega-se
igualmente a um acordo para que a Alemanha seja admitida na Liga na qualidade
de grande potência, o que significa que teria um lugar permanente no
Conselho39. Entretanto, não fica claro se essa entrada se daria com ou sem
modificações na composição do Conselhoe "o problema da admissão da Alemanha [é]
deixado às maquinações dos funcionários exteriores do mundo (...). Quando o
Conselho e a Assembléia se reuniram [em 1926], o que aconteceu? Os diplomatas
da Europa estavam jogando seu velho jogo de diplomacia secreta, comercializando
entre si"40.
A opinião pública polonesa exige que a Polônia seja admitida em pé de igualdade
e simultaneamente à Alemanha no Conselho: sabia-se que, com sua admissão à
Liga, a Alemanha tentaria rever a questão do Corredor de Dantzig e das minorias
alemãs na Polônia. Essa admissão era tida como urgente, pois, temia-se que, uma
vez no Conselho, a Alemanha imporia seu veto a entrada da Polônia.
As negociações de Locarno são concluídas em 16 de outubro de 1925. Alguns dias
mais tarde, Mello Franco é recebido por Briand, no Quai D'Orsay. Briand informa
que o governo francês já havia notificado oficialmente sua posição no sentido
de que o Conselho fosse ampliado não apenas para permitir a participação
permanente da Alemanha, mas também para a permanência do Brasil, da Espanha e
da Polônia. Esse aumento visava a aplicação dos Acordos de Locarno: a presença
de países que não haviam participado dos acordos tornaria possível as votações
no Conselho no caso em que vários membros se encontrassem impedidos de
participar. Briand diz ainda que insistiria junto ao governo inglês a propósito
desses pontos41.
Mello Franco encontra-se também com Chamberlain, que assegura que, por ocasião
da entrada da Alemanha, as candidaturas do Brasil, da Espanha e da Polônia
seriam examinadas42. Na realidade, no entanto, Chamberlain não havia mudado de
opinião, tornando-se simplesmente menos categórico. Quando encontra Régis de
Oliveira, no início de dezembro, por exemplo, Chamberlain menciona as
dificuldades que estava enfrentando para decidir sobre o que melhor conviria
aos interesses do Conselho em razão das reivindicações apresentadas nos últimos
meses por diversos países. Afirma também não poder adiantar qual seria sua
posição, já que ainda não havia recebido instruções de seu governo. Ao escrever
a Ramsay, embaixador britânico no Rio de Janeiro, relatando sua entrevista com
Régis de Oliveira, confessa ter sentido "sérias dificuldades para decidir sobre
a ação adequada aos interesses do Conselho,e considerando as reclamações que
estão aparecendo agora [grifos da autora]."43
O depósito legal dos Acordos de Locarno na Liga, em dezembro de 1925, é
comemorado no Conselho com discursos de todos os seus membros. Mello Franco
exprime seu desejo de "que o sistema de garantias que fundamenta os Acordos de
Locarno pudesse desenvolver-se pouco a pouco e trazer, num futuro próximo, seus
frutos ao mundo inteiro"44. Entretanto, é importante lembrar que, apenas três
meses antes, Raul Fernandes havia pronunciado um discurso, também na
Assembléia, no qual declarava que a América não se interessava pelos pactos
regionais de segurança e que em sua opinião essa via que tomava a Liga não era
a melhor para assegurar a paz mundial45.
Em meados de janeiro de 1926, o embaixador da Polônia em Paris anuncia a
candidatura de seu país a um assento permanente no Conselho, fato que ocupará
cada vez mais espaço na imprensa polonesa, partidária vigorosa da
reivindicação46. Os encontros de Mello Franco com Briand e Chamberlain ao longo
das semanas precedentes ao anúncio antecipavam que a candidatura polonesa seria
bem acolhida pela França " que, naturalmente, favorecia a presença de um aliado
seguro no Conselho " e não seria imediatamente rejeitada pela Inglaterra.
De passagem por Paris, em 28 de janeiro, Chamberlain acaba aceitando os
argumentos de Briand a favor da reivindicação polonesa e promete expô-los a seu
gabinete47. Na Inglaterra, a imprensa e o Parlamento opõem-se ao aumento do
Conselho, com exceção do assento para a Alemanha48. Chamberlain encontra-se
também com Quiñonez de Léon nessa ocasião, a quem assegura igualmente seu
apoio49.
Abrindo precedentes e admitindo a entrada da Polônia no Conselho e a
eventualidade de um aumento no número de assentos permanentes no Conselho, as
grandes potências acabam por dar maior força às diversas reivindicações. Em
vários países, a opinião pública passa a exercer pressão para que seus governos
insistam em receber o mesmo tratamento dado à Polônia50. Na Alemanha, em
particular, a notícia da candidatura polonesa provoca um grande ressentimento
com relação a seus parceiros de Locarno. Luther, chanceler do Reich, afirma
publicamente que a Alemanha deveria entrar em um Conselho com a composição
existente à época dos acordos. Stresemann declara que as negociações de Locarno
haviam levado a Alemanha a tomar a decisão de entrar na Liga, mas tal como ela
se encontrava então, e que nada havia sido dito quanto à possibilidade de uma
mudança, visto que a estabilidade presumida havia seguramente influenciado a
decisão alemã51.
1.5. A possibilidade do recurso ao veto
Em 8 de fevereiro de 1926, o governo alemão entrega à Liga sua solicitação
oficial de admissão52. No dia 12, o Conselho reúne-se e decide convocar uma
Assembléia Extraordinária para 8 de março, a fim de votar a entrada alemã53.
Do Rio de Janeiro, Félix Pacheco e o Presidente Bernardes não se conformam com
a exigência alemã de entrada exclusiva no Conselho. O Ministro pergunta a Mello
Franco: "até onde no caso poderemos eventualmente usar do direito de veto?"54
O representante brasileiro em Genebra não mudara de idéia com relação ao que
afirmava desde 1923: continua preconizando um distanciamento da Liga, caso a
solução encontrada representasse uma ofensa ao prestígio do Brasil, ou seja, se
o Brasil perdesse seu assento no Conselho. Quanto à questão do veto levantada
pelo Ministro, afirma não acreditar ser possível impô-lo contra a Alemanha;
acredita, assim, na importância de preservar o pacto de Locarno "no qual a
humanidade colocou tanta esperança"55. É verdade que as questões tratadas na
Liga dizem respeito quase que exclusivamente a interesses europeus, o que, na
realidade, permite ao governo brasileiro considerar seu afastamento em diversas
ocasiões sem maior cautela.
A realização da Assembléia Extraordinária torna-se iminente sem que questões
fundamentais tenham sido resolvidas. Notícias chegam ao Brasil, principalmente
sobre a tomada de posições da Grã-Bretanha e da França, alimentando um certo
otimismo. Na Grã-Bretanha, apesar de uma moção ser aprovada pela Câmara dos
Comuns, em 22 de fevereiro, solicitando ao governo que se oponha à ampliação do
Conselho e que apenas aceite a entrada da Alemanha, Chamberlain continua a se
mostrar reticente. No dia 23, em discurso feito em Birmingham, declara não ter
o governo determinado sua linha de conduta56. Além disso, Mello Franco informa
a Félix Pacheco que havia recebido por intermediário do embaixador Régis de
Oliveira uma mensagem confidencial de Chamberlain assegurando que a Grã-
Bretanha não havia feito nenhuma promessa particular nem manifestado qualquer
oposição específica sobre os assentos do Conselho57. A França, por sua vez, não
muda de posição: Briand continua a demonstrar seu apoio à candidatura
brasileira58.
Quanto aos demais governos presentes no Conselho, suas posições apresentam-se
basicamente da seguinte maneira: o Japão, em princípio, é contra a ampliação do
Conselho. Considerando os acordos de Locarno uma questão sobretudo européia,
diz-se, entretanto, pronto a colaborar para sua entrada em vigor e disposto a
estudar as demais candidaturas59. A Itália está disposta a apoiar o pedido da
Polônia e não se mostra contra a reivindicação do Brasil60. A Tchecoslováquia é
partidária da reivindicação polonesa e aceita que se acordem assentos
permanentes à Espanha e ao Brasil. A Bélgica é favorável à candidatura
polonesa, deseja a prorrogação de seu assento temporário ou um assento
permanente (dependendo do que fosse acordado à Espanha e ao Brasil), mas,
sobretudo, está pronta a negociar61. A Espanha aceita as candidaturas polonesa
e brasileira à condição de ver sua própria solicitação atendida62. O Uruguai,
que participa do Conselho desde 1922, quer ter seu mandato renovado, o que
torna sua posição incerta, ainda que o governo uruguaio comunique ao governo
brasileiro sua simpatia pela candidatura do Brasil63.
Além dessas reivindicações, a China também apresenta sua candidatura a um
assento permanente em 4 de março. A Suécia, por seu turno, persiste em não
aceitar a criação de assentos permanentes que não o destinado à Alemanha.
Se, de um lado, parece evidente que o Ministro Félix Pacheco e o Presidente da
República dão muita importância à questão da Liga e que estão bastante
preocupados, não é menos verdadeiro que o Itamaraty, no "sono letárgico que o
caracteriza"64, concretamente, ocupa-se muito pouco do problema. As tarefas
difíceis são deixadas quase que exclusivamente aos diplomatas brasileiros no
exterior, o que certamente contribui para que Pacheco e Bernardes tenham uma
visão extremamente superficial dos acontecimentos, sendo movidos pelo
sentimento de orgulho nacional e pelas repercussões que o assunto poderia ter
no país. Nesse sentido, apesar da insistência de Mello Franco sobre a não
utilização do veto contra a Alemanha, o Presidente da República lhe escreve
afirmando estar persuadido de que os brasileiros seriam "ludibriados" caso não
insistissem em sua entrada no Conselho como membro permanente juntamente com a
Alemanha. E continua: "o Brasil não foi ouvido sobre [o] Tratado de Locarno nem
sobre [os] compromissos dele oriundos, estando livre portanto para votar como
lhe parecer. (...). Em suma: a questão para o Brasil cifra-se em vencer ou não
perder."65 [grifo da autora]
Face ao impasse, Arthur Bernardes e Félix Pacheco transmitem a Mello Franco no
dia 7 de março a decisão de que, na ausência de fato novo, o Brasil utilizaria
definitivamente seu direito de veto contra a admissão da Alemanha66.
Nos dias 7, 10 e 12 de março, os signatários dos acordos de Locarno se reúnem
para tentar encontrar um meio de assegurar o êxito à Assembléia Extraordinária.
O principal tema de discussões é a entrada concomitante da Alemanha e da
Polônia no Conselho.
Na reunião de 7, Stressemann e Luther, Ministro das Relações Exteriores e
Chanceler da Alemanha, insistem sobre o fato de que só haviam tomado
conhecimento do que se passava oficialmente na Liga das Nações e não do que
acontecia nos meios mais restritos. Ou seja, "a Alemanha entraria sozinha no
Conselho.(...) Toda [a política do governo] baseia-se nessa tese única
(...)."67 Briand e Chamberlain negam ter prometido a entrada exclusiva da
Alemanha, insistindo sobre seus compromissos com certas nações que haviam
solicitado sua admissão como membros permanentes no Conselho: fala-se
principalmente da Polônia e da Espanha e, ainda que raramente, algumas menções
são feitas ao Brasil68.
No dia 10 de março, o Conselho da Liga reúne-se na residência de Eric Drummond.
A Suécia continua a se mostrar firmemente contrária ao aumento do Conselho. A
Espanha e o Brasil mantêm-se igualmente firmes em suas antigas reivindicações.
Mello Franco lembra que o Brasil não estava ligado aos acordos de Locarno e,
pela primeira vez, ameaça claramente vetar a entrada da Alemanha. O Uruguai não
manifesta sua posição69.
No dia 7 de março, Félix Pacheco havia dado instruções expressas a Mello Franco
para utilizar o veto se nada de novo acontecesse. No mesmo dia, Mello Franco
havia se encontrado com o Ministro das Relações Exteriores espanhol, que
parecia mais aberto à idéia de promover uma ação comum com o Brasil visando à
concretização de suas respectivas reivindicações. Yanguas mencionara que seu
país resistiria em concordar com a admissão da Alemanha até o último momento,
deixando entrever que poderia recorrer ao veto, sem utilizá-lo realmente no
final.
Na reunião locarnista da manhã do dia 12 de março, a idéia de criar uma
comissão especial para estudar a questão da reorganização do Conselho é
levantada. Propõe-se aos representantes alemães uma fórmula segundo a qual
seria criado um assento permanente para a Alemanha e um temporário para a
Polônia70. Os representantes alemães solicitam tempo para estudar a proposta71.
À tarde, Clausel, enviado por Briand, entra em contato com Mello Franco,
solicitando seu apoio à fórmula encontrada pelos locarnistas. Mello Franco
responde que deve consultar seu governo, mas adianta que o acordo lhe parece
impossível, visto que a fórmula proposta acentuava ainda mais o desequilíbrio
entre a América e a Europa no Conselho e visava a "colocar a Liga no quadro de
Locarno, quando Locarno é que deveria ser colocado no quadro da Liga"72.
À noite, tem-se a resposta dos representantes alemães à solução que lhes havia
sido proposta: Berlim não aceita o compromisso relativo ao assento não
permanente para a Polônia. A realidade é que a opinião pública alemã é contra
essa negociação e que o governo alemão poderia cair caso desse a ela seu
acordo.
No dia 13 de março, uma nova solução é examinada: um membro temporário do
Conselho poderia renunciar em favor da Polônia. A Suécia, querendo contribuir
para a concretização dessa solução e disposta a mostrar-se desinteressada,
comunica que deixaria o Conselho, cedendo seu lugar à Polônia73.
No dia seguinte, Stresemann propõe um novo compromisso, em um artigo publicado
nos jornais de Genebra. Insiste sobre a exclusividade da entrada alemã no
Conselho e sobre o adiamento da questão da reorganização do órgão para o mês de
setembro. Afirma que, uma vez membro da Liga e membro permanente do Conselho, a
Alemanha não colocaria obstáculos às decisões relativas à designação de novos
membros do Conselho."74 A proposta sueca, feita na véspera, não é sequer
mencionada. Ou seja, os representantes alemães, que em suas declarações
oficiais afirmam nada ter contra a presença polonesa no Conselho, encontram-se
em situação desconfortável, uma vez que não podem responder publicamente à
oferta sueca. Em encontros confidenciais, entretanto, Stresemann e Luther
informam que tal sugestão não poderia tampouco ser admitida, pois a composição
política do Conselho seria assim modificada de maneira inaceitável para a
Alemanha: um governo neutro seria substituído por outro ligado à pequena
entente, aliança composta pela Iugoslávia, Tchecoslováquia e Romênia. Os
representantes alemães propõem, então, que a Tchecoslováquia fosse também
substituída no Conselho por um governo neutro75.
Na reunião do Conselho de 15 de março, a Tchecoslováquia anuncia que estaria
pronta a renunciar a seu assento ao mesmo tempo que a Suécia para que a
Alemanha pudesse dar, finalmente, seu consentimento. A magnanimidade do governo
tchecoslovaco não se mostra, no entanto, suficiente para que se saia do
impasse: Mello Franco declara que o Brasil mantém seu veto à admissão da
Alemanha se não obtivesse também um assento permanente.
1.6. O veto
Seria exagero afirmar que nas negociações locarnistas o Brasil havia sido
esquecido. Contatos continuavam a ser mantidos com representantes brasileiros.
No entanto, essas iniciativas eram modestas demais e desproporcionais ao poder
do Brasil de fazer fracassar todas as negociações que não satisfizessem sua
pretensão. Somente no dia 15 de março, depois de o Brasil ter anunciado seu
veto na reunião do Conselho, Briand e Chamberlain decidem atuar diretamente
junto ao governo no Rio de Janeiro. Solicitam a seus representantes no Rio de
Janeiro, Conty e Beilby Alston, que façam rapidamente uma tentativa conjunta
para que Bernardes modifique suas instruções76, tentativa bastante tardia visto
que, por várias semanas, sabia-se que Mello Franco estava disposto a transigir,
mas tinha instruções de seu governo para não fazê-lo.
No dia seguinte, a missão de Conty e Alston se realiza. Ao sair do encontro com
o Presidente da República, deixam-lhe sua solicitação por escrito. A
solicitação, redigida de maneira a respeitar as suscetibilidades do governo,
começa pela afirmação de que o Brasil "não é somente uma grande potência
americana, é uma grande potência mundial, que teve um nobre papel na Grande
Guerra (...)". Após sua solicitação propriamente dita, a nota afirma que, se o
Brasil consentisse em dar seu acordo a seus amigos europeus, dever-se-ia
"render homenagens a sua magnanimidade e a sua grandeza de alma, constatando
que está disposto a adiar sua reivindicação legítima, incontestavelmente
fundamentada no direito e na lógica" [grifo da autora] a fim de assegurar a paz
européia e evitar toda responsabilidade com relação aos problemas da Europa77.
Na manhã de 17 de março, horas antes de a Assembléia reunir-se, Mello Franco
envia ao Presidente Bernardes um último apelo, a pedido dos países latino-
americanos, para que o governo brasileiro volte atrás em sua decisão. À tarde,
tem-se conhecimento do resultado desse último esforço: Mello Franco comunica à
Assembléia que seu governo mantém o veto. Em seu discurso lembra os termos da
resposta brasileira ao memorando de pedido de admissão do governo alemão de
1924, ou seja, que o governo brasileiro não havia concordado em apoiar a
entrada da Alemanha, mas simplesmente estudar essa hipótese no momento devido.
Quanto aos acordos de Locarno, afirma que os brasileiros reconheciam sua
importância e se felicitavam por essa obra que contribuiria à paz e à justiça
na Europa. "Entretanto, por maior que seja o valor deste sistema de acordos
(...) não devemos perder de vista que a obra admirável de Locarno deve entrar
no quadro da Liga das Nações e não a Liga das Nações na contrução política de
Locarno". Finalmente, informa que as instruções de seu governo são "definitivas
e irrevogáveis"78.
2. As análises sobre a crise de 1926
2.1. A negligência franco-britânica às regras do jogo
Dois meses depois da Assembléia de março, o embaixador francês no Rio de
Janeiro escreve ao Quai D'Orsay fazendo comentários eloqüentes sobre o
comportamento de seus colegas em Paris:
No que diz respeito à questão de Genebra, não compreendo por que se
ficou surpreso com a atitude e o amor próprio dos brasileiros. (...)
Em 6 de outubro de 1924, o Ministro das Relações Exteriores me disse
que não admitia a entrada da Alemanha com um assento permanente no
Conselho da Liga a menos que o Brasil também obtivesse, ao mesmo
tempo, um assento permanente. Telegrafei, em seguida, ao
Departamento. Não se lê meus telegramas? Os classificaram mal? Os que
tratam do assunto não conhecem bem os dossiês? Antes da história de
17 de março, Pacheco me havia contado sobre sua pretensão de aumentar
o número de assentos permanentes no Conselho antes de admitir a
Alemanha. Telegrafei a Paris sugerindo colocar um preço para nossa
concordância. Disseram-me para acalmar as ambições federais? Ao
contrário. Pediram-me para dizer ao Brasil que teriam nosso acordo
por nada. Somente em 16 de março fui convidado a tomar atitude a fim
de fazer o Brasil adiar suas pretensões. Não havia nada mais a fazer
com [os] dois homens. Bernardes e Pacheco, que nunca estiveram na
Europa e a ignoram. Vendo somente que sua política interna é
inspirada por seu desejo e sua presunção, provocaram confusão, mas
respeitando as regras do jogo. Quando se admite o veto, há que se
adiantar para evitá-lo.79 [grifo da autora]
A indignação do embaixador francês confirma um importante elemento explicativo
da Assembléia de março de 1926: a negligência com que França e Grã-Bretanha
trataram as pretensões do Brasil e da Espanha, notadamente, alimentando
expectativas de países cuja diplomacia e interesses nacionais encontravam-se
fortemente concentrados na luta pela obtenção de um assento no Conselho80.
Como explicar tal negligência? A explicação provável está no fato de as
lideranças européias viverem, contraditoriamente, com a ilusão de estarem ainda
no século XIX, no qual suas diplomacias regulam o mundo, ao mesmo tempo em que
as relações diplomáticas no âmbito da Liga reflitam o otimismo do
internacionalismo wilsoniano. Ainda que esse otimismo, é verdade, esteja
cercado pelos escombros da Grande Guerra e que tenha sido "gradativamente
substituído por dúvidas e apreensões que se estenderam pela década de 1930 até
desaguarem na Segunda Guerra Mundial"81. Ou, como diria Arno Mayer, Clemenceau
e Lloyd George são homens do século XIX, assim como o são os homens da Liga das
Nações. Pensam e comportam-se aristocraticamente. São, antes de mais nada,
representantes de uma ordem que resiste à decadência, de uma ordem que dá lugar
a ferro e fogo aos valores do capitalismo industrial82.
Com efeito, contrariamente ao entendimento comum entre os historiadores,
brasileiros incluídos, na passagem do século XIX para o XX a modernidade não
triunfa sem contradições: "nem a Inglaterra, nem a França haviam se tornado
sociedades civis e políticas industrial-capitalistas e burguesas (...). Suas
políticas eram tão `obviamente antiquadas' e obstinadamente preocupadas com sua
`longevidade' quanto as políticas das outras [potências européias]."83 Honra,
prestígio, atitudes nobiliárquicas guiam ainda a política européia. A concepção
de mundo hierarquizado expressa valores do ancien régime ainda em vigor. Veja-
se, nesse sentido, o barão do Rio-Branco, que enxerga nos Estados Unidos, com
seu desenvolvimento econômico e tecnológico, o parceiro ideal do Brasil, sem
abandonar uma admiração inconteste pela cultura e civilização aristocráticas da
Europa - França, notadamente.
2.2. Visões brasileiras
Os trabalhos sobre a participação do Brasil na Liga das Nações podem ser
divididos em dois grupos. O primeiro deles, mais numeroso, engloba os estudos
realizados nos anos 1920. No segundo grupo estão trabalhos bem mais recentes,
realizados a partir de 1980. Fora desses dois grupos está a obra de Afonso
Arinos de Melo Franco, publicado em 1955. Afonso Arinos, que se tornaria
Ministro das Relações Exteriores durante o curto governo de Jânio Quadros
(janeiro-agosto de 1961) e um expoente da Política Externa Independente, era
filho de Afrânio de Mello Franco e aos vinte anos acompanhava seu pai em
Genebra. Seu relato não esconde o objetivo de homenagear o pai - que lutava,
então, "de um lado contra as intrigas genebrinas, e de outro contra os excessos
pugnazes do seu distante governo"84 -, mas não deixa de considerar fatores que
foram, realmente, decisivos para que o Brasil vetasse a entrada alemã na Liga.
Ou seja, ainda que em sua avaliação não mencione os já referidos faux pas de
Mello Franco, tem em conta, e esta é uma de suas contribuições mais
importantes, as intrincadas negociações e pressões das potências locarnistas: "
[... M]esmo aqueles que, no fundo, não desejavam sinceramente o convívio dos
outros - caso da França com a Alemanha, ou da Alemanha com a Polônia - fingiam-
se decepcionados e lançavam, hipocritamente, todo o peso da responsabilidade
sobre o Brasil."85
2.2.1. O olhar dos contemporâneos
Os estudos sobre o Brasil e a Liga que datam da década de 1920, de maneira
geral, inspiram-se nas posições favoráveis ou contrárias de seus autores com
relação ao governo de Artur Bernardes, cujo mandato esteve marcado pela
profunda divisão da elite política brasileira, como pode ser claramente
percebido nos estudos de José Carlos de Macedo Soares e Elyseo Montarroyos.
Macedo Soares, que se tornaria Ministro das Relações Exteriores (1932-1933 e
1955-1956), foi o brasileiro contemporâneo à crise que escreveu a mais dura
análise sobre a decisão do governo. Era das personalidades mais importantes da
oposição a Bernardes. Em dezembro de 1924 escapa da prisão, onde havia ficado
dois meses, acusado de envolvimento no levante tenentista de julho em São
Paulo. Depois de se refugiar na embaixada argentina, parte para o exílio na
Europa, onde estava em março de 1926. Em seu livro, exclusivamente dedicado à
participação brasileira na Liga das Nações, atribui a crise de 1926
exclusivamente "à hipertrofia criminosa do poder pessoal do Presidente da
República" e "a política externa se transformando num vil instrumento de
política interna, serve de derivativo às dificuldades da última (...)."86
Já Montarroyos participou da Assembléia de 1921 e, em 1924, foi nomeado
conselheiro técnico da missão permanente. Em 1926, representou o Brasil na
Comissão Encarregada de Estudar a Composição do Conselho, criada pouco após a
crise de março. Seu estudo defende claramente a posição do governo Bernardes e
critica as potências européias. Afirma Montarroys que
o que se deve ter em conta é que o momento oportuno que o Conselho
esperava, assim como havia sido acertado entre seus membros, para
proceder à sua própria modificação, iria, finalmente, apresentar-se
por ocasião da entrada da Alemanha na Liga das Nações. O Brasil tinha
a promessa formal de que sua candidatura teria, então, no Conselho,
uma boa acolhida, o que, todos os seus membros, diversas vezes,
haviam assegurado. Ora, chegado o momento, o que foi proposto ao
Brasil? Que deixasse para mais tarde - às calendas gregas,
evidentemente - sua pretensão.87
2.2.2. Os estudos recentes
A participação do Brasil na Liga das Nações ficou por longas décadas sem
merecer novos estudos. Só muito recentemente apareceram novas análises,
realizadas sobretudo por cientistas políticos e historiadores.
Entre os estudos mais relevantes encontra-se o de Eugênio Vargas Garcia.
Utilizando basicamente a troca de correspondência entre Mello Franco, Félix
Pacheco e Arthur Bernardes, Garcia busca compreender a percepção desses
tomadores de decisão. Com razão, o autor considera que o
excesso de confiança e o voluntarismo que caracterizam toda a
campanha [brasileira] desde 1923 remetem a um caso típico de
misperception do governo de Artur Bernardes, que superestimou as
possibilidades de sucesso de sua aspiração, provavelmente iludido com
as mensagens formais de apoio cordial que recebia e confundindo ainda
certas particularidades do protocolo diplomático de uma organização
multilateral com sinais de reconhecimento da importância do país na
comunidade de nações.88
Outro importante trabalho é o de Stanley Hilton, que consultou documentos
diplomáticos brasileiros e britânicos para escrever sobre a carreira
internacional de Afrânio de Melo Franco que, mesmo antes da Revolução de
Trinta, quando se torna Ministro das Relações Exteriores - "o Chanceler da
Revolução" -, "participara intimamente dos momentos mais dramáticos da
diplomacia brasileira, ganhando reputação internacional por seus conhecimentos
jurídicos, seu talento como debatedor, e seu savoir faire diplomático geral"89.
Hilton elogia Mello Franco, que teria feito incansáveis esforços para
sensibilizar seu governo sobre a inconveniência de o Brasil colocar empecilhos
à adesão alemã à Liga.
Com seus olhos na opinião pública brasileira, [Bernardes] foi
intransigente (...). O que tornou ainda mais amarga a derrota
brasileira foi a atitude dos delegados hispano-americanos, que,
mostrando (nas palavras de Mello Franco) `mal disfarçada hostilidade
ao Brasil, enviaram um apelo coletivo a Bernardes pedindo que
suspendesse o veto e até manifestaram ao Conselho seu desacordo com a
atitude adotada pelo Rio de Janeiro. (...) A humilhação final veio
quando o Conselho, face à intransigência de Bernardes, nomeou uma
comissão para estudar a reorganização do Conselho - ou seja, para
encontrar um meio de remover o Brasil - e colocou nela a Argentina
(...).90
No mesmo sentido vai a análise de Clodoaldo Bueno que entende que
no fundo, a questão não é indagar se era legítima ou não a
reivindicação do Brasil (...) e sim se o momento para fazê-la foi o
mais oportuno e se o modo de conduzi-la foi adequado. Mas está fora
de dúvida que o governo Bernardes a fez com os olhos voltados para a
opinião interna, para angariar prestígio.91
Vê-se, pois, que a ênfase desses estudos é colocada no âmbito da política
interna e externa brasileira, com maior ou menor aprofundamento documental e
analítico. Também, ainda que em diferentes graus, atribuem ao Brasil a
responsabilidade de ter prejudicado a política no seio da Liga, buscando uma
saída pouco digna e até mesmo humilhante. Ou seja, caracterizam os episódios em
torno da retirada brasileira da Liga como um verdadeiro fiasco.
3. Elementos para uma nova interpretação
A batalha brasileira pelo assento permanente no Conselho da Liga das Nações
encerrou-se melancolicamente. No dia 18 de março de 1926, uma Comissão
Encarregada de Estudar a Composição do Conselho era criada. Da Comissão fizeram
parte os dez membros do Conselho e mais cinco membros China, Polônia, Suíça,
Alemanha e Argentina. O Brasil participa da primeira sessão de reuniões dessa
Comissão, de 10 a 17 de maio, mas não da segunda sessão que aconteceria meses
mais tarde, uma vez que o governo brasileiro comunica sua retirada da Liga no
dia 10 de junho de 1926.
Com respeito à atuação da diplomacia brasileira durante a campanha ao assento
permanente, pelo menos três questões merecem consideração. A primeira delas tem
a ver com a clara e sabida susceptibilidade dos países latino-americanos quanto
a qualquer pretensão brasileira de querer representá-los.92 A correspondência
de Mello Franco com o Rio de Janeiro está plena de exemplos da falta de apoio
das delegações latino-americanas às pretensões brasileiras na Liga. O pedido
dos países latino-americanos para que o governo brasileiro volte atrás, horas
antes da Assembléia do dia 17 de março, expõe definitivamente o terreno
movediço em que agiam os diplomatas brasileiros.
Outra questão diz respeito à insistência de Mello Franco para levar a cabo as
pretensões de seu governo, retransmitindo ao longo dos anos ao Rio de Janeiro
as demonstrações de simpatia que recebe a candidatura brasileira, sem colocar
em perspectiva essas manifestações, que muitas vezes pouco tinha a ver com as
reais intenções ou possibilidades de seus interlocutores. De fato, essas
expressões de apoio são supervalorizadas, contribuindo certamente à atitude de
intransigência de Artur Bernardes e Félix Pacheco. Vale notar que em momento
algum Mello Franco contrapõe-se decididamente à intransigência do Presidente e
do Ministro. Diferentemente, em 1923, na Quinta Conferência Pan-americana
(Santiago), chefiando a delegação brasileira, Mello Franco havia ameaçado
demitir-se de sua função caso o Ministro Félix Pacheco não respeitasse suas
opiniões e cessasse de tomar iniciativas que considerava inadequadas no Rio de
Janeiro.93
Há que se ressaltar também que, ao longo da campanha ao assento permanente,
Mello Franco utiliza argumentos incompatíveis entre si, apresentando
primeiramente o Brasil como o substituto legítimo dos Estados Unidos e em
seguida como o representante natural dos países latino-americanos. A falta de
consistência de seu discurso é a manifestação da própria contradição com que o
Brasil se apresentava na Liga, e ainda se apresenta em foros internacionais,
defendendo a igualdade jurídica entre os Estados e a democratização das
instâncias decisórias internacionais ao mesmo tempo em que busca uma atuação
protagônica no âmbito de órgãos restritos daqueles foros.
A campanha brasileira a um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU
dá sinais de que ainda não se logrou escapar do mesmo tipo de ambigüidade, que
pode certamente diminuir seu grau de legitimidade. Nesse sentido, restam
algumas questões: a demanda por um assento permanente pode ser interpretada
apenas como um desejo de prestígio, isto é, apenas motivada pelo voluntarismo
do governo brasileiro e do Itamaraty, em particular? Os formuladores da
política externa brasileira estão compreendendo devidamente o que se passa no
contexto internacional? Não estariam as grandes potências cometendo equívocos
na percepção da atual realidade internacional? A história não se repete, mas
tem lições a dar.
Para além de tais questões, viu-se que tanto a política interna e quanto a
política exterior brasileira têm importância indiscutível para entender as
motivações e atitudes de Bernardes, mas não autorizam a conclusão de que seu
governo tenha monopolizado a responsabilidade pela crise de março de 1926 na
Liga. Há que se enfocar problemas institucionais que a Liga apresentava, bem
como o terreno das relações entre as potências européias, sobretudo França e
Grã-Bretanha.
Fica patente, portanto, e muito claramente, a importância da consulta a fontes
estrangeiras " sobretudo os documentos diplomáticos britânicos e franceses,
além da documentação encontrada no Arquivo da Liga das Nações (Genebra)" para
compreender os sete anos de participação brasileira na Liga e sua retirada. A
política externa brasileira do período está longe de ser suficiente para
compreender o que realmente se passava na Liga. Concentrar-se exclusivamente na
diplomacia brasileira resulta em uma interpretação equivocada e que tem se
resumido à expressão de um "fiasco" brasileiro. Trata-se, na verdade, de um
fiasco mais amplo, que tem a ver com a tentativa frustrada de criar, no período
pós-Versalhes, uma nova ordem internacional, como bem demonstrado na obra de
Carr. A Liga das Nações foi a expressão por excelência dessa tentativa e de seu
insucesso.94
A Paz de Versalhes e o Pacto da Liga inspiravam-se em uma concepção liberal de
mundo que acabou criando um terreno fértil para o exercício do nacionalismo
irresponsável que resultou na Segunda Guerra Mundial. Nesse sentido, "
[i]nfelizmente, os políticos europeus mais influentes negligenciaram a Liga
(...). O racionalismo abstrato ganhou a primeira mão, e [logo no início de
funcionamento da Liga], em Genebra, essa corrente levou a Liga decididamente na
direção da utopia." Com efeito,
"[p]oliticamente, a doutrina de interesses em geral tomou a forma de
um pressuposto de que as nações possuem um interesse idêntico na paz,
e que toda nação que deseje perturbar a paz é, portanto, irracional e
imoral. (...) Depois de 1918, foi fácil convencer a parte da
humanidade que vive em países de língua inglesa que a guerra não
beneficia ninguém. O argumento não pareceu convencer particularmente
aos alemães que se beneficiaram bastante nas guerras de 1866 e 1870,
e que atribuíram seus mais recentes sofrimentos, não à guerra de
1914, mas ao fato de a terem perdido. Não parecia convencer os
italianos, que não culparam a guerra, e sim a traição dos aliados,
que os enganaram no acordo de paz. Não convencia também os polacos e
tchecoslovacos que, longe de deplorarem a guerra, devem sua
existência nacional a ela e nem aos franceses, que não poderiam
queixar-se sem reservas de uma guerra que restaurou a Alsácia-Lorena
à França (...)."95
Assim, parece não haver dúvida sobre o fato de que o multilateralismo da Liga
das Nações, conforme a idealização de Woodrow Wilson, era inviável na prática.
As grandes potências européias, habituadas há séculos com outro jogo político,
não cederam às novidades do internacionalismo wilsoniano.96
Finalmente, a diplomacia de Mello Franco, Bernardes e Pacheco, com os seus
muitos erros e poucos acertos, deve ser colocada em perspectiva, ou seja, deve
ser pensada no contexto do "fiasco" da própria diplomacia internacional, dos
"vinte anos de crise" ou de exaustão de uma ordem, cujos padrões, eram, em
grande medida, os do século XIX, a cujos parâmetros a diplomacia brasileira
obviamente não escapava.
Outubro de 2003
1 A autora agradece a Dácio Malta, Eiiti Sato, Ironildes Bueno e Rogério Farias
pela leitura preliminar do presente texto.
2 CARR, E. H. Vinte anos de crise, 1919-1939. 2. ed. São Paulo: Imprensa
Oficial do Estado, Brasília: Editora UnB/IPRI, 2001, p. xxxviii.
3 Ibid., p. 21.
4 Ibid., p. xxxvii.
5 Brazil, Annual Report, 1921. In: GRÃ-BRETANHA, British Documents on Foreign
Affairs. Reports and Papers from the Foreign Office Confidential Print(BDFA),
Part II, Series D, v. 3, p. 64-65.
6 Como lembra Stanley E. HILTON. Brazil and the Post-Versailles World: Elite
Images and Foreign Policy Strategy. Journal of Latin American Studies, v. 12,
Part 2, 1980, p. 351.
7 Na realidade, tudo indica que prevalece no período uma aguda visão realista e
a crença de que valores morais têm muito pouca influência no duro terreno das
relações internacionais. Segundo Stanley Hilton "o ingrediente central da
Weltanschauung da elite brasileira formuladora da política externa nos anos que
seguem a Primeira Guerra Mundial era a convicção de que princípios
maquiavélicos guiavam o comportamento internacional dos Estados". Ibid., p.
342.
8 WIGHT, Martin. A política do poder. 2. ed. Brasília/São Paulo: Editora UnB/
IPRI/Imprensa Oficial de São Paulo, 2002, p. 26.
9 BREDA DOS SANTOS, Norma. Le Brésil et la Société des Nations, 1920-1926, tese
de doutorado, Institut universitaire de hautes études internationales, Genebra,
1996, p. 166-174.
10 Prevê o artigo 4º do Pacto que o "Conselho será composto por representantes
das Principais Potências Aliadas e Associadas, bem como representantes de
quatro outros Membros da Liga. (...) Até a primeira designação pela Assembléia,
os representantes da Bélgica, do Brasil, da Espanha e da Grécia serão Membros
do Conselho." Em 1920, Espanha, Brasil e Bélgica são reeleitos. A Grécia é
substituída pela China. Em 1921, os quatro países são reeleitos. Em 1922, com a
decisão, da Assembléia, de aumentar o número de membros temporários para 6,
além da reeleição de Espanha, Brasil, China e Bélgica, são eleitos o Uruguai e
a Suécia. Société des Nations (SDN), Actes de la Première Assemblée, 25ème
séance plénière, 15/12/1920, p. 559-560; Actes de la Deuxième Assemblée, 33ème
séance plénière, 5/10/1921, p. 893-894 e 898; Actes de la Troisième Assemblée,
24ème séance plénière, 30/9/1922, p. 383.
11 BRASIL, Relatório apresentado ao Presidente da República (RAPR), 1922-1923,
Anexo C, p. 5, e 1923-1924, Anexo C, p. 31-45.
12 SDN, Actes de la Troisième Assemblée, 16ème session plénière, 25/9/1922, p.
224-225.
13 LYRA, Heitor. Minha vida diplomática. Brasília: Editora Universidade de
Brasília, 1981, t. 2, p. 1. Antes mesmo de Bernardes assumir
seu mandato, a agitação reina em diversos Estados, com a freqüente implicação
de setores do exército. O tenentismo é o mais conhecido movimento desse
período. "... [A] uma política de moderação (...) - o Presidente esquecerá as
injúrias ao candidato, segundo expressão sua - [Bernardes] uma atitude
reacionária, simbolizada nas leis repressivas da liberdade de imprensa, no
permanente estado de sítio e no desmonte das máquinas dos governos estaduais
que lhe tinham sido adversos." BELLO, José Maria. História da República. 5. ed.
São Paulo: Cia. Editora Nacional, 1964, p. 312.
14 MELO FRANCO, Afonso Arinos de. Um estadista da República. Afrânio de Melo
Franco e seu tempo.Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1955, v. 3, p. 1170.
15 Ibid.,p. 1171.
16 Mello Franco a Félix Pacheco, 12 e 17/9/1923. BRASIL, Arquivo Histórico do
Itamaraty (AHI), 274/2/3.
17 Mello Franco a Félix Pacheco, 18/9/1923. AHI, 274/2/3.
18 Mello Franco a Félix Pacheco, 21/9/1923. AHI, 274/2/3.
19 Félix Pacheco a Mello Franco, 21/9/1923. AHI, 274/2/4.
20 Mello Franco a Félix Pacheco, 23/9/1923. AHI, 274/2/3.
21 Assim, são reeleitos em 1923: Bélgica, Brasil, Espanha, Suécia e Uruguai. A
China é substituída pela Tchecoslováquia. SDN, Journal Officiel Supplément
Spécial, n. 13, Actes de la Quatrième Assemblée, 16ème séance plénière, 27/10/
1923, p. 157.
22 RAPR, 1924-1925, p. 3.
23 Raul Fernandes a Mello Franco, AHI, 14/7/1924, e Heitor LYRA, op. cit., t.
2, p. 27.
24 A. R. Conty ao Ministro dos Negócios Estrangeiros (Paris), 27/11/1924.
FRANÇA, Archives diplomatiques françaises (ADF), SDN/Secrétariat général, v.
2022, p. 28-29.
25 Brasil, Bélgica, Espanha, Suécia, Tchecoslováquia e Uruguai. SDN, Journal
Officiel Supplément Spécial, n. 23, Actes de la Cinquième Assemblée, 20ème
séance plénière, 2/9/1924, p. 116.
26 Raul Fernandes a Félix Pacheco, 3/10/1924. AHI, 274/2/2.
27 Memorando da Legação da Alemanha ao Ministério das Relações Exteriores. Rio
de Janeiro, 29/9/1924. In: RAPR, 1925-1926, Anexo A, p. 115-118.
28 Briand renuncia à política de execução do Tratado de Versalhes. Tanto
Poincaré quanto Briand acumularam as funções de Primeiro-Ministro e de Ministro
dos Negócios Estrangeiros.
29 Cf. KIMMICH, Christoph M.Germany and the League of Nations. Chicago e
Londres: University of Chicago Press, 1976, p. 57-59.
30 Marquês de Crewe (Paris) a MacDonald, 3/10/1924; Memorandum Respecting the
Entry of Germany into the League of Nations, Central Departament, 7/11/1924;
Note du Gouvernement français à l'Ambassade d'Allemagne, 6/10/1924. GRÃ-
BRETANHA, Foreign Office (FO) 371/9821, p. 112, 195 e 147.
31 Memorando do Ministério das Relações Exteriores à Representação da Alemanha.
Rio de Janeiro, 1/12/1924. In: RAPR, 1924-1925, Anexo A, p. 119-120.
32 Chamberlain a J. Tilley (Rio de Janeiro), AHI, 27/4/1925 e 6/7/1925. FO,
371/11070, p. 19 e 43-44.
33 Mello Franco a Pacheco, 3/7/1925, AHI, 274/2/8; Chamberlain a J. Tilley, 6/
8/1925. FO 371/11070, p. 47-52.
34 Mello Franco a Félix Pacheco, 12/9/1925. AHI, 274/2/8.
35 Brasil, Bélgica, Tchecoslováquia, Espanha, Suécia e Uruguai. SDN, Journal
Officiel Supplément Spécial, n. 33, Actes de la Sixième Assemblée, 19ème Séance
Plénière, 26/9/1925, p. 160.
36 BOVET, Ernest. Les obstacles. A propos de la sixième Assemblée de la Société
des Nations. Wissen und Leben, 1925, p. 931.
37 Pelo papel que desempenharam na negociação desses acordos, Chamberlain,
Briand e Stresemann recebem o Prêmio Nobel da Paz: Chamberlain, em 1925; Briand
e Stresemann em 1926.
38 Annexe F aux Accords de Locarno, SDN, A.4.1926 (Extraordinaire) e KIMMICH,
Christoph M., op. cit., p. 73.
39 KIMMICH, Christoph, op. cit., p. 73.
40 PATTERSON, Caleb P. The Admission of Germany to the League of Nations and
its Probable Significance. International Conciliation, n. 231, p. 305 e 310.
41 Mello Franco a Félix Pacheco, 22/10/1925. AHI, 274/2/9.
42 Mello Franco a Félix Pacheco, 29/10/1925. AHI, 274/3/2.
43 Chamberlain a Ramsay (Rio de Janeiro), 3/12/1925. FO 371/11071, p. 149.
44 SDN, Procès-verbal de la Trinte-septième Session du Conseil, 7-16/12/1925,
p. 181.
45 SDN, Journal Officiel Supplément Spécial, n. 33, Actes de la Sixième
Assemblée, 11ème séance plénière, 15/9/1925, p. 83-84.
46 BREGMAN, Alexandre, op. cit., p. 16
47 D'ABERNON. An Ambassador for Peace: Lord D'Abernon's Diary. London, Hodder
and Stoughton, s.d., v. III. The Years of Recovery (January 1924-October 1926),
p. 231-232. Ver igualmente: RUYSSEN, Theodore. La décade
tragique: Genève, 8-17 mars 1926. Paix par le droit, 36e Année, n. 4, abril
1926, p. 159-160.
48 HARRIS, H. Wilson. Le Conseil sera-t-il augmenté? L'opinion britannique est
unanime dans la négation. Journal de Genève, 19/2/1926, p. 1-2.
49 WALTERS, Francis P. A History of the League of Nations. Westport: Greenwood
Press, 1996 (reimpressão), p. 317-318.
50 D'ABERNON, op.cit., p. 228-229
51 Pierre de Margerie (Berlim) ao Ministro dos Negócios Estrangeiros (Paris),
13/2/1926. ADF, SDN/Secrétariat général, v. 113, p. 63-64.
52 SDN, A.4.1926 (Extraordinaire).
53 SDN, Journal Officiel, 7ème année, n. 4, 38ème session du Conseil , 12/2/
1926, p. 498.
54 Félix Pacheco a Mello Franco, 18/2/1926. AHI, 274/3/4.
55 Mello Franco a Félix Pacheco, 17 e 20/2/1926. AHI, 274/3/1e 274/3/4, e Félix
Pacheco a Mello Franco, 18/2/1926. AHI, 274/3/4.
56 Fleauriau (Londres) ao Ministro dos Negócios Estrangeiros (Paris), 25/2/
1926. ADF, SDN/Sécrétariat général, v. 113, p. 175.
57 Félix Pacheco a Mello Franco, 18/2/1926. AHI, 274/3/4.
58 Mello Franco a Briand, 247271926, e Domício da Gama a Briand, 18/2/1926.
ADF, SDN/Secrétariat général, v. 113, p. 161 e 99.
59 Gentil (Tokyo) ao Secretário Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros,
20/2/1926, ADF, SDN/Secrétarait général, v. 53, p.185.
60 O fato de Mussolini ao menos não se opor à candidatura brasileira era
realmente devido à atitude do Brasil no conflito ítalo-grego, onde havia
recebido, no Conselho, apoio do Brasil. Ver BREDA DOS SANTOS, op. cit., p. 90-
154.
61 Points de vue des principaux Etats au regard de l'augmentation des sièges, 5
de março de 1926. ADF, SDN/Sécrétariat général, v. 88, p. 143-145, e MARTIN,
William. L'élargissement du Conseil. Journal de Genève, 17/2/1926, p. 1.
62 De Peretti de la Rocca (Madri) a Briand, 3/3/1926. ADF, SDN/Secrétariat
général v. 121,p. 62-63.
63 Félix Pacheco a Mello Franco, 18/9/1925. AHI, 274/3/3.
64 Nas palavras de Heitor LYRA, op. cit., t. 2, p. 116.
65 Arthur Bernardes a Mello Franco, 5/2/1926. AHI, 274/3/4.
66 Félix Pacheco a Mello Franco, 7/3/1926. AHI, 274/3/4.
67 Réunion du Dimanche, 7/3/1926 (très confidentiel). ADF, SDN/Secrétariat
général, v. 121,p. 160.
68 Ibid., p. 154-164.
69 Mello Franco a Félix Pacheco, 9 e 11/3/1926. AHI, 274/3/1.
70 Réunion de 12/3/1926 (très confidentiel). ADF, SDN/Secrétariat général, v.
121, p. 200.
71 Ibidem.
72 Mello Franco a Félix Pacheco, 13/3/1926. AHI, 274/3/1.
73 BREGMAN, Alexandre, op. cit., p. 21.
74 Assemblée de la Société des Nations. La crise du Conseil. Une déclaration de
M. Stresemann. Journal de Genève, 14/3/1926, p. 2.
75 KIMMICH, Christopher, op. cit., p. 83 e 84, e BREGMAN, Alexandre, op. cit.,
p. 21
76 Briand a Conty, 15/3/1926. ADF, SDN/Secrétariat général, v. 121, p. 232-233.
77 Note remise le 16 mars au président de la République des Etats-Unis du
Brésil par les ambassadeurs de France et d'Angleterre. ADF, SDN/Secrétariat
général, v. 126, p. 83-88 e 89-90.
78 No dia 12 de junho de 1926, o Brasil notifica ao secretariado da Liga sua
retirada da organização internacional. SDN, Journal Officiel Supplément
Spécial, n. 42, Actes de la Session Extraordinaire de l'Assemblée (Março 1926),
3ème session plénière, 17/3/1926, p. 25-26, e Texto do discurso pronunciado
ontem em francês perante a Assembléia Extraordinária das Liga das Nações pelo
Chefe da Delegação do Brasil, AHI, sem numeração.
79 Extrait d'une lettre particulière de M. Conty a M. Dejean, 8/3/1926. ADF,
SDN/Secrétariat géneral, v. 2022, p. 4-5.
80 Os comentários da imprensa britânica e francesa nos dias que seguem à
Assembléia não deixam a questão passar em branco, concentrando-se em críticas à
política de Chamberlain e Briand. Na imprensa britânica, por exemplo, o Daily
News, o Westminster Gazette e o Daily Herald pedem a demissão de Chamberlain.
Na França, o Journal, o Ere Nouvelle, Petit Journal, Echo de Paris, o Figaroe o
Temps falam do "fracasso" na Liga e questionam a diplomacia de Briand.
81 SATO, Eiiti. Prefácio à segunda edição brasileira do livro de CARR, E. H.
Vinte anos de crise, 1919-1939, op. cit., p. xxv.
82 MAYER, Arno. A força da tradição: a persistência do Antigo Regime. São
Paulo: Cia. Das Letras, 1990, p. 21.
83 Ibidem. Ver, ainda, sobre o tema o excelente trabalho de BARACUHY, Braz.
Vencer ou perder: a diplomacia brasileira na crise da Liga das Nações (1926),
Dissertação apresentada ao Instituto Rio Branco, Brasília, 2003, p. 5-9.
84 MELO FRANCO, Afonso Arinos de, op. cit., p. 1252.
85 Nesse sentido, vale a pena transcrever Georges Scelles, eminente jurista,
citado por Afonso Arinos, já que sua ponderada análise é das mais referidas
pela literatura que trata da crise de março de 1926: "Realmente, a Alemanha,
não pode, desta vez, se prestar a uma combinação que respeite até os escrúpulos
de sua opinião pública e as conveniências ministeriais de seu governo. Quanto
aos sacrifícios da Suécia e da Tchecoslováquia, a sessão ordinária de setembro
permitirá recompensá-las, ainda mais que, em se tratando da Pequena Entente, a
rotatividade entre os Estados que dela fazem parte é um princípio aceito há
muito tempo. Pode-se, pois, considerar, que a solução amadurece e que já
podemos nos congratular e felicitar. Um grande peso foi tirado de muitas das
costas diplomáticas!". SCELLES, Georges. Une crise de la Société des Nations,
Paris: Les Presses Universitaires de France, 1927, p. 42-43.
86 MACEDO SOARES, José Carlos de. Le Brésil et la Société des Nations, Paris:
A. Pedone, 1927, p. 9 e 14.
87 Elyseo MONTARROYOS. Le Brésil et la crise de la Société des Nations en
1926.Genebra: Imprimerie Albert Kundig, 1926, p. 13.
88 GARCIA, Eugênio V. A candidatura do Brasil a um assento permanente no
Conselho da Liga das Nações. Revista brasileira de política internacional, a.
37, n. 1, 1994, p. 12 e 20. A dissertação de mestrado do autor, de 1994, foi
publicada em 2000: O Brasil e a Liga das Nações (1919-1926). Porto Alegre/
Brasília: Editora da Universidade/UFRGS/FUNAG.
89 HILTON, Stanley. Afrânio de Melo Franco e a diplomacia brasileira, 1917-
1943. Revista brasileira de política internacional, a. XXIX, n. 1, 1986, p. 15.
90 Ibid., p. 21-22.
91 BUENO, Clodoaldo. In: CERVO, Amado & BUENO, Clodoaldo. História da
política exterior do Brasil. São Paulo: Ática, 1992, p. 207. Registre-se ainda
que José Honório Rodrigues e Ricardo Seitenfus referem-se à crise de março como
uma "catástrofe anunciada", cuja responsabilidade cabe aos seguidos erros de
cálculo da diplomacia brasileira, ou seja, "o obstáculo colocado por
provincianos políticos brasileiros". RODRIGUES, José Honório & SEITENFUS,
Ricardo A. S. Uma história diplomática do Brasil (1531-1945). Organização de
Lêda Boechat Rodrigues. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1995, p. 330 e
346.
92 Cf. Lámérique latine à Santiago et à Genève. Note préparée par Julian
Nogueira pour le Secrétariat général, 20/4/1923, p. 1. SDN, 40/28578/26331, e
BREDA DOS SANTOS, Norma, op. cit., p. 209-216.
93 MELO FRANCO, Afonso Arinos de, op. cit., p. 1142-1143.
94 "A Liga das Nações foi um produto do clima ideológico daqueles tempos (...)
A figura de Woodrow Wilson dominava a cena ideológica. Aparecia como o profeta
de uma nova era, fazendo um apelo dramático aos povos e governos (...). Ao
sentar-se à mesa da conferência [da paz], tinha como suporte mais do que o
poder americano; tinha apoio no entusiasmo das massas da Europa ocidental que
queriam claramente que a ovelha da paz não fosse devorada pelos lobos da
diplomacia cínica". CLAUDE JR., Inis. Swords into Plowshares. The problems and
Progress of International. New York: Mc Graw-Hill, 1971, p. 50-51.
95 CARR, E. H., op. cit., p. 42 e 70. Carr considera que a diplomacia e o
direito internacional têm que ser expressão concreta de condições e interesses
particulares e não tomados como padrão absoluto (ver, sobretudo, p. 21). Ver
também KEYNES, J. M. As conseqüências econômicas da paz. Brasília/São Paulo:
Editora UnB/IPRI/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2002, e TUCHMAN, Bárbara. A torre do orgulho: um retrato do mundo antes da
Grande Guerra, 1890-1914. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.
96 Vinte anos após "a guerra para acabar com a guerra", a criação da ONU tem
como contexto uma nova visão liberal. A propósito da questão, salienta Inis
Claude que a nova concepção liberal que cria a ONU "refletiu a perda de
confiança nos resultados econômicos e políticos do individualismo desprovido de
responsabilidade e substitui a fé anterior na mão invisível do mercado,
postulada por Adam Smith, pelo planejamento governamental". CLAUDE JR., Inis,
op. cit., p. 78.